O sábado finalmente chegou, e o sol já se punha quando subi para o meu quarto. Sobre a cama, estavam espalhadas as três fantasias que Sophie havia deixado para mim.
Ela havia insistido para que eu fosse à festa à fantasia e, depois de muita relutância, eu concordei. Mas, ao encarar aquelas roupas, um nó se formou em meu estômago.
As três eram, sem sombra de dúvida, natalinas.
A primeira, simples: um vestido vermelho com detalhes brancos, acompanhado de um gorro de Papai Noel.
Meu coração acelerou.
Natal.
A palavra ecoou amarga na minha mente.
Por que Sophie escolheria justamente fantasias natalinas, sabendo como me sinto em relação a essa época?
A resposta veio rápido, como um sussurro incômodo no fundo da minha cabeça: ela havia omitido de propósito.
A festa provavelmente tinha tema natalino. E Sophie, sabendo do ódio que eu nutria desde a morte de Ava, simplesmente decidiu não me contar.
Era exatamente o tipo de coisa que ela faria. Sempre acreditando que sabia o que era melhor para mim.
Olhei para o espelho. O reflexo que me encarava tinha olhos cansados, fundos, carregados de desconfiança. Uma raiva pequena, mas insistente, começou a crescer dentro de mim.
— Por que você não foi honesta, Sophie? — murmurei para mim mesma. — Por que me forçar a enfrentar algo que você sabe que eu não quero?
O silêncio do quarto devolveu minha pergunta, como se zombasse dela.
E, pela primeira vez desde o acidente, percebi que não era apenas tristeza que me consumia. Era também a fúria de ter sido empurrada contra um abismo que eu ainda não estava pronta para encarar.
Mas havia outra parte em mim, uma parte ainda menor e quase sufocada pela raiva, que se perguntava se Sophie estava apenas tentando me ajudar. Talvez ela acreditasse que enfrentar o Natal, mesmo que de forma simbólica, pudesse me curar. Ou talvez só quisesse me tirar de casa, ainda que fosse com um empurrão travestido de manipulação.
Suspirei e me sentei na beira da cama, encarando as fantasias como se fossem algum tipo de desafio.
O que Ava diria se estivesse aqui?
Provavelmente riria da minha expressão mal-humorada e escolheria a mais ousada de todas — a Mamãe Noel sexy — só para me provocar, só para me arrancar uma risada também.
Mas Ava não estava mais aqui. E nunca mais estaria.
— Sophie, você me paga por isso... — murmurei, como quem tenta se dar coragem.
Com relutância, estendi a mão para a fantasia mais bonita. O vestido vermelho justo, acompanhado dos chifres que piscavam, parecia brilhar em contraste com a escuridão que eu carregava por dentro.
Era chamativo o bastante para me fazer sentir exposta, mas, ao mesmo tempo, adequado para o tema que Sophie havia me empurrado goela abaixo.
Enquanto me vestia, minha mente era uma tempestade. O Natal tinha sido arrancado de mim no momento em que Ava morreu. Eu havia jurado nunca mais me entregar àquela época, e agora Sophie me forçava a encarar, ainda que de forma torta, um pedaço desse mundo outra vez.
Quando terminei, voltei-me para o espelho.
O vestido ajustava-se bem ao meu corpo, realçando minhas curvas de um jeito que eu não lembrava mais ser possível. Os chifres piscavam, pesados, como se carregassem junto todas as memórias que eu tentava esquecer.
Ainda assim… eu estava linda.
Olhei de novo para o reflexo e, por um breve segundo, vi Ava ao meu lado, sorrindo, rindo de mim, dizendo para eu não levar tudo tão a sério.
A visão desapareceu rápido demais, como fumaça.
Fiquei apenas eu, sozinha diante do espelho.
— Não é pelo Natal… — sussurrei. — É pela Sophie.
Com o coração pesado, desci as escadas, pronta para enfrentar o que viesse naquela noite — mesmo que isso significasse encarar fantasmas para os quais eu ainda não estava preparada.
***
As portas automáticas do hall do prédio de advocacia se abriram, e fui imediatamente envolvida por uma visão que me fez hesitar.
Desde a entrada, o espaço transbordava de exagero natalino. Guirlandas enormes emolduravam as paredes, luzes cintilavam como se estivessem vivas, e uma árvore gigantesca dominava o centro do saguão. Os enfeites dourados e vermelhos refletiam em cada superfície, como se o lugar inteiro tivesse sido engolido pelo Natal.
— Uau… — escapou baixinho, quase sem querer.
Dei um passo para dentro, ajustando a barra do vestido que me convenci a usar, e respirei fundo.
A raiva latejava dentro de mim, mas misturada a um cansaço resignado. Por mais que quisesse girar nos calcanhares e sair correndo, meus pés se recusaram a obedecer.
— Aí está você!
A voz de Sophie cortou meu transe. Ela surgiu à minha frente com uma fantasia de elfo que combinava perfeitamente com o tema. O chapéu pontudo balançava quando ela sorria, e seus olhos brilharam ao me ver.
— Você está linda! Eu sabia que, qualquer que fosse a sua escolha, ia ficar perfeita em você.
— Sophie… você podia ter me contado sobre o tema. — Minha voz saiu baixa, mas carregada de reprovação.
Ela apenas deu de ombros, o sorriso ainda aceso.
— Se eu tivesse contado, você não teria vindo. E você sabe disso. — Piscou, inclinando o rosto de leve. — Agora, deixa disso. Estamos aqui para nos divertir.
Antes que eu pudesse retrucar, ela agarrou meu braço com naturalidade e me puxou para um salão.
— Vamos tomar algo. Isso vai ajudar.
O espaço interno era ainda mais extravagante que o hall. Luzes natalinas cobriam o teto como uma constelação artificial, piscando em sincronia com a música. Mesas fartas exibiam comidas típicas da época, e copos coloridos refletiam o brilho das lâmpadas.
Um grupo animado se aglomerava perto do palco, onde uma banda tocava versões modernas de clássicos natalinos, com batidas que faziam o chão vibrar.
Respirei fundo, tentando ignorar o peso daquele ambiente sufocante, focando apenas em Sophie, que parecia determinada a me distrair — custasse o que custasse.