A rua do ateliê de cerâmica era um oásis de calma na selva de São Paulo. Árvores antigas ladeavam a calçada, e as casas, com suas luzes amareladas e jardins bem cuidados, respiravam uma tranquilidade que Gabriel achou quase obscena. Ele chegou uma hora antes do fim da aula de Marina, movendo-se pelas sombras com uma paciência que beirava a meditação. Ele não era mais o caçador no telhado, mas um predador no nível da rua, e o terreno era muito mais perigoso.
Ele escolheu seu ponto de espera: o vão escuro de uma garagem do outro lado da rua, parcialmente escondido por um arbusto de jasmim que perfumava o ar, um contraste bizarro com a tensão que emanava dele. Dali, ele observava a porta do ateliê, um ponto de luz e normalidade em sua noite de caos. Ele ouvia o som abafado de risadas, o tilintar de ferramentas, a música baixa que vazava pelas janelas. Era o som de um mundo que não lhe pertencia.
Em sua mente, ele ensaiava a abordagem. Repassava as palavras, os gestos, as possíveis reações