Por um longo momento, minha melhor amiga me encara como se eu tivesse acabado de confessar um crime. — Você está ficando doida, só pode! — ela finalmente exclama, colocando a mão na testa. — Não quero nem imaginar qual será sua próxima loucura. — Na verdade, essa também já aconteceu… — digo, mais calma do que realmente me sinto. — Falei que só vou se você for comigo. — É oficial, minha melhor amiga endoidou! — ela quase grita, andando de um lado para outro. — Eu e você trabalhando para Ettore Bianchi? O homem que te odeia? — Ele não me odeia — digo automaticamente, e então me corrijo: — Ou talvez odeie, mas isso não importa. É uma oportunidade profissional, Giu. Ela para de andar e me encara, incrédula. — Profissional? — repete, irônica. — Nada sobre vocês dois, é apenas profissional, Liz. Você sabe disso melhor do que ninguém. — Olha, sei como parece — admito, levantando para me aproximar dela. — Mas pense nas vantagens. O Grupo Bianchi tem recursos que a Montesi nem sonha em
O silêncio no carro é quase palpável enquanto Ettore dirige pelas ruas de Milão. Entre organizar minha mudança para o Grupo Bianchi e me desligar da Montesi & Co., os últimos dias passaram voando. Ao menos isso serviu para que eu tivesse menos tempo com Ettore. — Lembre-se de que isso é estritamente profissional — ele diz, interrompendo meus pensamentos sem desviar os olhos da estrada. — O fato de ser minha esposa não te dá privilégios lá dentro. — Nunca pedi por privilégios — rebato, virando o rosto para encará-lo. — Estou indo pelo meu trabalho, não pelo seu sobrenome. — Pelo menos estamos com o mesmo pensamento — responde, frio. — A equipe já está resistente o suficiente, sem precisarmos adicionar mais drama. Ele volta ao silêncio habitual, enquanto eu demoro um pouco mais o encarando antes de finalmente desviar o olhar. Hoje, Ettore acordou diferente. A frieza e a indiferença estão presentes, claro. Mas também há algo que parece… nervosismo. Como se o fato de trabalharmos
“Ettore Bianchi” As portas da sala de reuniões se fecham atrás de mim, e todos os olhares se voltam na minha direção. O conselho está completo hoje — uma coincidência conveniente para quem quer questionar minhas decisões recentes. Giorgio Ricci, sentado à direita de onde meu pai costumava ficar, tamborila os dedos sobre a mesa de madeira polida. Seu olhar de desaprovação é tão sutil quanto um martelo. — Bom dia, Sr. Bianchi — meu tio Alessandro me cumprimenta. — Estávamos analisando os números das últimas semanas. Impressionantes, devo dizer. Ocupo meu lugar na cabeceira da mesa, abro minha pasta e encaro cada um deles com calma. — Os números são aceitáveis, mas continuam longe do que podemos alcançar — respondo, mantendo o tom neutro. — Concordo plenamente — Giorgio intervém, inclinando-se para frente. — Principalmente considerando suas recentes… contratações. Ah… Então é sobre isso. — Se está se referindo à minha esposa e à assistente dela, sim, elas se juntaram hoje ao dep
“Liz Bianchi”Dois dias. Apenas dois dias foram suficientes para entender por que o departamento de design está estagnado.Não é por falta de talento — alguns dos designers realmente têm isso. É por falta de liberdade criativa.Paolo, o homem que me recebeu com hostilidade declarada, governa o setor como um pequeno ditador. Tudo, absolutamente tudo, precisa da bênção dele.Suspiro, reunindo as anotações que fiz nesses dois dias. Está na hora de apresentá-las a Ettore e, honestamente, não estou ansiosa por isso.Ouço a porta do meu escritório se abrir. Levanto os olhos, esperando ver Giulia, mas me deparo com outra pessoa.Isabella Ricci.Meu corpo se tensiona rápido, mas me forço a endireitar a postura.Claro que ela trabalha aqui. Porque a vida, às vezes, tem um senso de humor questionável.— Liz Bianchi — ela pronuncia meu sobrenome com um desdém quase palpável. — Finalmente posso dar as boas-vindas oficiais à nossa mais nova diretora de criação.— Isabella, que surpresa — respondo,
