— Você acha que poderíamos nos ver outra vez, Helena? - Gregory perguntou, enquanto ela se levantava. — Acredito que sim. Me fez bem receber um pouco de afeto honesto. - Ela estendeu a mão para ele, ajudando-o a se levantar. Estavam um em frente ao outro. Gregory a olhava, terno, curvava-se, instintivamente, enlaçando a cintura dela suavemente, em um beijo manso e generoso, envolvente. Helena apoiou as mãos no peito dele, sentia o coração acelerado dele ditar o ritmo do seu. — Eu espero você por mais vinte anos se quiser. - Ele disse aquela prece, doce, para ela. O feitiço a atingia. O homem encarava aquele olhar suplicante, que vinha do rosto angelical da mulher que mais desejou em sua vida. Ela sorriu, marota. — Não acho que vai tanto tempo desta vez. - Ela disse, suavemente, com o rosto bonito, iluminado. — Me ligue pra qualquer coisa, meu amor. Seja para conversar sobre uma receita de bolo ou pedir para ser resgatada. - Ele instruiu. - Consegue fazer isso, desta vez? - Ela ass
— Querida, espere. Não seja precipitada. - Rafael se levantou e saiu de perto dos outros. - Posso ligar para você?— Sim. - Ela respondeu. Fazia Rafael comemorar.— Alô? - Helena atendia a ligação dele. — Ouvir você é algo inesperadamente satisfatório. - Rafael galanteou. - Eu posso proteger você. Do que precisa além de abrigo?— Só autorização e alguma paz. - Helena respondeu. - As coisas estão confusas, preciso ter o controle da minha alma. - Ela o surpreendia. — Me surpreende. Sempre a achei tão livre e tão selvagem. - Ele respondeu. — Casca grossa, miolo mole. - Helena respondeu. - Não é bem assim, querido. - Ela suspirou. - Mas não posso oferecer nada em troca. Só preciso da autorização, eu me viro com o resto.— Eu te ofereço uma das minhas propriedades. - Ele disse, terno. - Sem nada em troca. Um chá à tarde, é o suficiente. Acordo feito? - Helena ponderou.— Não, Rafael. Não posso assumir um compromisso em que posso ser mal interpretada. - Ela recuava. - Obrigada, mais uma
DESERTO DE CHIHUAHUA — Una migra! Una migra! Una migra! Mira! - O coiote apontou para um ponto, no alto da colina, sobre o rochedo, sozinho, com uma arma de grosso calibre no colo. Dario Garcia estreitou os olhos, a figura estava parada no alto da rocha, inerte. Não parecia fazer mira ou algo assim, aliás, sequer parecia viva. Ele tratou de instruir os coiotes que trabalhavam para ele e seguiu, perpendicular, em direção à figura agourenta sobre o rochedo. Aproximou-se, devagar, passo após passo, esquivando-se, entre a rala vegetação rasteira do deserto, em seu paramento militar da cor da areia. "Uma migra, sozinha, mulher?" Ele identificava a silhueta da policial. Dario julgava: ou ela tinha se perdido ou estavam em solo estadunidense. Qualquer hipótese era problemática. Conforme se aproximava, o contrabandista percebia as nuances. Filetes de sangue seco partiam do nariz; a boca rachada, a pele exposta. Se estivesse viva, aquela criatura miserável, em pesado paramento militar,
Dario passou horas observando sua paciente. Trocou a bolsa de soro e umedeceu seus lábios com o algodão molhado. Ela era bonita para uma militar, admirava-se do motivo de alguém, como ela, ter virado uma. Com o fim da segunda bolsa, ele a rolou e pôs sob o corpo um tapete descartável higiênico, para cães, para o caso de ainda estar inconsciente quando todo aquele líquido resolvesse sair. Adormeceu, com a pistola em punho, pronto para matá-la, se fosse necessário. Helena sentia a dor excruciante lhe roer a alma, forçando-a a perceber-se. Algo lhe tampava os olhos, estava viva e aquilo bastava naquele instante. A cabeça doía um inferno e os olhos, mesmo fechados, ardiam. A boca e a garganta secos, algo lhe feria o braço, dolorosamente. Ela gemeu, baixinho. Dario despertou. A mulher respirava, ofegante, inquieta. Se não estivesse desperta, logo acordaria. — Me ouve? Me entende? - Ele perguntou, em espanhol, percebia o gesto de cabeça dela, confirmando. Estava desperta. - Qual seu
