Capítulo 3

Hailey Silverstar

Virei na primeira esquina que meus pés encontraram, sem pensar, apenas deixando meu corpo me guiar. Segui pela calçada o mais rápido que consegui, o coração martelando nos ouvidos como se fosse explodir a qualquer segundo.

Ignorei os assobios e risadas de um grupo encostado na parede próxima à boate. Fingi que não ouvi as palavras sujas que me lançaram, mesmo quando senti seus olhares percorrendo minha pele como garras invisíveis. Instintivamente, puxei a barra do vestido para baixo, tentando esconder mais do que realmente era possível.

— Malditos saltos… — murmurei entre dentes, tropeçando de leve.

Cada passo era uma tortura. Os Louboutins de segunda mão, que tinham parecido uma boa ideia horas atrás, agora eram como algemas, me prendendo àquela noite maldita. Eu nunca mais usaria aquilo de novo, nunca.

E, ainda assim, por trás de toda a irritação, havia um medo maior: a sensação de que, a qualquer momento, uma sombra enorme e furiosa surgiria atrás de mim.

— Aonde vai, gatinha? Quer se divertir com a gente? — perguntou uma voz masculina, áspera e cheia de malícia, enquanto uma mão pesada agarrou meu braço.

Me desvencilhei num impulso, empurrando-o com força. Minha loba rugiu dentro de mim, pronta para dilacerar aquele imbecil. Senti o calor percorrer minha pele, os ossos começando a latejar com o prenúncio da transformação. Estava a um fio de me revelar ali, no meio da rua, diante de humanos bêbados e inconsequentes.

Foi então que um rosnado profundo cortou o ar.

O som ecoou pela rua como trovão, denso e selvagem, congelando cada músculo do meu corpo. O homem de jaqueta de couro que me segurava se virou devagar, os olhos arregalando ao ver a origem daquele som.

Eu também olhei.

Hunter estava parado na entrada da boate, iluminado pelas luzes vermelhas e azuis que escapavam da porta. Mesmo em sua forma humana, suas presas estavam à mostra, afiadas e brancas, como uma promessa de violência. Seus olhos brilhavam de um jeito que parecia atravessar a noite inteira até me alcançar.

Meu coração tropeçou dentro do peito.

Ele não parecia apenas irritado. Ele parecia… prestes a matar.

Em poucos passos, Hunter diminuiu a distância entre ele e os humanos. O primeiro não teve chance: caiu no chão com um único soco seco, tão rápido que mal consegui acompanhar. Os outros três recuaram, recolheram o amigo desacordado e desapareceram pela rua sem olhar para trás.

Hunter manteve o olhar fixo na direção deles até que sumissem de vista. Só então se voltou para mim.

De repente, sua mão quente agarrou a minha, me puxando com força até que nossos corpos quase se tocassem. Seus olhos ardiam em um brilho selvagem, sua respiração era pesada, feroz, como a de um predador prestes a reivindicar o que era dele.

— Não se atreva a correr de mim, Hailey Silverstar — murmurou, a voz baixa, grave, carregada de autoridade.

Congelei. Minha respiração falhou. O nome proibido soou como um trovão nos meus ouvidos.

— O que disse? — sussurrei, tentando soar firme.

Os olhos dele arderam mais, faiscando.

— Vamos deixar as coisas claras desde o início. — Sua voz vibrou como uma ordem que atravessava pele e osso. — Eu sou o Alfa. Eu sou o seu Alfa, e você me obedece. Segundo: sou o seu parceiro destinado, e isso significa que você me obedece em dobro. E nunca, jamais, me desafie na frente da minha matilha.

Meu sangue ferveu. O medo misturava-se a algo que não queria nomear.

— Você enlouqueceu? — arranquei minha mão da dele, mesmo com cada fibra do meu corpo gritando para não me afastar. Os olhos de Hunter mudaram diante de mim, passando do verde intenso para um vermelho incandescente. Um arrepio percorreu minha espinha, mas não me permiti recuar. — Como sabe meu nome?

Ele sorriu de canto, lento, perigoso.

— Eu sei tudo sobre você. — A cada palavra, ele se aproximava um pouco mais. — Quando alguém começa a rondar e perguntar pelo Alfa do Clã Blood Moon… é claro que chega até mim. Quem você acha que deixou escapar que eu estaria aqui hoje? Quem você acha que abriu as portas do clube para você?

Ele abaixou o rosto, os lábios roçando perto da minha orelha, e minha loba estremeceu.

— Eu. Eu estava esperando por você.

— Então sabe o que vim fazer aqui essa noite? — perguntei séria, com o coração martelando no peito.

O sorriso de Hunter se ampliou, perigoso, quase cruel.

Quase ao mesmo tempo, um carro preto, enorme e luxuoso, parou ao nosso lado. O ronco grave do motor ecoou pela rua deserta. Virei a cabeça instintivamente, e assim que meus olhos bateram no veículo, as portas se abriram em sincronia.

