POV: Emily Eu nunca soube como o chão podia sumir sob os pés até aquele momento. Sentada diante do cofre aberto, com papéis ainda espalhados ao meu redor, olhei para Alexander como se ele fosse um estranho. Mas era isso que mais doía — ele não era. Eu o conhecia. Cada toque, cada silêncio, cada sombra no olhar dele… Eu sabia quem ele era. E mesmo assim, não fazia ideia. —Você é pai do Dylan. Minha voz saiu mais fraca do que eu gostaria, mas firme o suficiente para encher o estúdio de gelo. Ele não respondeu de imediato. Ficou parado na porta, como se uma simples palavra pudesse derrubar o pouco que ainda se mantinha de pé entre nós. —Sim — ele disse, finalmente. Só isso. Sim. Como se isso não quebrasse todas as minhas certezas de uma só vez. Senti o calor fugir do meu corpo. O sangue correu frio, e por um instante, pensei que fosse desmaiar. Mas não podia. Eu precisava encará-lo. Precisava ouvir da boca dele tudo o que tinha me sido negado. —Você mentiu pra mim esse tempo to
AlexanderEla se foi. Não de verdade, não com malas e porta batida. Mas se fechou para mim. E isso, no fim das contas, é muito pior.Emily caminhou até o quarto como quem foge de um incêndio e, ainda assim, se recusa a gritar por socorro. E eu fiquei ali, no estúdio, rodeado pelas cinzas da minha própria maldição.Ficar calado sempre foi a minha forma de autopreservação. Mas com ela… o silêncio virou uma arma. Uma lâmina afiada que cortei entre nós. E agora sangramos, um pelo outro.Encostei na parede, sentindo o peso do mundo cair sobre os meus ombros. Olhei para o cofre ainda aberto. As páginas expostas, minha história jogada ao chão como se fosse lixo. E talvez fosse. Uma história de erros, mentiras e abandono.Eu deveria tê-la impedido. Deveria ter trancado aquele estúdio. Mas parte de mim quis que ela soubesse. Porque eu já não aguentava mais carregar isso sozinho.Dylan é meu filho.Minha maldição.A prova viva de um amor proibido, de uma mulher que nunca me pertenceu. A mãe del
EmilyO silêncio dele continuava grudado na minha pele.Mesmo depois que fechei a porta e deixei Alexander do lado de fora, as palavras dele vibravam dentro de mim, latejando como um corte recém-aberto. Eu andava pelo quarto de um lado para o outro, tentando respirar, tentando entender como tudo que parecia tão certo… agora parecia tão condenado.Ele é pai do Dylan.Não importa quantas vezes eu repita isso na minha cabeça, ainda soa como uma mentira. Como uma dessas histórias absurdas que a vida inventa só pra ver até onde conseguimos suportar.E o pior de tudo? Eu queria odiá-lo. Queria gritar, quebrar coisas, fazer com que ele sentisse metade do que estou sentindo agora. Mas quando olhei nos olhos dele… tudo o que consegui ver foi dor. Uma dor antiga. Uma culpa enraizada. E algo em mim que eu não queria admitir: compaixão.Me joguei na cama, sentindo o colchão afundar como se ele também estivesse cansado de tudo. Meus dedos tremiam. Não sabia se era raiva, decepção ou a ausência abs
AlexanderA pior parte de ter cometido erros é quando eles começam a atingir as pessoas que você mais quer proteger.Emily estava ali, na casa onde cresci, no centro da minha vergonha, da minha história, das minhas cicatrizes. E, ainda assim, ela escolheu ficar. Não me perdoou — eu não esperava isso — mas também não virou as costas. E isso me dava uma esperança perigosa. Esperança é uma faca de dois gumes: quando você já sangrou demais, ela pode ser a lâmina final.Fiquei observando-a pela janela da biblioteca. Ela caminhava pelo jardim, com os braços cruzados, o rosto virado para o céu nublado. Emily parecia sempre carregar mais do que devia para alguém tão jovem. E agora, por minha culpa, ela tinha um fardo que não merecia.Lá fora, as primeiras gotas de chuva começaram a cair.Lá dentro, o inferno crescia.O telefone da biblioteca vibrou. Peguei o celular do aparador de livros e atendi, sem verificar o número.—Alexander?A voz do outro lado era a última que eu queria ouvir.—Thoma