“Ettore Bianchi” Observo o rosto da minha mãe, deformado pela fúria mal contida, e sinto aquela velha exaustão conhecida. O mesmo olhar, a mesma tensão. As mesmas batalhas. Liz alterna o olhar entre nós dois, claramente ponderando se deve sair ou enfrentar minha mãe de frente. Mas agora, ciente de que Liz parou de recuar e se intimidar, não posso deixar isso acontecer. Não aqui. Não com minha mãe prestes a colocá-la para fora com as próprias mãos. — Liz, nos dê licença, por favor — digo, mantendo o tom calmo e profissional. — Claro, volto depois.— ela responde, visivelmente insatisfeita. — Ou podemos discutir isso na nossa casa, marido. Ela solta a provocação com um meio sorriso e segue até a porta. Ao passar por minha mãe, Chiara se afasta como se Liz fosse portadora de um vírus mortal. A porta mal se fecha, e minha mãe já me encara com intensidade. — Você não deveria estar em Turim? — pergunto, arqueando uma sobrancelha. — Não era esse o plano? Ficar longe das lembranças e
“Liz Bianchi” O dia finalmente termina, e me permito afundar na cadeira com um suspiro exausto. Meus dedos continuam sujos de grafite, resultado dos intermináveis ajustes que fiz nos desenhos depois da reunião desastrosa com a equipe. A porta se abre e Giulia aparece com duas xícaras de café. — Você parece acabada — comenta, colocando uma das xícaras na minha mesa. — É assim que me sinto — respondo, pegando o café com um sorriso grato. — Este dia parece não ter fim. Giulia puxa uma cadeira e se senta à minha frente, estudando meu rosto. — O que aconteceu? Solto um suspiro pesado, esfregando as têmporas. Por alguns minutos, faço um resumo do que aconteceu. Desde Isabella fingindo simpatia até Chiara, me expulsando da sala do meu marido como se fosse a dona de tudo. — E, para completar, Paolo inocentemente derrubou café na minha amostra de tecido — concluo, fechando os olhos por um segundo. — Que dia, hein — responde Giulia, quase com pena. — E isso é só o início. — Não esto
Ettore mantém os olhos fixos nos meus, como se tentasse ler o que se passa na minha cabeça. Seu rosto continua tranquilo, mas seu olhar muda, se torna mais frio, mais calculado. — Podemos ir embora? — pergunto, num tom mais baixo do que eu gostaria. — Não — responde calmamente, tomando um gole de vinho. — Acabamos de pedir a sobremesa. Lanço-lhe um olhar irritado, percebendo o brilho satisfeito em seus olhos. Ele está gostando disso, claro que está. Mais uma oportunidade de me ver vulnerável, desconfortável. — Como quiser — respondo, tentando aparentar uma calma que está longe de existir. Seguro o guardanapo com força, tentando controlar a ansiedade que cresce dentro de mim. O que deveria ser uma refeição tranquila após um dia caótico se transformou em mais um teste. Mais uma tortura. Desvio o olhar para Marco, que agora está sentado em uma mesa próxima. Ele não nos viu, mas é só uma questão de tempo. O sócio ao lado dele provavelmente já me reconheceu. E então acontece. Marc
Uma semana se passou desde aquele dia caótico, desde aquela noite de farpas trocadas nas escadas. Sete dias de silêncio educado e distância proposital. É como se tivéssemos estabelecido uma trégua não verbal, cada um mantendo-se em seu território. Ettore no escritório, eu no quarto. No café da manhã, interpretamos nossos papéis com perfeição diante dos empregados e seguimos com vidas separadas que raramente se cruzam. Na empresa, é a mesma coisa. Educação fria, profissionalismo exagerado. Como se aquela noite tivesse esgotado todas as emoções possíveis entre nós. É estranho como um único dia caótico parece ter valido por sete dias monótonos. Como se o universo tivesse decidido nos dar um breve respiro antes da próxima tempestade. E a próxima tempestade, aparentemente, é uma viagem de negócios à Suíça. — Liz, essa blusa já está implorando por misericórdia — a voz de Giulia me arranca dos pensamentos. Olho para a peça em minhas mãos, que de fato dobrei e desdobrei tantas vezes qu