Dois lobos enormes desceram de dentro, ambos vestidos de terno, com a aura pesada que só guerreiros de elite carregavam. O cheiro deles atingiu minhas narinas — fortes, leais… Blood Moon.

Meus instintos gritaram perigo. Minha loba rosnou, se preparando para lutar ou correr, mas Hunter não me deu tempo. Seus dedos envolveram meu pulso novamente, firmes, dominadores.

— Sei exatamente por que veio, Hailey. — Sua voz saiu baixa, quase um sussurro, mas carregada de certeza absoluta. — E por isso você não vai a lugar nenhum.

Ele fez um sinal discreto com a cabeça, e os lobos se aproximaram, abrindo espaço como se a rua fosse território dele — e era.

Engoli em seco. A cada segundo, ficava mais claro que eu tinha caído numa armadilha. Eu pensei que estava caçando, mas Hunter tinha me atraído desde o início.

Ele se inclinou até que sua boca ficasse a centímetros da minha orelha. O hálito quente arrepiou minha pele.

— Entra no carro, lobinha. — Sua ordem soou como um rugido suave, impossível de ignorar. — A noite só está começando.

Me debati, mas os lobos eram mais fortes do que eu. Cada tentativa de escapar só me deixava mais pressionada. Para piorar, Hunter me fixou com os olhos, o olhar tão intenso que parecia atravessar até a minha alma.

Senti seu lobo subjugar o de Amala. E, para minha surpresa — e horror — ela cedeu.

— É sério, Amala? — resmunguei mentalmente, incrédula.

Ela não queria me decepcionar. Pior, havia reconhecido Hunter como Alfa. Estava completamente encantada pelo lobo dele, como uma filhote fascinada por uma bolinha que não poderia ter. Que cretina!

Nós éramos lobas solitárias. Nunca nos submetemos a ninguém. Então, por que ela abaixava a cabeça tão facilmente?

Ele não vai nos machucar respondeu Amala, calma demais para meu gosto.

E como sabe disso, sua boba?” gritei em minha mente, sentindo o ódio e o medo se misturarem. — Ele pode estar só nos manipulando para nos matar!

Confie, Hailey. — Sua voz soou firme, e eu senti seu coração batendo em sintonia com o meu.

Antes que pudesse protestar mais, fui empurrada para o banco traseiro do carro e a porta se fechou com um estalo. Hunter permaneceu do lado de fora, enquanto dois de seus lobos me ladeavam, e um terceiro assumia a direção.

Pelo vidro traseiro, vi um carro esportivo preto se aproximar. Hunter tomou o volante, seguindo-nos de perto, silencioso e implacável.

Amala devia ter perdido completamente a razão. Confiar em um Blood Moon? Se as coisas continuassem desse jeito, estávamos ambas condenadas. Mortas. Até o amanhecer.

O caminho foi silencioso, interrompido apenas pelos meus soluços abafados, baixos, quase engolidos pelo ronco do motor. Eu estava apavorada. Sempre me orgulhei de ser uma loba corajosa, de nunca depender de ninguém para enxugar minhas lágrimas ou me proteger nas noites mais sombrias.

Nunca chorei de verdade. Mas agora… agora o medo me esmagava, e a raiva queimava por dentro, feroz e indomável.

Senti a culpa invadir cada fibra do meu ser. Decepcionei minha mãe e meu pai, mesmo sem tê-los conhecido plenamente. Cada primo, cada tio, cada voz que se perdeu na noite em que os Blood Moon destruíram nossa vila — todos estavam presentes em minha mente, julgando-me silenciosamente.

E ali, sentada naquele banco, cercada por lobos que não eram da minha matilha, com Hunter nos observando de perto, percebi o quanto estava sozinha — e, ainda assim, perigosamente presa àquele Alfa que representava tudo o que eu jurara destruir.

O carro parou diante de portões enormes, que se abriram como se antecipassem nossa chegada. À medida que avançávamos, a propriedade se revelava imponente: uma escadaria de mármore conduzia a uma entrada majestosa, rodeada por um círculo perfeito de grama cortada com precisão e arbustos modelados simetricamente. Cada detalhe exalava poder e riqueza, construída sobre um passado de sangue e segredos obscuros.

O carro parou na entrada principal. Os lobos de Hunter desceram primeiro, mantendo as portas abertas para mim com a disciplina silenciosa de guardiões de um reino proibido. A grandiosidade do lugar quase me roubou o fôlego.

Logo depois, Hunter saiu do carro, com passos medidos e confiança absoluta. Seus olhos verdes percorreram meu corpo e meu rosto como se lessem meus pensamentos mais íntimos, avaliando cada reação, cada hesitação.

— Bem-vinda, Hailey! — disse ele, a voz firme e autoritária, com um toque de diversão cruel. — O que acha da sua nova casa?

— Nova casa? Eu não vou morar aqui. Tenho casa.