EmilyDizem que a pior dor é a da traição, mas eu discordo.A pior dor é a de continuar amando alguém mesmo depois da verdade. É ter que conviver com sentimentos que não se alinham à razão. E pior ainda: é saber que você está no meio de uma guerra que começou antes mesmo do seu nascimento — e que talvez nunca tenha tido chance de sair ilesa.Eu não dormi naquela noite.Depois da conversa com Alexander, fiquei horas encarando o teto, pensando no que viria a seguir. Thomas sabia. Dylan sabia. E o mundo ao nosso redor começava a ruir como um castelo de cartas construído sobre areia movediça.Não sei exatamente quando tomei a decisão de ir embora. Talvez tenha sido quando vi a expressão de Alexander ao ler a mensagem do Dylan. Ou talvez tenha sido quando percebi que, por mais que ele tentasse ser diferente, o passado sempre o puxava de volta. E eu... estava me deixando afundar junto com ele.No início da manhã, arrumei minhas coisas em silêncio. Não era uma fuga. Era sobrevivência. Eu pre
DylanDescobrir que o homem que você cresceu desprezando é, na verdade, seu pai... não é algo que você simplesmente supera com uma garrafa de uísque e uma noite mal dormida.Eu passei dois dias trancado no apartamento, tentando colocar os pensamentos em ordem, mas cada vez que fechava os olhos, era o rosto da Emily que surgia. E, logo atrás, a sombra dele.Alexander.O nome que antes evocava desdém agora me queimava como ácido. Eu o odiava. Odiava por ter se envolvido com ela, por ter invadido o que era meu... Mas, acima de tudo, odiava por ter sido mais verdadeiro do que qualquer outra pessoa na minha vida.Meu pai — Thomas — sempre foi o homem das aparências. O político promissor, o marido perfeito, o pai que exigia excelência. Mas agora eu sabia que tudo isso era fachada. Ele me criou sobre uma mentira.E Alexander... aquele homem frio, enigmático, que eu só via em reuniões de família ou escândalos abafados... ele era o meu pai de verdade.—Filho da puta — murmurei, olhando meu ref
SofiaEu sempre observei mais do que falei.Era mais fácil assim. As palavras nos comprometem. Os olhares, não. Eles deslizam entre os cômodos como sombras, carregando verdades que ninguém ousa dizer em voz alta. E, naquele apartamento pequeno de Boston, cercada por garrafas de vinho barato e silêncios pesados, eu assistia Emily se despedaçar, pedaço por pedaço.Ela tentava fingir que estava bem.Trabalhava, estudava, ria dos meus comentários ácidos. Mas bastava um segundo de distração para a verdade escorregar pelos olhos dela — aquela tristeza profunda, discreta, que só quem já sentiu reconhece.E eu já senti.Conheci Emily na faculdade, no segundo ano. Ela era aquele tipo de garota que parecia ter nascido para agradar: doce, inteligente, insegura de um jeito charmoso. Tão diferente de mim. Talvez por isso nos aproximamos. Talvez porque eu sabia que, cedo ou tarde, ela cairia. E eu estaria lá pra segurar — ou pra dizer “eu te avisei” com uma taça na mão.Mas dessa vez era diferente.
AlexanderO silêncio dela é mais cruel do que qualquer grito que eu já tenha suportado.Desde que Emily foi embora, meu mundo retomou o formato que sempre conheci: rígido, previsível, e miseravelmente solitário. Mas agora há uma diferença sutil — e devastadora. Antes, a solidão era minha escolha. Agora, ela me foi imposta.Tentei encontrar rastros.Liguei. Mandei mensagens. Falei com Sofia, que se limitou a me dizer que Emily precisava de tempo. Que precisava "respirar". Eu não disse o que pensei: que sem ela, quem estava sufocando era eu.Ela levou algo de mim quando partiu.Algo que nem eu sabia que existia.No escritório, nada fazia sentido. Assinava contratos com a mente em outro lugar. Meus sócios começaram a notar minha ausência mental. Um deles — Julian, um advogado novo com sede de poder — sugeriu que eu tirasse uma licença.—O senhor está... diferente. Instável — ele ousou dizer.Instável. Como se o controle que mantive durante anos estivesse escorrendo pelas rachaduras do me