Capítulo 37 : Visita à criatura do terraço e a partida.O elevador não subia até ali.Bia e Cael subiram pelas escadas estreitas, que rangiam a cada passo. O ar ficava mais frio. Mais denso.O último andar da república era como uma masmorra esquecida, envolta em sombras e silêncio.Cael usava a lanterna do celular, mas a luz parecia fraca, sufocada pela própria escuridão.Chegaram à porta interditada.Bia tirou uma chave de dentro da blusa. O som metálico ecoou no corredor vazio quando ela a girou.A porta se abriu com um lamento baixo, como se a casa protestasse. Lá dentro, o ar era quase sólido.E sobre uma cama enorme, feita de camadas de mantas escuras e ossos trançados, uma criatura repousava.Não era humano.Tinha pele opaca, acinzentada, quase translúcida. Olhos fechados, rosto alongado, braços longos e finos demais, como raízes envelhecidas. O peito subia e descia devagar… cansado.Quando sentiu a presença deles, abriu os olhos.— Vieram se despedir. — A voz da criatura era ba
Capítulo 38 – Filhos da Tempestade NascemA chuva caiu sem aviso. Pingos grossos estouravam contra o telhado da pequena casa escondida nas montanhas. O céu se tornara cinza, carregado, como se um presságio estivesse se concretizando. Lá fora, o vento uivava como uma fera prestes a despertar. Já tinham se passado dois meses naquele lugar, e agora parecia que o momento tinha chegado.No quarto, Maya arqueava o corpo de dor, as mãos agarradas ao lençol úmido de suor. A gravidez, que mal completava o sexto mês, tinha avançado de forma surreal. O tempo parecia ter cedido espaço à vontade de algo maior.— Não... agora não... — sussurrou, sentindo a contração rasgar seu ventre como se fosse feita de fogo e aço.No andar de baixo, Cael estava em pé, imóvel, os olhos voltados para o teto, como se pudesse ver através das paredes. A casa inteira vibrava com uma energia primitiva, antiga, que mexia com as entranhas do mundo invisível.Bia, nervosa, atravessava a sala de um lado ao outro.— Ela va
Cap 39 Um lobo ligado a seus filhos.Dentro da sala, os berços estavam alinhados, três pequenos corpos repousando calmamente. Seus rostos estavam suavemente iluminados pela luz do luar que entrava pelas janelas altas. Cada um deles envolto em uma manta de tecido real, um luxo incomum que parecia ter sido escolhido a dedo para acolher seres de grande importância.Kan sentiu uma dor profunda. Uma dor que cortava através de suas barreiras mágicas, atravessava os muros de seu coração. Era uma dor física, emocional, algo tão profundo que fez suas mãos tremerem.Ele caminhou até os berços com passos pesados, a garganta apertada. Suas mãos, trêmulas, se estenderam para tocar a manta que cobria um dos bebês, mas o simples toque fez sua alma estremecer. Ele não sabia o que estava acontecendo, mas sabia, com toda a sua essência: aquelas crianças... não eram dele. Por um segundo, ele esperou que a nova ligação da marca viesse delas. Mas não veio.As lágrimas se formaram em seus olhos, mas ele nã
Cap. 40: Os três inimigos do alpha.E então... eles viram tudo. Até o dia do casamento. E, para crianças de apenas cinco anos — por mais inteligentes que fossem — tudo aquilo era insuportável.A dor de Maya quando foi capturada. O momento em que foi tomada à força. O grito sufocado. O medo. A solidão. A tentativa dos próprios pais de matá-la depois da injustiça.A fuga. A luta.E, por fim, o rosto do homem.Kan.Eles não conseguiram ver quem havia sido o agressor de sua mãe. Mas, no momento em que Maya encontrou aquele homem na Vila dos Lobos, os meninos captaram a ligação imediatamente.— Aquele é o papai... — disseram os três ao mesmo tempo, em uníssono.Samuel Kan. O nome ecoava em suas mentes. Era como se a própria magia tivesse sussurrado dentro deles.A conexão foi cortada com um soluço. Manter aquela visão custara caro. Mesmo com Ayel, o mais velho, usando seu dom para intensificar os poderes dos irmãos, o esforço havia drenado todas as forças dos três. Mal conseguiam controlar
