Capítulo 04 - Voo Noturno

Às sete e cinquenta e nove da manhã, Isabella Clark colocou três pastas perfeitamente encadernadas sobre a mesa impecável de Pedro Montenegro. Ela se sentia um zumbi, os olhos ardendo pela falta de sono, mas seu corpo estava eletrizado por uma corrente de puro desafio. Tinha passado em casa por apenas uma hora — o suficiente para um banho rápido e para vestir uma roupa limpa, sua mente funcionando no piloto automático.

Ela voltou para sua mesa e, no exato momento em que o relógio marcou oito horas, a porta do elevador se abriu.

Pedro entrou com a mesma energia avassaladora de sempre. Ele não demonstrou surpresa ao vê-la ali, como se nunca tivesse duvidado de que ela cumpriria a ordem. Passou por sua mesa e entrou na sala, fechando a porta. Por quinze longos e torturantes minutos, o único som foi o virar silencioso das páginas.

Isabella esperou, as mãos suando, o coração na boca. Finalmente, o intercomunicador soou, a voz dele cortando o silêncio.

— Senhorita Clark.

Ela entrou na sala. As três pastas estavam abertas sobre a mesa dele. Ele estava de pé, lendo a última página de um dos perfis.

— Aceitável — ele disse, sem erguer o olhar. Vindo dele, a palavra soou como um elogio extravagante. Ele fechou a pasta. — Há um erro de digitação na página doze do resumo da reunião. Um 'a' no lugar de um 'o'. Quero que desenvolva uma atenção obsessiva aos detalhes.

Isabella sentiu o rosto corar. Depois de toda a noite de trabalho, um único erro de digitação. — Sim, senhor.

Ele a encarou, o olhar intenso e avaliador. — De agora em diante, você se reporta unicamente a mim. Nenhuma instrução, sugestão ou 'ajuda' de qualquer outro diretor é sua prioridade, a menos que venha diretamente de mim. Está claro?

Ele não mencionou o nome de Verônica, mas a mensagem era inequívoca. Ele sabia. E estava traçando uma linha. — Entendido, senhor Montenegro.

— Bom. — Ele se virou e caminhou até a grande janela, o olhar varrendo o horizonte. — Os investidores apreciaram a rapidez da nossa resposta e os perfis detalhados que você preparou. Mas a confiança foi arranhada. E-mails e videoconferências não serão suficientes para consertar isso.

Ele se virou para ela, o olhar afiado como o de uma águia.

— Arrume uma mala, senhorita Clark. Apenas o essencial. Temos um voo para Tóquio em cinco horas.

O cérebro cansado de Isabella demorou um segundo para processar. Tóquio. Do outro lado do mundo. — Senhor?

— A reunião será amanhã, às oito da noite, horário de lá. Eu vou consertar o estrago que seu erro causou, e você estará lá para assistir e aprender. E para garantir que não haja mais nenhuma surpresa desagradável. O carro estará esperando na sua porta em duas horas. Seja pontual.

As horas seguintes foram um borrão. Isabella correu para casa, jogou roupas aleatórias em uma mala, tentou ligar para sua mãe para avisar que sairia do país por tempo indeterminado e, antes que pudesse respirar, já estava em um carro preto a caminho do aeroporto, onde encontrou Pedro esperando no terminal privativo.

O voo na primeira classe era um mundo à parte. As poltronas se transformavam em camas, o champanhe fluía e a privacidade era quase total. Mas para Isabella, a única coisa que importava era a presença do homem sentado na poltrona ao lado.

Ele trabalhou sem parar nas primeiras horas, a luz do laptop iluminando seu rosto concentrado. Isabella tentou fazer o mesmo, mas a exaustão da noite anterior a atingiu com força total. Em algum momento sobre o oceano, ela adormeceu.

Quando acordou, a cabine estava escura, a maioria dos passageiros dormindo. Ela olhou para o lado e viu algo que nunca esperava: Pedro Montenegro estava dormindo. Com a guarda baixa, o rosto relaxado, as linhas duras de sua mandíbula suavizadas, ele parecia... mais jovem. Vulnerável. Havia uma pequena cicatriz quase invisível acima de sua sobrancelha, uma imperfeição que o tornava surpreendentemente humano. Ela se viu observando-o, fascinada, até que ele se mexeu e ela desviou o olhar, o coração disparado.

Mais tarde, quando ambos estavam acordados no silêncio da madrugada pressurizada, ele se virou para ela.

— Por que você quer tanto este emprego, senhorita Clark? O dinheiro é bom, mas você aguenta um nível de pressão que faria a maioria das pessoas desistir. Por quê?

A pergunta pessoal a pegou de surpresa. — Minha mãe... — ela começou, a voz um pouco rouca. — Ela trabalhou a vida inteira. Quero poder dar a ela um pouco de paz. A chance de não se preocupar com as contas.

Ele a ouviu, o olhar fixo no dela, e por um instante, ela sentiu que ele a via de verdade. Ele apenas assentiu, um gesto lento, e voltou a olhar para a escuridão do lado de fora.

Ao desembarcarem em Tóquio, o choque cultural e o jet lag a atingiram como uma parede. Um carro os levou por entre os arranha-céus iluminados por neon até um hotel que exalava luxo silencioso. No balcão de check-in, o recepcionista de luvas brancas curvou-se repetidamente, digitando furiosamente em seu computador.

— Pedimos imensas desculpas, Sr. Montenegro — disse o homem, o rosto pálido. — Houve um erro no nosso sistema de reservas. A sua suíte e a da sua assistente foram... alocadas para a comitiva do embaixador. Estamos terrivelmente arrependidos.

Pedro ficou rígido, e Isabella prendeu a respiração, esperando uma explosão.

— E qual é a sua solução? — A voz de Pedro era perigosamente calma.

— A única suíte que temos disponível esta noite... é a Suíte Imperial. A nossa melhor. Com dois quartos, mas compartilhando uma sala de estar comum. Novamente, nossas mais profundas desculpas.

Um silêncio tenso se instalou. Isabella sentiu o sangue subir ao rosto. Dividir um espaço com ele, mesmo que em quartos separados, parecia uma intimidade forçada e perigosa.

Pedro ficou em silêncio por um momento, o rosto indecifrável. Então, ele se virou para ela.

— Parece que teremos que nos adaptar, senhorita Clark. 

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