Mundo ficciónIniciar sesiónAo chegar em casa, após um dia estranho, sentindo-me observada a cada passo, finalmente me deito no aconchego do meu quarto. O silêncio me envolve, e sinto-me um pouco melhor, como se as paredes do meu refúgio fossem capazes de afastar tudo o que me inquieta. Mas, no fundo, sei que hoje à noite minha vida mudará por completo. Essa certeza pulsa dentro de mim, como se já fosse um destino traçado.
Enquanto penso nisso, o cansaço me vence, e meus olhos pesam. Deixo-me levar pelo sono, apenas por alguns instantes, mas logo acordo com uma voz chamando meu nome. — Helena... — diz a voz, suave, mas firme. Abro os olhos de súbito, pensando que seja minha mãe. Levanto e vou até a porta, mas não vejo ninguém no corredor. O coração dispara. — Helena, você está me ouvindo? — a mesma voz ecoa, agora mais clara. — Quem está aí? — pergunto, assustada, tentando entender o que acontece. — Sou eu, Helena. Sua loba. Congelo. Minha loba? Mas como isso é possível? Ela não deveria aparecer apenas após a meia-noite? — Não, Helena. — responde a voz, com calma. — Como você nasceu pela manhã, tecnicamente, esse é o horário em que seu lobo desperta. Então, está preparada para hoje? Vamos encontrar o nosso companheiro. Você passará pela sua transformação. Minhas mãos suam, e sinto o coração martelar. — Para a transformação, sim. — respondo, respirando fundo. — Mas quanto a companheiro... essa já é outra história. Não quero me iludir com essa possibilidade. Prefiro esperar pelos planos da Deusa Luna para nós. — Mas você sabe que precisamos dele. — minha loba retruca. — Ele é aquele que nos completa, que nos fortalece e que vai nos proteger. — Prefiro não criar expectativas. — digo, tentando controlar a ansiedade. — Fale-me mais sobre você. Estava tão ansiosa para tê-la comigo. — Sou sua loba, Helena. Chamo-me Rania. À noite, durante a transformação, você verá minha verdadeira forma. Meu coração se aquece ao ouvir seu nome. Passo os minutos seguintes conversando com Rania, tentando compreender sua energia, sua força, sua essência. Sinto uma conexão imediata, como se uma parte de mim, que sempre esteve adormecida, finalmente tivesse despertado. O tempo passa, e logo preciso me arrumar para a festa — a mesma da qual não tenho a mínima vontade de participar. Passei o dia inteiro sem ver meus pais; eles ficaram responsáveis pela segurança do evento, já que hoje é o último dia em que estarão a serviço da guarda do Alfa. Sei que, para eles, é um momento de orgulho e, ao mesmo tempo, de despedida. Por volta das oito horas, meus amigos Antony e Ana chegam para me buscar. Ana está radiante, animada como sempre, e sua energia contrasta com o peso que sinto no peito. Entramos no carro e seguimos para a casa da alcateia. O caminho parece curto, e logo avistamos a fachada iluminada, coberta de bandeiras e ornamentos em tons prateados e azulados. Tudo respira grandiosidade, como se já quisessem marcar a ascensão do futuro Alfa. Assim que entro, vejo meus pais. Minha mãe, com os olhos brilhando de emoção, vem correndo até mim e me envolve em um abraço apertado. — Filha, estou tão orgulhosa da mulher que você está se tornando. — ela sussurra. — Nunca deixe ninguém ferir os seus sentimentos, pois você é mais forte do que imagina. — Obrigada, mãe. — respondo, com a voz embargada. — Espero me tornar, ao menos, metade da mulher que você é. Nós nos abraçamos por mais tempo, até que um fungado interrompe o momento. Ao olhar para trás, vejo Ana com os olhos marejados, prestes a chorar. Rimos e a puxamos para o abraço. — Chega! — Antony reclama, tentando disfarçar a emoção. — Hoje é dia de festa, não de choradeira! — Insensível! — Ana retruca, secando os olhos. — Vamos logo entrar antes que a