O Devorador encapuzado avançou pelos caminhos tortuosos da encruzilhada, seus passos silenciosos, mas carregados de uma presença que parecia sugar o ar ao redor. Seus olhos — dois poços negros que não piscavam — fixaram Elara com uma intensidade que fez seu corpo estremecer.
Hécate permaneceu ao lado delas, a chave antiga brilhando em sua mão, enquanto o lobo rosnava, pronto para atacar a qualquer sinal. — Você sabe por que está aqui — disse o Devorador, a voz um sussurro afiado —. A chave. O espelho. O que carregam. Tudo pertence a mim. Elara sentiu uma onda de medo, mas também de determinação. Não poderia recuar agora. — O que você quer? — perguntou, tentando manter a voz firme. — Seu destino — respondeu ele. — E o fim da linha para aqueles que ousam desafiar a escuridão. Antes que pudessem reagir, o chão sob seus pés mudou. A encruzilhada se transformou em um labirinto de sombras, onde as paredes se moviam, fechando caminhos e abrindo outros. — O jogo começou — disse Hécate, seus olhos brilhando como duas luas. Lys puxou Elara para trás, afastando-a da figura que agora parecia crescer, tornando-se um monstro feito de sombras vivas. — Devemos encontrar a saída — disse Lys — antes que ele nos capture. Elara segurou o espelho contra o peito. Dentro dele, podia ver reflexos distorcidos do labirinto, mas também um brilho tênue, uma luz que parecia indicar um caminho. — O espelho — murmurou — ele nos guia. Mas a cada passo, os Devoradores surgiam, sombras que tentavam envolver seus corpos, roubar suas vozes, apagar suas memórias. — Confie em mim — disse Lys — lembre-se do que somos. Elara fechou os olhos, buscando dentro de si a força que a deusa havia despertado. Sentiu a marca em seu braço pulsar, uma chama que queimava as trevas ao seu redor. Com um grito, ela rompeu o abraço das sombras, abrindo um caminho de luz. — Estamos perto — disse Hécate — mas o preço será alto. No coração do labirinto, uma porta negra os aguardava. A chave antiga brilhou intensamente, chamando. — Esta é a escolha final — disse a deusa —. Atravesse-a, e seu destino estará selado. Elara hesitou, sentindo o peso de tudo que havia perdido e tudo que ainda podia ser. Lys apertou sua mão. — Você não está sozinha. Com um último olhar para Hécate e o lobo, Elara virou a chave na porta. A escuridão os engoliu. Quando a porta negra se abriu, uma luz fria e pálida os envolveu, lançando sombras longas que dançavam como fantasmas. O ar mudou — não era mais a floresta, nem o labirinto de sombras. Era algo diferente, um mundo entre mundos. Elara deu um passo à frente, sentindo a pele arrepiar. O espelho no seu peito agora emanava um brilho suave, como um coração que batia em silêncio. Lys e o lobo a seguiram, atentos a cada som, cada movimento invisível. — Este é o véu entre os mundos — explicou Hécate, que caminhava com eles, silenciosa mas presente. — Aqui, as memórias tomam forma, e o passado pode ser revisitado… mas cuidado, nem tudo que você vê é verdade. Elara sentiu seu peito apertar. Viu, à distância, figuras desfocadas, ecos de pessoas que conhecera e amara, sombras do que já foi e do que poderia ter sido. — Por que estamos aqui? — perguntou Lys, olhando para os lados. — Para confrontar o que foi perdido — disse Hécate — e entender a verdadeira natureza da chave. De repente, o espelho no peito de Elara brilhou com força, refletindo uma cena que a fez prender a respiração: uma jovem mulher, seus cabelos negros caindo em cascata, olhando para um bebê nos braços, com um rosto cheio de dor e determinação. — Quem é ela? — perguntou Elara, mas a imagem desapareceu tão rápido quanto surgiu. — Sua mãe — respondeu Hécate — uma mulher marcada pelo destino, que fez escolhas difíceis para proteger você. Lys estreitou os olhos. — Então tudo isso tem a ver com seu passado. — Sim — disse Elara, sentindo lágrimas formarem-se — e com o futuro que posso escolher. A luz ao redor deles começou a mudar, tornando-se mais sombria, enquanto uma voz sussurrante crescia em intensidade. — Não estão sozinhas aqui — advertiu Hécate —. Há forças que desejam manter o véu intacto, impedir que o passado e o futuro se encontrem. De repente, do nada, a sombra de um Devorador surgiu entre as memórias, estendendo garras para Elara. — Prepare-se — disse Lys, sacando uma adaga feita de prata lunar. Elara fechou os olhos e respirou fundo, sentindo a presença da deusa e a chama da marca arder. — Não vou desistir — disse ela, determinada. A batalha no véu entre os mundos estava apenas começando.