Capítulo 2

O amanhecer chegou tímido, filtrando-se pelas frestas da cortina. Apesar das poucas horas de sono, Sophie levantou-se antes mesmo do despertador tocar. O corpo pedia mais descanso, mas a mente já estava desperta, como se a insônia da noite anterior tivesse deixado um resíduo de inquietação.

Seguiu para o chuveiro. A água morna caiu sobre seus ombros, dissolvendo aos poucos a tensão acumulada, embora não apagasse o cansaço nos olhos. Respirou fundo, fechando-os por um instante, tentando se concentrar apenas no presente — no vapor suave, no som constante da água, na sensação de recomeço que cada banho sempre lhe trazia.

No quarto, escolheu seu traje de trabalho: calça preta confortável, camisa social igualmente preta e o colete cheio de bolsos onde guardava lentes, cartões de memória e pequenos ajustes de luz. O uniforme da fotógrafa — prático, invisível, como ela gostava de ser.

Enquanto prendia os cabelos num coque simples, ouviu o celular vibrar sobre a mesa.

Uma mensagem de sua editora.

> "Evento internacional em Veneza. Precisamos de você para a cobertura oficial. Passagem e estadia garantidas. Confirma?"

Sophie leu e releu as palavras. Veneza.

O nome trouxe à mente imagens que ela só conhecia por fotografias: canais reluzindo ao entardecer, pontes antigas, fachadas que pareciam guardar histórias em cada rachadura da parede.

Por um instante, sentiu algo diferente. Uma pontada suave de curiosidade, quase entusiasmo — sensações que não visitavam seu peito há muito tempo.

Digitou a resposta antes que mudasse de ideia:

"Confirmo."

Sem saber, naquele momento havia aberto a porta para uma história que mudaria tudo.

...

O metrô estava mais cheio do que de costume, e Sophie, como sempre, manteve-se em silêncio no canto, observando rostos apressados e olhares distraídos. Ao chegar ao prédio da agência, foi recebida pelo aroma familiar de café recém-passado e pelo burburinho de vozes que se misturava ao som suave de cliques de teclado.

No escritório da diretora de produção, assinou o contrato com atenção, cada página representando não apenas um trabalho, mas a chance de respirar um ar diferente, ainda que fosse por poucos dias. Ajustou com a equipe os detalhes da viagem: horários de voo, hospedagem, credenciais para o evento. Tudo estava marcado para a manhã seguinte.

— Vai ser um grande evento, Sophie. Veneza é mágica — disse a diretora com um sorriso discreto.

Sophie apenas assentiu, guardando o envelope com as passagens. Não se permitia criar expectativas, mas algo em seu peito já começava a pulsar diferente.

O resto do dia foi dedicado ao trabalho. No estúdio, fotografou modelos para uma campanha de perfume, ajustando luzes, corrigindo poses, analisando ângulos. Tudo com a precisão habitual. Mas, entre um clique e outro, a mente insistia em vagar. Via-se atravessando canais estreitos, sentindo o cheiro salgado do mar, observando fachadas antigas refletidas na água.

O sol já havia se escondido quando ela finalmente voltou para casa. Jogou a bolsa no sofá, acendeu uma luminária suave e começou a arrumar a mala. Roupas práticas, um ou dois vestidos para jantares, casacos leves — mas, acima de tudo, suas ferramentas de trabalho: câmeras, lentes, cartões de memória, baterias extras. Para Sophie, viajar sem sua câmera seria como viajar sem parte dela mesma.

Quando tudo estava pronto, tomou um banho demorado, deixando a água morna escorrer lentamente pela pele, como se pudesse lavar também o peso dos últimos dias. Vestiu uma camiseta larga, preparou algo rápido para comer e sentou-se à mesa, comendo em silêncio.

Na cama, o cansaço finalmente a alcançou. Deitou-se olhando para o teto, ouvindo o som distante da cidade. Amanhã, antes do sol nascer, partiria para um lugar que só conhecia por fotografias.

Fechou os olhos. Pela primeira vez em muito tempo, adormeceu com um pressentimento bom.

....

O despertador tocou antes que o céu clareasse. Sophie levantou-se de imediato, vestindo-se com calma, como se cada peça escolhida fosse parte de um ritual para manter a mente focada. Calça confortável, camisa branca simples, casaco preto elegante. Cabelo preso de maneira prática, maquiagem leve.

Fechou a mala, conferiu passaporte, documentos e câmera, e desceu as escadas até a calçada silenciosa. O táxi chegou pontualmente, o motorista apenas acenou, e Sophie entrou, sentindo o frio da manhã em Paris desaparecer assim que a porta se fechou.

No aeroporto, logo avistou Lucas e Émilie, seus colegas de equipe. Lucas, como sempre, parecia carregar o sol no bolso — sorriso largo, piadas prontas e um entusiasmo que chegava antes dele. Émilie, mais reservada, cumprimentou Sophie com um beijo rápido no rosto.

— Mal posso esperar pra ver aquelas gôndolas — disse Lucas, enquanto puxava o carrinho com as malas. — E dizem que as mulheres de Veneza… meu Deus… mon amour. — Ele riu sozinho, piscando para as duas.

Sophie sorriu de leve, mas respondeu apenas com um breve comentário educado. Preferia ouvir.

O embarque foi anunciado e seguiram para a primeira classe, cortesia da agência. O corredor cheirava a café fresco e couro novo, e o murmúrio baixo dos outros passageiros preenchia o espaço. Sophie encontrou sua poltrona junto à janela, acomodou a mala de mão no compartimento superior e sentou-se, ajustando o cinto com tranquilidade.

Lá fora, as luzes da pista piscavam contra o céu acinzentado da manhã. Encostou a cabeça no apoio e apoiou a mão na câmera, como se precisasse sentir o peso dela para lembrar que aquele não era um simples passeio.

Enquanto o avião se preparava para decolar, fechou os olhos por um instante e fez um pedido silencioso: que essa viagem trouxesse coisas boas… ou, pelo menos, não levasse nada mais dela.

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App