Lua entrou na sala de Rodrigo, a ansiedade apertando-lhe o estômago. Ele a encarava com uma expressão incomum — uma ruga profunda na testa, como se reprovasse algo que ela sequer compreendia. Desviou o olhar para os papéis nas mãos, pigarreou e iniciou:
— Senhorita Fernandes… — A voz grave ecoou calculista. — Você foi incrível. Trabalhou excepcionalmente bem hoje. — Obrigada, senhor Alcântara — sussurrou ela, os olhos fixos nas mãos largas dele, que organizavam documentos com precisão militar. — Sua mediação foi fundamental. Graças a você, os franceses darão resposta amanhã. — Que bom, senhor — respondeu, ela de forma contida, notando como seus próprios dedos tremiam disfarçadamente no colo. Ele alinhou os papéis na mesa com um gesto brusco. Quando ergueu o rosto, os olhos azuis-gelo perfuraram-na como adagas: — Prometi que o emprego seria seu, se saísse bem. — Uma pausa carregada. — E você… excedeu as expectativas. Lua sorriu, a euforia misturando-se ao medo do desconhecido: — Obrigada. Prometo que não se arrependerá. Rodrigo não retribuiu o sorriso. Inclinou-se para frente, as mãos entrelaçadas sob o queixo: — Espero que não. — O tom era uma ameaça velada. — Mas alerto: aqui não há espaço para mediocridade. Pressão constante. Expectativas altíssimas é o que encontrará todos os dias. — Estou pronta — afirmou, erguendo o queixo num desafio silencioso. Ele acenou, cortante: — Veremos. Lua engoliu seco. Tudo o que ouvira sobre seu chefe era verdade — um perfeccionista implacável. Mas o que ele disse a seguir congelou-lhe o sangue nas veias: — Mas antes de mais nada — ele ajustou-se na cadeira, cruzando as mãos —, há algo que preciso deixar bem claro. — O quê, senhor? — Lua arqueou as sobrancelhas, curiosa. — Como funcionária desta empresa — a voz dele ganhou um tom cortante —, você tem a obrigação de manter respeito entre colegas e sócios. — Claro, senhor — respondeu ela, perplexa. — E não tolero namoricos pelos corredores — acrescentou, os dedos tamborilando na mesa. Lua franziu o cenho: — Não entendo a insinuação. — Não importa — ele ergueu uma mão, encerrando o assunto. — Basta entender suas responsabilidades. — Sim, senhor. — Ótimo. — Ele fechou a pasta com um estalo. — Começará amanhã. Ao chegar, procure Hanna na sala ao lado, pois infelizmente amanhã ela ainda estará no lugar de Silvia, espero que não me apronte novamente — falou mais para si mesmo que para Lua, depois a encarando disse-lhe. — Ela lhe dará meus horários e tarefas. Ela concordou com a cabeça, e depois que ele a dispensou, saiu da sala de Rodrigo. Ela ainda não havia notado, mas havia suspendido a respiração e assim que saiu soltou o ar, e sorriu feliz por ter conseguido o que tanto desejou. Porém, ao lembrar do que Rodrigo lhe falou, ela sentiu-se um pouco confusa e se perguntou: “Por que mencionou "namoricos"?” A dúvida martelou-lhe os pensamentos enquanto caminhava. Nada justificava aquela advertência, mas estava determinada a seguir as regras. Enquanto saía da sala, Lua sentiu uma sensação de realização. Ela havia conquistado o respeito de Rodrigo, ela sabia que ainda havia muito a aprender, mas estava pronta para enfrentar os desafios que viriam. No corredor, Júlio e Sabrina interceptaram-na: — E então? — perguntou ele, ansioso. — Ganhei o emprego! — O sorriso de Lua era contagioso. — Sabia! — Sabrina abraçou-a, enquanto Júlio acrescentou: — Mas prepare-se. Rodrigo não brinca em serviço. — Ele já me avisou — Lua riu, nervosa. — Disse que será desafiador. — E será — Júlio baixou a voz, teatral. — Mas comigo por perto, você sobrevive. Sabrina deu um puxão na orelha no irmão, fazendo todos rirem. O som ecoou pelo corredor até a sala fechada de Rodrigo, onde ele observava a cena pela fresta da porta, os dedos apertando a caneta em suas mãos até os nós brancarem. Júlio ainda sorrindo falou: — Agora sem brincadeira linda, sei que você é capaz. Sei disso agora depois do que vi você fazer naquela sala de reuniões. Sorrindo, Lua lhe agradeceu. Nesse momento, Rodrigo chamou Júlio: — Júlio, preciso falar com você. — Ok, já vou indo — respondeu ele, virando-se para elas. — Vou lá encarar a fera! Elas riram. Ele então olhou para Lua: — Lua, como já disse, e volto a repetir, sei que se sairá super bem aqui. Mas caso precise de ajuda, poderá sempre contar comigo. Sabrina sorriu e complementou: — E comigo também! Afinal, agora seremos colegas de trabalho! Lua agradeceu: — Obrigada! Se precisar, não hesitarei em pedir ajuda. Sabrina apontou para o corredor: — Agora vamos! Vou lhe mostrar toda a empresa e apresentar seus colegas. Enquanto se afastavam, Lua percebeu Rodrigo na porta de sua sala observando-a. Um arrepio percorreu-lhe a espinha. “Por que me sinto assim toda vez que ele me olha?” No primeiro dia de trabalho... Lua chegou cedo, determinada a impressionar. Seguindo as instruções, dirigiu-se à sala da secretária de Júlio. O que não imaginava era que encontraria Hanna — a mesma loira da recepção que causara confusão. Lembrou-se de não tê-la visto durante o tour com Sabrina. Supôs ter sido um mal-entendido e sorriu educadamente: — Olá, bom dia! Hanna ergueu o rosto com um cenho franzido: — Diga o que deseja? Ao reconhecê-la, os olhos da secretária estreitaram. A lembrança da humilhação voltou: Sabrina sussurrando "Parabéns, Hanna! Graças a você, Lua será a nova secretária do Rodrigo!", seguida pela reprimenda de Júlio e Rodrigo pelo currículo "perdido". Embora, na verdade, Hanna não tivesse perdido o currículo — escondera-o de propósito para fazer a "jecazinha" desistir —, a jovem agora estava ali, sorridente, diante dela. O ódio fervia nas veias da secretária, mas ela disfarçou com um sorriso melífluo: — Bom dia! Você deve ser a nova secretária do doutor Rodrigo, não? Lua retribuiu o sorriso: — Sim! Ele me pediu para buscar sua agenda de compromissos. Hanna entregou os documentos com um gesto exageradamente solene: — Claro, está tudo aqui! — A voz adocicada contrastava com o olhar gélido. Lua agradeceu, e a secretária acrescentou: — De nada, querida! Fico tão feliz por você ter conseguido o emprego. Seremos ótimas colegas! A propósito, me chamo Hanna Mendes e você como se chama? A ironia passou despercebida. Lua respondeu com genuíno entusiasmo: — Lua Fernandes. Muito prazer! — Hanna Mendes Tavares. Seja bem-vinda! — Aperteou-lhe a mão com força calculada. — Obrigada! Porém, assim que Lua saiu, o sorriso de Hanna desmoronou. Sentou-se à mesa, os dedos crispados sobre o teclado. Preciso agir rápido. Antes que essa intrusa finque raízes aqui...