— Aquele prédio caindo aos pedaços perto da estação de trem? — ele perguntou, arqueando uma sobrancelha. — Não… Já mandei limpar seu apartamento e trazer suas coisas. Vamos, seu quarto está esperando.

— Como? Como entrou no meu apartamento? — perguntei, atônita. Meu corpo inteiro se arrependeu da ingenuidade que me fez pensar estar no controle. Enquanto eu brincava de espiã, Hunter poderia ter me matado dormindo.

— Poucas coisas não se resolvem com dinheiro, minha parceira. — Ele sorriu, como se o assunto fosse óbvio demais. — Agora, vamos. Preciso de um banho.

Um arrepio percorreu minha espinha. O perigo, o poder e o magnetismo que emanavam dele tornavam impossível qualquer resistência. Cada instinto dentro de mim gritava para fugir, mas eu sabia que, naquele instante, estava completamente nas mãos do Alfa — minha vida, minha loba e, de algum modo inexplicável, meu corpo.

A propriedade era ainda mais grandiosa e luxuosa por dentro. Nunca estive em um lugar assim, e por um instante senti vergonha até de sujar o carpete macio e impecável. Fui guiada por uma série de corredores, cada passo aumentando meu desconforto, até que finalmente uma porta se abriu e me deparei com uma escadaria.

— Desça. — disse um dos homens de Hunter, a voz firme e autoritária.

Olhei por cima do ombro. Hunter me encarava sério, o olhar intenso atravessando qualquer tentativa de resistência. Engoli em seco.

— Ande logo. — acrescentou, sem mover um músculo, como se a paciência fosse um luxo que ele não se permitia comigo.

Dei o primeiro passo, engolida pelo escuro do corredor, e quando as luzes se acenderam abruptamente, vi onde estava: uma cela de metal, fria e austera. A porta se abriu e fui empurrada para dentro, sem ter tempo de protestar.

Através das grades, Hunter me encarou, calmo, dominante, um predador em seu território.

— Eu não sei como você conseguiu forçar nosso vínculo, Silverstar — disse, a voz baixa, cortante como lâmina —, mas vai ficar aqui até o xamã desfazer isso. Depois, resolveremos nossas pendências de uma vez por todas.

Ele estendeu a mão, e um de seus lobos trouxe minha bolsa. Minha adaga de prata lunar estava lá dentro. Hunter pegou a arma, virou-a entre os dedos e a arremessou para um canto da cela, o som metálico ecoando pelo espaço.

— Pretendia me matar com isso? — perguntou, os olhos brilhando com uma mistura de divertimento e perigo.

Eu engoli em seco, sentindo o coração disparar. O medo e a raiva se misturavam, e por um instante percebi: não havia mais escapatória.

— Seu povo dizimou o meu, seu maldito Blood Moon! — berrei, a raiva queimando em cada palavra.

— Meu povo dizimou muitos povos. — disse ele, calmo, quase indiferente. — Não é a primeira que vem atrás de mim querendo minha cabeça. Mas é a primeira que forjou um vínculo. Isso me diz que é esperta.

— Eu não forcei nada! — gritei, as mãos tremendo de indignação — Minha loba reagiu a você…

— Quieta! — rosnou Hunter, a voz baixa e ameaçadora, cheia de poder. — Acha mesmo que eu seria vinculado a uma loba como você? Esperei pela minha parceira a vida inteira. Quando ela vier, eu vou saber. E com certeza não será uma andarilha sem clã. A Deusa Lua não faria isso comigo.

— Eu também não tenho a menor vontade de ser parceira de um ASSASSINO! — retruquei, com cada sílaba carregada de desprezo.

O ar entre nós parecia vibrar, pesado e eletrizante. Cada palavra dele acendia a fúria de minha loba, mas também algo mais perigoso e incontrolável dentro de mim.

Hunter riu, um som frio que ecoou pela cela.

— Vou mandar trazer comida. — disse, já se dirigindo às escadas. — Parece que você não come há semanas.

Sua presença ainda dominava o espaço mesmo à distância. Ele parou por um instante, olhando para mim por sobre o ombro.

— O xamã vem pela manhã. Aproveite esta noite para rezar pelos seus ancestrais. Quando isso acabar, logo estará junto a eles.

O sangue gelou em minhas veias. Fui engolida pelo escuro novamente, tentando organizar meus pensamentos, mas a mente girava em círculos.

 Ele não vai nos machucar, não é, sua loba estúpida? reclamei com Amala, tentando impor alguma lógica.

Senti minha loba se enroscar no canto mais profundo de mim, magoada e ferida pelo medo e pela dúvida.

Blade prometeu que não nos machucaria… choramingou Amala, a voz fraca e vulnerável, como a de uma filhote traída.

Quem é Blade?

perguntei, tentando entender.

O lobo de Hunter. Amala resmungou, misturando raiva e frustração. Ele é nosso parceiro. Deveríamos sentir isso, mas… por que ele nega nossa conexão?

Ele é um Blood Moon murmurei, o desprezo cortando minhas palavras como lâmina. —

Não tem coração.

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