Capítulo 41 – Plano MirimA luz da lua atravessava as cortinas finas do pequeno quarto, recortando sombras suaves pelo chão de madeira. Ayel, Noam e Lior estavam reunidos sob uma coberta improvisada como tenda, sussurrando com a urgência de quem está salvando o mundo ou sabotando um pedacinho dele.— Ela não vai nos perdoar por isso — murmurou Noam, os olhos azuis piscando levemente.— Vai sim — rebateu Ayel, firme. — Quando tudo der certo, ela vai entender. Mas... por ora é melhor que ela nem desconfie.— E se o Cael descobrir? — Lior coçou a nuca, inquieto. — Ele já está desconfiando da gente, ele não parou de falar que, quando éramos mais novos, ficávamos correndo atrás dele. Mesmo que ele não diga, é impossível esquecer que vivíamos pendurados nas asas dele.— Ele não pode sentir o que a gente sente. A energia que nos liga a ela e… a ele — disse Ayel com uma calma sobrenatural. — Eles não fazem ideia do que somos capazes.No canto do quarto, um tablet exibia gráficos em queda livr
Capítulo 42 – A EntrevistaA sala estava silenciosa, exceto pelo som das teclas sendo pressionadas com força. Maya olhava para o monitor com os olhos cansados, a lista de empresas aberta, um currículo recém-atualizado e um nó preso na garganta. Havia perdido tudo — menos os filhos —, e era por eles que ela apertava "enviar", uma vez atrás da outra.— Tá pronta? — perguntou Lior, surgindo ao lado dela como quem só passava por ali.— Pronta pra quê, filho? — ela sorriu, sem energia.— Pra mudar o destino — respondeu ele, com um olhar que não parecia de uma criança.Com a lista em mãos — que os trigêmeos disseram ser “empresas confiáveis e com vagas ativas” —, Maya começou a enviar seus dados. Não leu os nomes. Não teve tempo, nem cabeça. No meio delas, lá estava:Kan Industries — Setor Financeiro e Inovação Estratégica.Ela clicou. Enviou. E não percebeu a sombra que se movimentava ao fundo da realidade, puxando os fios do destino com dedos pequenos e determinados.Enquanto isso...Na t
Cap. 43 Entrevista com o AlfaEles conseguiram bloquear e Kan não conseguiu perceber que aquela em sua frente era Maya, eles suspiraram aliviados ao perceber que deu certo.A sala de presidência estava silencioso, exceto pelo som abafado do ar-condicionado e da respiração acelerada de Maya ou melhor, Mayara, como se apresentou, usando o nome falso que ensaiara tantas vezes na cabeça.O coração de Maya batia descompassado no peito ao se deparar com quem menos esperava, naquele silencio se prestasse atenção se podia ouvir as batidas, mas para Kan isso não era problema, ele conseguia captar qualquer tensão e nervosismo através das emoções das pessoas e para ele, o coração de Maya estava tão alto quando um tambor, ele só ficou em dúvida se ela de medo ou surpresa.Kan estava ainda mais impressionante do que em suas lembranças: alto, de porte dominante, os olhos de lobo cinzentos pareciam despir sua alma com um único olhar.Instintivamente, ela desviou o rosto, o estômago revirando com o m
Cap1: A menina da adaga no coração. Maya VolpynEu tinha doze anos quando abri os olhos pela primeira vez.Literalmente.Desde o dia em que nasci, estive em coma. Mas não era um coma qualquer. Eu vim ao mundo com uma adaga cravada no peito — uma lâmina mágica atravessando meu coração, protegida apenas pela minha caixa torácica. Ninguém jamais conseguiu explicar como isso foi possível. E muito menos como remover a adaga sem me matar no processo.Não tenho lembranças. Nenhuma infância. Nenhum som, cheiro ou rosto familiar. Só o vazio.Meus pais passaram anos buscando desesperadamente alguém com magia suficiente para salvá-la. Tentaram de tudo. Magos, curandeiros, rituais. Mas a resposta era sempre a mesma: retirar a adaga significaria assinar minha sentença de morte.Ninguém entendeu como, um dia, simplesmente acordei.O que lembro é uma voz. A voz de um garoto. Familiar, mesmo que eu não tivesse memórias para compará-la. Logo depois, senti uma luz azul vibrar no centro do meu peito. E