— Pronto — suspirou, limpando uma gota de suor da testa. — Último móvel.
Depois de finalmente se instalar, Clarice passou o dia organizando sua casa para que ela ficasse com cara de lar, acolhedora e para que a fizesse ficar mais perto de sua mãe. Mas uma casa fechada e vazia leva tempo para ser um lar, por isso, a faxina foi mais cansativa do que ela imaginou.
— Já fiz muito por hoje — murmurou para si mesma, desligando a música e pegando uma garrafa de água que estava na bancada.
Seus braços doíam, e as pernas estavam pesadas, mas o importante é que tudo estava finalmente limpo e arrumado, e que agora a casa estava, mais uma vez, vivida, exatamente como ela se lembrava.
O crepúsculo já tomava conta do horizonte, e as estrelas começavam a surgir, uma a
uma, pontilhando o céu com sua luz suave. Clarice fechou os olhos por um instante, sentindo o cheiro de terra molhada e das plantas que cresciam ao seu redor. O silêncio profundo da floresta a envolvia, apenas quebrado pelo som distante de grilos e pelo farfalhar das folhas.Sentou-se no centro do quintal, estendendo a toalha sobre a grama e deitando-se sobre
ela, com os olhos fixos no céu. — Isso… Isso é o que eu precisava — sussurrou, sentindo a calma invadir seu corpo. Foi um som distante, quase como um rosnado, que a despertou. Clarice abriu os olhos de repente, o coração acelerado. Estava escuro, e a lua cheia brilhava intensamente no céu, iluminando o quintal com uma luz prateada. Ela se sentou, esfregando os olhos e olhando ao redor, confusa. — Que droga… Cochilei aqui fora. — murmurou, sentindo um arrepio correr por sua espinha. O ar estava frio, e ela tremia levemente. Levantou-se devagar, os músculos do corpo ainda um pouco rígidos pelo tempo que passou deitada no chão. Foi então que seus olhos pousaram sobre algo estranho. A grama alta ao seu redor estava amassada em alguns pontos, como se algo grande tivesse passado por ali. — O que é isso? — Clarice deu alguns passos, tocando o mato amassado com a ponta dos dedos. O padrão parecia ser o de pegadas, mas grandes demais para serem humanas. Seu coração bateu mais rápido. A sensação de ser observada a incomodava, mas ela tentou afastar o pensamento. "Deve ser algum animal da floresta... Um cervo, talvez", disse a si mesma, embora não estivesse completamente convencida.Com um suspiro pesado, Clarice deu meia-volta e caminhou até a porta da casa. Ao
passar pelo portãozinho de madeira, algo chamou sua atenção. Virou-se par a olhar novamente para o quintal, e, por um breve segundo, pensou ter visto um par de olhos vermelhos brilhando entre as árvores. Ela piscou, assustada, mas, quando tentou focar sua visão, não havia nada, nada além da imponente floresta a sua frente. — Ótimo, agora to ficando maluca… É só cansaço. — disse em voz alta, tentando convencer a si mesma. Entrou rapidamente na casa, fechando a porta atrás de si. "É só o cansaço", repetiu mentalmente, mas aquela sensação de desconforto continuava ali, alojada em seu peito. Clarice caminhou até o local que havia visto nos classificados: uma pequena loja no centro, que parecia perfeita para a floricultura. Mas então, mesmo no silêncio do banheiro, Clarice ouviu algo. Distante, levado pelo vento, o som de um uivo solitário e longo ecoou pela floresta até chegar a pequena e delicada casa. Enquanto a noite avançava, o sono finalmente a venceu. No entanto, mesmo nos seus sonhos, os olhos vermelhos voltaram a assombra-la.