CAPÍTULO 6
Narrativa do Autor Numa segunda-feira ensolarada, o morro estava incomumente calmo. RB fumava seu beck tranquilo quando o rádio chiou: — Na escuta, chefe? — Na escuta. Pode falar. — Tem um playboy aqui na barreira dizendo que tem hora marcada com você. — Manda subir. Tenho tempo pra perder, não. Era o advogado com todos os documentos para a leitura do segundo testamento. Trazia também uma carta misteriosa que estava guardada em um cofre forte no Brasil — carta essa que mudaria o destino de Lavínia e RB. Quando aquele homem enorme chegou, com uma pasta nas mãos e um sorriso tímido, cumprimentou RB. — Muito prazer, me chamo Pablo Silver Lisboa. Sou advogado e testamenteiro do senhor Miguel Romano. O senhor deve ser Denner Romano, irmão e agora tutor legal da menina Lavínia? RB apenas assentiu com a cabeça. Lavínia já vinha descendo a escada da casa. O advogado olhou em sua direção, e o olhar dele veio cheio de malícia. RB percebeu na hora e cortou com uma resposta seca: — Lavínia, esse é o advogado do seu pai na Itália. Veio ler o segundo testamento e também uma carta que meu irmão deixou pra ser aberta apenas após sua morte — e bem longe da Itália. Por isso essa carta estava em um cofre aqui no Brasil. Lavínia entendeu e se sentou à mesa da sala, esperando o desfecho. O advogado abriu a pasta e colocou sobre a mesa uma folha para ambos assinarem, atestando que estavam recebendo o conteúdo. Quando iam assinar, Mirtes entrou na sala, avisando: — Doutor Vargas tá ali na sala de visitas. Doutor Vargas era o advogado de RB. Ele havia sido chamado pra revisar cláusulas e garantir que nada passasse despercebido. Pablo se levantou, cumprimentou o colega e voltou a entregar os papéis de assinatura. Vargas pegou o documento, leu com atenção e confirmou: — Pode assinar. Vargas sugeriu que fossem para o escritório, pois ali era à prova de som e tinha câmeras — medida de segurança contra possíveis jogadas do advogado italiano. A pasta foi aberta. Dentro, cinco páginas lacradas com um brasão: uma fênix, símbolo criado por Miguel como sua assinatura pessoal. Pablo começou: — Estamos aqui presentes para a leitura do testamento do senhor Miguel Romano, como foi sua vontade. A tensão no ar era palpável. — Miguel Romano, chefe da máfia italiana, pai adotivo da jovem Lavínia Romano e irmão do senhor Denner Romano, deixa para Lavínia a quantia de dois bilhões de dólares em espécie, guardados no Beng Sul Bank, na Suíça; três mansões — uma na Itália, uma na Suíça e outra em Fernando de Noronha aqui no Brasil; dois apartamentos de cobertura na Itália; cinco carros importados, que já estão em uma garagem particular no centro do Rio de Janeiro. — As joias citadas na primeira leitura do testamento, na Itália, fazem parte do patrimônio da família, então serão divididas entre Denner e Lavínia. — Miguel deixa também, na Marina da Glória, um iate com o nome “Lavínia”, para seu irmão Denner, e a quantia de um milhão de dólares em espécie, além de duas coberturas: uma em Copacabana e outra na Barra da Tijuca no Brasil. — O dinheiro será transferido assim que todos os documentos forem assinados, mediante testemunho do advogado do senhor Denner Romano. O silêncio foi quebrado quando Pablo puxou uma carta lacrada e falou com um tom mais grave: — Agora, vamos à carta registrada em cartório e guardada num banco aqui no Brasil. Ele quebrou o selo da fênix. A tensão aumentou. “Meu irmão, Se você estiver ouvindo a leitura desta carta, é porque já não estou mais aqui. Estou deixando tudo por escrito para que não haja nenhum problema entre o que está descrito e a teimosia da minha ruivinha. Deixo para você a tutela dela até os 21 anos, quando ela terá que se casar com alguém da sua escolha. Pode ser o chefe do comando da facção ou o filho do Capo Rodrigues, na Itália. Ela precisa ser mantida casta. E aquele que tirar sua virgindade terá que casar com ela e assumir toda a fortuna que estou deixando. Tem que ser alguém da sua confiança. Eu estava cercado por inimigos, gente que queria meu trono. Por isso, quem se casar com ela será o dono da máfia deleone que criei. Ou também pode usá-la só pra chegar no trono e depois matá-la. Conto com você pra não deixar isso acontecer. Lembre-se: ela não é sua sobrinha de sangue. É alguém que criei com amor, pra guardar nossa fortuna e a cadeira que pertence à nossa família. Não deixa qualquer um chegar perto dela. Ela é sua chave. Use na hora certa. Te amo, Miguel Romano.” Essas últimas palavras estavam em negrito. A mensagem era clara, mas havia algo escondido nelas. Algo simbólico. RB ficou imóvel. Olhou pro advogado, que se levantou e estendeu a mão pra ele, apertando firme. Depois caminhou em direção à Lavínia e tentou abraçá-la. RB pigarreou com força: — É bom parar por aí, doutor. Um aceno já está bom. O advogado recuou, visivelmente constrangido, mas não perdeu a ousadia: — Sou solteiro. Posso cortejar a senhorita Lavínia, se ela quiser. RB foi direto: — A carta é bem clara. Eu tenho que aprovar qualquer malandro que quiser se aproximar da minha sobrinha. — Tenha um bom dia, senhor Pablo. E boa viagem de volta. — Ainda vou ficar no Brasil por uns três meses até resolver tudo — rebateu o advogado, forçando um sorriso. — Um bom dia, senhores. Quando saiu, doutor Vargas se aproximou de RB e falou bem baixinho: — Esse cara vai te dar trabalho. Cuidado. Ele veio pra causar e tentar casar com a fortuna da menina. RB ficou ali, pensativo, encarando a porta. Nada mais seria o mesmo depois daquela carta.