Algo naquele lugar escuro, no Deserto de Chihuahua cheirava bem. Helena gostava do aroma. Dario a servia de um caldo de legumes, batido e leve. Guiou as mãos dela até a borda da tigela e da colher, mas ela não tinha firmeza nas mãos, tremia muito, ainda sem forças. — Me permita ajudá-la, senhora. - Dario tomava a frente, alimentando-a, colher por colher. Ela se fartou com pouco, o estômago cheio. - Amanhã, vamos partir e levar você até a fronteira. - Ele anunciou, precisava resolver aquela militar antes que ela identificasse o caminho. - Não se preocupe, você estará em casa, com sua criança, antes do anoitecer. — Não tenho uma criança, amigo. - Ela respondeu, curtamente.— Mas tem uma cicatriz no ventre. - Ele seguiu, aplicando o gel sobre a queimadura e o colírio nos bonitos olhos daquela mulher. — Oh! Isso. - Ela piscou os olhos, já não ardiam mais e nem sentia tanta dor. O ferimento no braço era o mais incômodo. Dario limpou o ferimento, cobrindo-o com gaze. — Não precisa falar
Um dia no trabalho e o relatório da ação indicava falha na ação. Em seu escritório recebia o comandante, com o braço que repousava, fora da tipóia, sobre a mesa.— Como está, Helena? - Renard perguntou, fechando a porta atrás de si. — Ah, Peter! Cara! Tive muita sorte. - Ela suspirou. - Fomos emboscados. Ou errei feio nos cálculos do planejamento ou vazou informação. De qualquer forma, a sindicância vai encontrar o problema e me cortar ou achar o boca aberta. Fiz o que pude para livrar a equipe. No time, só eu não tenho família. Sabe como é difícil dar notícia de "Morto em Ação" para quem sobrevive. — Helena, mesmo assim, deveria ser mais cautelosa com esses imprevistos. - Peter a repreendia, suave e amistosamente.— Vou tentar na próxima, Peter. - Ela respondeu, massageando os olhos sob as pálpebras. — Complicadas essas queimaduras nos olhos. Coçam um inferno. - Ele puxava conversa. — Começou aqui. No deserto, esse cara que me resgatou, tinha um colírio que foi excelente. - Ela r
Peter a fez companhia. Stuart foi chamado e chegou o quanto antes, examinou Helena. Parecia bem. — Tenente Brown, a senhora está esgotada e passou por eventos importantes recentemente. - Ele informou, friamente. - Minha dificuldade está em traçar o claro limite entre Burnout e TPT. - Ele disse, direto. — Impossível, Capitão. - Peter interveio. - Ela estava bem ontem. — Ontem? Eu apaguei vinte e quatro horas? - Helena perguntou, impressionada. — Aí é que estamos. - Stuart pontuava. - Você já tinha passado mal assim antes, quando seu marido morreu e você, por pouco, não foi a terceira vítima daquele caminhão. O que a fez saber que ia desmaiar? - O médico investigava. — Senti um desequilíbrio, minha visão turvou de uma vez, como se eu estivesse, não sei, flutuando no ar. - Ela respondeu. — Você precisa tirar algum tempo para si. - Stuart recomendou. - Encontre algum apoio, talvez o comandante. Ao que me parece, são amigos chegados. - O médico se virou para Peter. - Certifique-s
Helena e Dario passaram a tarde conversando sobre a vida no Deserto. Ele dizia ser Geólogo. Estudava áreas como aquela, desérticas, o que fazia sentido para ele. Ela era formada em filosofia, algo inusitado para uma militar. Riam daquilo. Quando Peter chegou, Helena parecia bem melhor, mais alegre também. — Vejo que o Capitão estava certo. - Peter parou na porta. Em seu uniforme, para o escritório, era um homem irremediavelmente bonito, aparência impecável que refletia sua posição de autoridade, algo, de pouco mais de um metro e oitenta de altura, postura ereta e disciplinada, resultado de anos no serviço militar. Os cabelos, castanho-claros, sempre bem penteados, já começavam a mostrar sinais de grisalho nas laterais, adicionando um ar de maturidade elegante. Seus olhos azuis, penetrantes, carregam uma mistura de autoridade, luxúria e mistério, com a expressão, geralmente, séria. Havia aquele charme nele, que Helena achava encantador. Peter sempre foi cuidadoso com sua imagem púb