— Jay vai ficar puto quando souber que o senhor vai à boate.
Sorrio, sabendo que é verdade. Jay detesta perder dinheiro e estou animado para fazer ele me pagar vinte mil. O jantar ocorre tranquilo, como sempre. Estarei no vale por uma semana, organizando, visitando e conhecendo novos maquinários. Uma grande vantagem de ter trezentos anos é que passamos a conhecer de tudo um pouco. Withevallen é um ponto estratégico para a comercialização dos meus produtos. O grande rio que corta o estado passa por aqui e, com isso, meus produtos têm livre acesso ao porto, de onde saem com mais facilidade para serem exportados ao mundo. — Meu Alfa, temos amanhã uma visita à fábrica cinco. Há novos maquinários e pessoas para o senhor conhecer. Condor fala, e balanço a cabeça em afirmativo. — Nos encontramos aqui às seis. Ele confirma, e continuamos nosso jantar em silêncio. Após, ele sai e eu vou até meu escritório. Desde a guerra eu nunca consegui dormir uma noite inteira, então trabalho e trabalho a maior parte do tempo. Analiso balancetes, analiso contratos, até que adormeço sentado mais uma vez. "Alex, venha, a água está quente." A voz de Aurora vem novamente em um sonho. Eu a conheci minha vida toda, e quando ambos fizemos dezoito anos e nossos líderes lycan se afloraram, descobrimos que éramos companheiros eternos. Sempre tive uma queda por ela, mas não podíamos pensar em ficar juntos, já que um dia nossas almas chegariam. Quando soube que ela era minha, a fiz minha de alma e coração. Um amor tão forte e tão perfeito... foi tão difícil quando a perdi. "Cuidado, Rory"... Falo, e ela sorri para mim e pula na cachoeira. Olho para baixo e ela se levanta na água. Mas o que vi… seu rosto não era mais o dela. Era de... — Izobelle... Falo. Ela sorri para mim. Depois, a água fica vermelha. Ela me olha, e seu rosto bonito e de traços marcantes muda para pânico. Acordo assustado com o barulho de batidas na porta. Olho de um lado para o outro para ter certeza de que tudo foi um sonho… ou um pesadelo. — Meu senhor, já se passa das seis e quinze. A voz de Janka vem do outro lado da porta. Olho para o meu relógio e constato que dormi além do necessário. — Estou indo. Olho novamente ao redor, garantindo que tudo foi apenas um sonho, e saio do escritório. Subo para tomar banho. Meu coração está acelerado. — Mas que porra... — bato na parede, com raiva. Os sonhos me atormentam há séculos. Uma forma da deusa me torturar. Visto meu jeans assim que saio, minha camisa social e meu sobretudo preto. — Desculpa o atraso, Condor. Ele me olha, mas nada diz. Pela minha cara, dá para notar que não durmo há séculos. Saímos sem tomar café. Meu apetite hoje não vai me ajudar. Chegamos à empresa em um sábado de manhã. Ela ainda estava a todo vapor. — Bom dia, senhor Beneditt. Uma honra para nós tê-lo aqui em Withevallen mais uma vez. Gabriel fala. Ele é meu gerente regional. Tenho olhos em cada empreendimento — e aqui não poderia ser diferente. AB Têxtil trabalha com tecidos para o mundo. Temos do mais puro jeans à seda mais preciosa com fios de ouro. Esse é o nosso diferencial. Nos cumprimentamos e começamos a andar. Ele me mostra o espaço do novo galpão. Conversamos. Ele me fala sobre os projetos. Para um humano, Gabriel é um bom gerente. — Desculpa, Bel, mas não vou poder falar. O senhor Beneditt gostosão está nos visitando hoje e estou enrascada se eles me encontrarem falando no telefone. Paro ao ouvir meu nome. Minha audição apurada me faz olhar para trás. No canto do galpão há uma mulher, nova, na casa dos vinte e dois anos, falando baixinho ao telefone. Me viro para escutar mais e Condor observa também. — Bel, ele é perfeito. Gigante. Tem um cabelo um pouco louro, jogado de lado. E os olhos, mulher... pena que vai se casar. Porque são os azuis mais belos que já vi. Reviro os olhos para a fala dela. São sempre assim: mulheres que, ao me ver, querem o superficial. Estou farto. Chego perto e a vejo desligar rapidamente. — Marisa, o que estava fazendo? Gabriel pergunta à mulher, que me olha com os olhos arregalados. — Me desculpa, senhor Gabriel, eu... Não falo. Só observo. Há algo em seu cheiro diferente que faz Dário pular dentro de mim. Respiro puxando o ar e sinto sândalo e canela nela. Meu lobo pula e gira inquieto. — Com quem falava? Condor pergunta, enquanto eu a olho. Uma humana. Sem nada. Nem bonita, nem feia. Apenas uma humana. — Por favor, senhor, me desculpe. Mas minha amiga fica noiva hoje, e sou sua madrinha de casamento. Ela só queria saber se estava tudo bem. Ela olha para Gabriel, depois para mim. — Eu já disse para Izobelle que tudo está correndo bem! Ele fala. E olho para ele. Esse nome. — Quem é Izobelle? Pergunto. Minha presença faz a mulher na minha frente tremer. Ela olha para Gabriel, procurando ajuda, e depois para mim, com medo. — Nossa diretora executiva. Ela se preocupa com a fábrica e tem grande vontade de sempre ajudar. Mas hoje é sua folga. Por isso, na segunda-feira teremos uma reunião para lhe apresentar a ela. Magnus Vlamp fala atrás de mim, e me viro para olhar. Magnus também é um metamorfo e trabalha para mim há trinta anos. — Meu senhor — ele faz uma reverência à qual todos respondem com respeito. — Pode ir, senhorita Pampquis. E que não se repita mais nada. Não há permissão para o uso de celulares hoje. Fique como um aviso. Vejo a mulher se curvando e saindo correndo. O cheiro de sândalo e canela era fraco, mas me deixou pensativo. — O que achou da nossa nova conquista, senhor? Magnus me vira, fazendo-me olhar para o restante da fábrica. Andamos. Ele e Gabriel falavam o tempo todo. Cada detalhe não passava despercebido por Condor, que tinha um faro apurado. Mas aquele cheiro… Aquele cheiro não saía da minha cabeça.