Capítulo 5 - Isabella Mendes

Nada me preparou para reencontrar Dante Vasconcelos.

Meu coração acelera só com a vaga lembrança do seu toque firme em mim, seus olhos gentis me encarando com escrutínio.

Dante sempre odiou coquetéis e ventos corporativos, ele nunca ia a nenhum deles. Nas poucas ocasiões em que eu o convidava para ir, ele me convencia de que, se eu queria usar um vestido chique, nós podíamos ir para qualquer outro lugar. Então me levava para algum jantar romântico que sempre terminava na cobertura dele, com o vestido arremessado num canto qualquer.

Ver Dante lá fez com que eu me sentisse… traída?

Era mais confortável imaginar que ele continuaria odiando e evitando certas coisas porque isso sempre me deu a falsa sensação de que o mundo tinha parado para me esperar.

Por muito tempo achei que, quando eu fosse me reerguer, conseguiria continuar exatamente de onde parei. Era o tipo de ilusão que me mantinha em pé, tentando, lutando.

Claro que, no fundo, eu sabia que isso era impossível, e com o tempo perdi a perspectiva de voltar para aquela vida. Eu nunca mais voltarei a ser aquela Isabella Mendes.

Argh. Nos últimos meses o apelido Bella adquiriu um gosto amargo em meus ouvidos, mas ouvir Dante pronunciando com sua voz grave, fez coisas… contraditórias com meu corpo.

Quero muito acreditar que Dante Vasconcellos não é nada além de um rosto do passado, uma lembrança de uma época que eu prefiro esquecer, mas quanto mais penso nele, mais rancorosa me sinto.

Aparentemente, enfrentar seu avô e devolver a empresa do meu pai para seu legítimo dono não era algo que ele estava muito preocupado na época.

“Fusões assim acontecem o tempo todo, não posso bater no escritório do meu avô e exigir que ele devolva tudo para seu pai, não sei qual foi o acordo que eles fizeram, mas não é assim que funciona.”

Fazia tempo que eu não lembrava dessa conversa, talvez porque eu já tinha esquecido como era a voz de Dante, mas agora ela está vívida demais na minha cabeça e eu acabo me lembrando de muitas outras coisas inconvenientes.

“Eu te amo tanto, Bella, me diz o que posso fazer pra ajudar.”

“Você é linda, é a mulher mais linda que eu já vi.”

“Um dia eu ainda vou colocar um anel nesse dedo.”

— Chega! — digo, interrompendo as memórias que me inundam como se uma represa tivesse se rompido dentro de mim.

Dante me deixou partir e seguiu com sua vida.

A parte boa de reencontrá-lo é saber que tudo realmente acabou. Não existe mais nada entre nós, não preciso nem me preocupar em esbarrar com ele outra vez, já que não vou aceitar outro trabalho desses e ele nunca vai chegar nem perto do lugar decadente onde estou agora. Vivemos em mundos totalmente diferentes agora e existe um abismo entre nós.

Eu deveria estar preocupada com meu pai e com as dívidas novas que adquiri no hospital depois da sua última internação. Ele está em casa agora, o que também não é o ideal, passo o dia fora e não tenho como controlar o que ele faz. O máximo que consigo fazer é esconder todos os remédios no meu quarto e torcer para que ele desperte desse torpor.

Meu celular vibra com uma notificação, quase ignoro pensando que é mais cobrança, mas o que encontro nas mensagens é muito pior.

“Bella, Dante Vasconcellos aqui, espero que não se importe, mas tive muito trabalho pra conseguir seu número. Precisamos conversar. Podemos jantar hoje à noite? Hotel Imperial, 20h.”

Leio a mensagem três vezes, como se as palavras fossem mudar de significado se eu piscasse. Conversar sobre o quê? E como ele conseguiu meu número? O que esse homem está aprontando?

Eu estava me esforçando para superar nosso encontro acidental há uma semana e agora ele me convida para um jantar?

Enfio o celular no bolso outra vez e foco nas mesas que preciso limpar. Passo boa parte do meu turno no café tentando ignorar o convite e, quando pego o celular final do turno para conferir e-mails ou enviar currículos, preciso fazer um esforço hercúleo para não abrir a conversa com ele.

Mas é tão difícil e não sei o que é pior, carregar tantos anos de lembranças e frustrações ou me esforçar para fingir que elas não existem.

Digito com um desconforto incomum no peito.

“Desculpe, Dante, mas não temos nada para conversar. Por favor, não me procure mais.” Envio sem hesitar, do contrário há chances de desistir e mudar de ideia.