minha maquiagem precise de retoque. Minha mãe se despede de nós, e seguimos para o salão principal, em busca de um canto mais tranquilo, já que não havia muito o que comemorar para nós. Afinal, essa era a noite de Theo, não a minha. O salão está lotado. Lobos de todas as classes circulam entre mesas, risadas, danças e conversas animadas. As luzes brilham no teto alto, e uma música vibrante preenche o ambiente. Tento me distrair com meus amigos, mas, de repente, sinto aquele mesmo incômodo de antes. Meus pelos se arrepiam, e meu corpo inteiro entra em alerta. Procuro a origem daquela sensação e então o vejo. Theo. Ele está me observando. Seu olhar é intenso, carregado de algo que não consigo decifrar. Meu corpo reage de forma incontrolável: arrepios, coração acelerado, respiração curta. Rania se agita dentro de mim, inquieta, quase exigindo que eu vá até ele. Mas não cedo. Viro-me para os meus amigos, fingindo não perceber nada. Sempre é assim quando estamos perto: ele me incomoda com seu olhar, com seu cheiro, com sua simples presença. Sinto ciúmes, sinto raiva, e tento ao máximo esconder isso. Se ele ao menos desconfiasse que a ômega que ele tanto despreza sente algo por ele... seria meu fim. Só me resta torcer para que esta noite não piore. Rania, porém, não se cala. Ela está cada vez mais agitada, como se pressentisse algo. — Algo vai acontecer, Helena. — ela sussurra em minha mente. — Algo grande. Não sei se é bom ou ruim. Pelo bem da minha sanidade, espero que seja algo bom. Olho ao redor, tentando decifrar o clima da festa. Alguns dançam no centro do salão, outros se deliciam com os aperitivos servidos nas bandejas. Ana, como sempre, consegue fazer as duas coisas ao mesmo tempo: come e dança, animada, arrancando risadas de quem está por perto. Percebo, mais uma vez, Henry observando-a de longe. Seus olhos seguem cada passo dela, como se ela fosse a única pessoa no recinto. É quase engraçado — ele parece um lobo perdido, faminto por atenção. Dou uma risadinha baixa. Tenho certeza de que não vai demorar muito para os dois se unirem. E, de coração, espero que isso aconteça. Ana merece alguém que a ame e a proteja, e Henry parece disposto a isso. Procuro meus pais com os olhos e os encontro de longe. Estão trabalhando, como sempre. Papai percebe meu olhar, sorri e manda um beijo. Faço um gesto de pegá-lo e o coloco no peito, bem em cima do coração. Meus pais sempre foram assim: amorosos, protetores, dispostos a se sacrificar por mim. Lembro-me de quantas oportunidades eles já deixaram escapar para manter meu segredo seguro. O Alfa até convidou meu pai para ser seu braço direito, mas ele recusou. Se tivesse aceitado, teríamos que viver dentro da casa da alcateia, e isso seria arriscado demais. Mais tarde, surgiu a chance de eles chefiaram uma nova alcateia, mas novamente disseram não. Tudo por mim. Tudo para proteger quem eu sou. E isso só aumenta meu amor e minha gratidão por eles. Sou arrancada dos meus pensamentos quando sinto uma presença muito próxima. Tento identificar, mas a multidão dificulta. O coração dispara, e Rania rosna dentro de mim. Meus olhos percorrem o salão e, quando finalmente param, encontram Theo. Ele continua me observando. Mas, dessa vez, seu olhar é diferente. Há um brilho estranho, intenso, como se quisesse atravessar minha alma. Ficamos assim por alguns segundos, em um duelo silencioso de olhares. Tento resistir, mas logo perco quando Antony chega perto de mim, segurando minha mão. — Você está bem, Lena? — ele pergunta, com um sorriso suave. — Estou, sim. — respondo, respirando fundo. — Só estou um pouco frustrada por não estar na minha cama assistindo às minhas séries. Não consigo ver nada de especial aqui. Festa nunca foi para mim.






