6 - Seduzido e abandonado

Na cozinha, o cheiro de café fresco se misturava ao barulho de panelas e conversas abafadas.

Malu entrou carregando a bandeja vazia e deu de cara com Francine bocejando, encostada no balcão com a cara de quem nem lembrava o próprio nome.

Malu largou a bandeja com força desnecessária só pra causar impacto.

— Sua sorte é que sou muito sua amiga. Sabe que era você quem devia estar servindo o café hoje, né?

Francine levantou a cabeça com um sorriso cínico e fez um coraçãozinho com as mãos.

— E é por isso que eu te amo. Se eu aparecesse lá bocejando do jeito que tô, com certeza seria demitida.

Malu cruzou os braços, encarando ela como uma mãe que sabe exatamente o que a filha aprontou.

— Mas pelo menos você teria visto o que eu vi.

Francine endireitou o corpo na mesma hora.

— O quê? Conta agora!

O sono sumiu como mágica.

Ela chegou mais perto, quase tropeçando no avental, os olhos arregalados de curiosidade.

Malu olhou pros lados, como se o próprio Dorian pudesse surgir do chão.

— Ele... tava sorrindo.

Francine piscou. Depois piscou de novo.

— Sorrindo? O Dorian?

Malu fez que sim, com um ar de escândalo controlado.

— Enquanto tomava café. Sozinho. Nem tinha croissant envolvido. Só ele... e um sorrisinho besta de canto de boca.

Francine segurou o riso com a mão na frente da boca, mas os olhos brilhavam.

— Não... Não pode ser.

— Eu vi. Com esses dois olhos que a terra há de comer.

Francine tentou manter a pose.

— Talvez ele só tenha dormido bem.

— Aham. Pra estar sorrindo daquele jeito, tenho certeza que dormir foi o que ele menos fez essa noite.

Francine não respondeu.

Só pegou uma xícara, encheu de café e escondeu o sorriso atrás do vapor quente.

[…]

O elevador parou no último andar da Villeneuve Corporation, e as portas se abriram com aquele som sutil que já era parte da rotina.

Dorian saiu com passos firmes, impecável como sempre.

Mas tinha algo estranho naquele dia.

Uma leveza no andar. Um brilho discreto no olhar. E... quase imperceptível... uma dobra de sorriso nos lábios.

Cássio, seu vice-presidente e amigo de longa data, já o esperava na sala de reuniões com uma xícara de café na mão e a cara de quem sabia exatamente quando alguém não estava sendo 100% CEO de si mesmo.

— Que cara é essa, Dorian? Acho que nunca te vi de tão bom humor logo cedo.

Dorian pousou a pasta na mesa e afrouxou a gravata com um leve movimento, sem olhar diretamente para ele.

— Digamos que tive uma boa noite.

Cássio arqueou as sobrancelhas, rindo.

— Imagino que sim. Nunca vi você sumir tão rápido da sua própria festa.

Dorian puxou uma cadeira, sentou com calma.

— Eu já tinha visto tudo o que precisava.

— Aham... claro. Incluindo aquela mulher misteriosa que apareceu do nada, dançou com você por horas e desapareceu como um truque de mágica?

Dorian o encarou, sem disfarçar o interesse.

— Você a viu?

— Todo mundo viu. Mas ninguém sabe quem é. Chegou do nada, sumiu do nada... O vestido escarlate foi o assunto da madrugada no grupo da diretoria.

Dorian recostou-se na cadeira, olhando para a parede de vidro à frente.

— Ela não devia estar ali.

— E ainda assim... foi a única que te fez dançar. E te fez sorrir, aparentemente.

Silêncio.

Cássio, curioso como sempre, se inclinou um pouco pra frente.

— Vai me dizer que não pegou nome, nem número, nem nada?

Dorian virou o rosto pra ele, finalmente soltando um meio sorriso.

— Ela me deixou... uma máscara. E um bilhete.

— Você foi seduzido e abandonado, é isso?

— Eu fui... provocado. E deixado num jogo que agora é pessoal.

Cássio deu uma gargalhada curta, mas genuína.

— Pronto. Agora ferrou. Dorian Villeneuve, caçador de máscaras.

— Não se preocupe, Cássio. Eu vou encontrá-la.

— E o que você pretende fazer quando encontrar?

Dorian encarou o próprio reflexo no vidro. Depois respondeu, com a voz baixa e perigosa:

— Descobrir o que mais ela consegue me fazer sentir...

Cássio girou a xícara de café nas mãos, olhando Dorian com um meio sorriso malicioso.

— Você já deu uma olhada nas câmeras? Pra ver se ela veio com alguém, ou se foi embora sozinha?

Dorian deu uma risada curta pelo nariz, sem tirar os olhos do skyline da cidade à frente.

— Ainda não.

— Uau. Você realmente está levando isso no peito. Normalmente já teria feito uma triagem dos convidados e cruzado com as imagens em menos de vinte minutos.

— Justamente por isso não fiz ainda. Se eu tratar como um problema a ser resolvido, vou perder a parte mais interessante.

— Que é?

— O mistério. A provocação. Ela entrou na minha casa como se estivesse no próprio palco... E sumiu como fumaça. Não é o tipo de coisa que se desfaz com um replay de segurança.

Cássio riu, batendo com leveza os dedos na mesa.

— Desde quando você virou poético?

— Desde ontem à noite, aparentemente.

— Certo... e se ela for casada? Se for filha de um investidor, ou sei lá, uma infiltrada industrial mandada por alguma concorrente?

Dorian olhou de lado, impassível.

— Nesse caso, o risco só torna tudo mais... interessante.

— Ok. Então temos um novo Dorian na praça. Um CEO seduzido por uma mulher mascarada.

— E desaparecida. Não esqueça dessa parte.

Cássio já estava quase na porta quando se virou mais uma vez, os olhos ainda curiosos.

— Mas falando sério... Se fosse eu, já teria visto todas as câmeras da casa. Pelo menos pra saber se ela chegou sozinha. Ou se tinha alguém esperando do lado de fora.

Dorian não respondeu de imediato. Olhou para a xícara agora vazia em sua frente.

Por um instante, pensou no bilhete. No sorriso dela. No jeito como ela desapareceu sem deixar vestígio.

— Eu pensei em não fazer isso — disse por fim, com voz baixa. — O mistério tem seu próprio valor. Tem uma força.

Cássio o observava em silêncio, respeitando o raciocínio. Sabia que, quando se tratava de Dorian, decisões vinham como lâminas bem afiadas.

— Mas — Dorian continuou, levantando-se com calma —... eu também sou um homem que gosta de controle.

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