O resto do dia passa arrastado, as gorjetas são boas, mas nunca boas o suficiente. Quando chego em casa meu pai está, como sempre, deitado no sofá.

Marcho para o quarto e vasculho meus armários. Estou cansada demais e talvez seja a hora de me desfazer do relicário de ouro que herdei da minha avó. Recebi uma oferta por ele alguns meses atrás, mas desisti da venda pelo valor emocional. 

Talvez seja hora de desapegar, quitar as dívidas é mais importante do que me apegar à pessoas que não estão mais aqui.

Com algumas poucas mensagens, descubro que o comprador ainda está interessado e em questão de minutos temos um encontro marcado em uma boate.

Já me desfiz de praticamente todas as minhas coisas, vendendo aqui e ali, ou trocando por itens básicos. Foi difícil, mas não sobrou quase nada da minha vida antiga, exceto um vestido que guardei caso precisasse para esse tipo de situação. 

O único problema é que foi um presente de Dante e eu não queria ter que pensar nele agora.

A balada não tem a mesma exclusividade dos lugares que eu costumava ir, mas ainda é de alto nível. Bem acima do que posso bancar sem me sentir culpada por gastar esse dinheiro.

Peço um drink no balcão, para ter com o que ocupar as mãos enquanto espero pelo comprador.

O álcool passa doce pela boca e queima levemente quando desce pela gargante. Bebo rápido demais, logo meu copo está vazio. Reviro o cardápio procurando opções mais baratas e eficazes de gastar pouco e ficar bêbada rápido, quando uma mão grande aperta minha cintura e um corpo massivo me prensa contra o balcão.

A primeira coisa que penso é em Roberto e meu sangue gela.

Tento me desvencilhar de seu toque, empurrá-lo para longe e ao menos me virar. Mas o homem roça os lábios em meus ouvidos e fala com a voz arrastada de quem já bebeu mais que o suficiente.

— Desculpa o atraso, linda. Que bom que você mudou de ideia.

— Será que… — tento me mover, mas ele projeta o corpo ainda mais contra o meu. — Podemos tratar de negócios?

— Negócios? Ah, você diz aquele relicário velho? Ele não vale muita coisa, talvez se você tivesse algo a mais para me oferecer… O que acha?

Me preparo para gritar, apesar do nó em minha garganta, mas uma voz nos interrompe:

— Nem fodendo.

No instante seguinte, o homem que me encochava está caído a alguns passos de distância.

— Calma, cara — um terceiro homem intervem. — Até que enfim te encontramos — ele diz para mim e finalmente enxergo o que está acontecendo.

Enzo Martelli, bem na minha frente, se colocando entre o homem no chão e Dante Vasconcellos.

Isso não pode estar mesmo acontecendo.

— Você tá me seguindo? — Fuzilo Dante com os olhos.

— Não — ele responde despreocupado.

— O que está fazendo aqui então?

— Saindo com os caras… — ele dá de ombros. — E você o que está fazendo aqui? — Dante olha bem para o meu vestido, fazendo questão de mostrar que reconhece o presente. Depois olha para o homem que acabou de empurrar. — E com ele?

— Não te interessa — disparo. Eu deveria agradecer, mas estou com muita raiva.

— Ela que me chamou aqui, cara — o homem grita enquanto Enzo tenta contê-lo.

— Não para isso — me defendo, gesticulando para nós.

— Para o quê então? — Dante pergunta com os olhos estreitos, percebo ele flexionando os dedos das mãos, irritado.

Enciumado.

— Eu só queria vender… uma coisa.

— Já falei que aquela porra de relicário não vale nada — o homem diz.

— O relicário da sua avó? — Dante se surpreende, a postura ficando menos tensa.

— Vale muito mais do que você está disposto a pagar — retruco.

— Se é pelo dinheiro, toma… — Dante diz enfiando a mão no bolso, e tirando algumas notas da carteira. Ele j**a o dinheiro na cara do homem e agarra meu cotovelo, me afastando dali até um canto menos movimentado.

— Você ia mesmo vender o relicário? — ele pergunta.

Cruzo os braços, me afastando de seu toque e desvio os olhos para a pista.

— Preciso do dinheiro — respondo amarga.

Após um minuto de silêncio, Dante me surpreende:

— Bella, case comigo.

As palavras saem de sua boca com uma naturalidade assustadora, como se ele tivesse ensaiado aquilo muitas vezes, mas não consigo entender porque eu, porque agora.

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