Siena Dal
Voltar para o meu quarto de hotel foi como entrar em uma jaula. O ar, antes carregado com a promessa de Milão, agora parecia pesado e sufocante. Sofia, exausta pela montanha-russa emocional, finalmente adormeceu, sua respiração suave um contraste gritante com a tempestade dentro de mim.
Eu me sentia suja. A mentira que contei a ela era uma mancha na minha consciência, mais permanente que qualquer marca que minha mão deixou no rosto de Li Wei. Andei até a janela, olhando para as luzes da cidade sem realmente vê-las. Eu precisava de ar. Precisava de alguém com quem pudesse ser honesta, ou pelo menos, alguém que pudesse me distrair da minha própria covardia.
Peguei o celular. Havia apenas uma pessoa em Milão a quem eu poderia recorrer.
– Sei que é tarde 'cugino'. Preciso de um café forte e de um rosto amigo. SOS.
A resposta foi quase imediata.
– Estou a caminho. Levo o café, você providencia o drama. Ti aspetto, cugina
Um pequeno sorriso, o primeiro em horas, tocou meus lábios. Lorenzo.
Vinte minutos depois, uma batida suave soou na porta. Abri e lá estava ele, encostado no batente como se estivesse posando para a capa da Vogue Italia. Lorenzo era classicamente bonito, com o cabelo escuro perfeitamente penteado, olhos castanhos inteligentes e um maxilar que parecia ter sido esculpido em mármore de Carrara. Ele usava um suéter de caxemira e calças impecáveis, segurando dois copos de papel da 'Caffè Amoretti'.
Ele entrou, seus olhos passando pela suíte e pousando por um segundo na figura adormecida de Sofia antes de encontrar os meus com uma pergunta silenciosa. Guiei-o para a pequena varanda, fechando a porta de vidro atrás de nós para não acordá-la. Guiei-o para a pequena varanda, fechando a porta de vidro atrás de nós para não acordá-la.
– Obrigada por vir,– eu disse, tomando um gole do café. Era forte, amargo, exatamente o que eu precisava.
– Siena,– ele começou, apoiando-se na grade e me estudando com um olhar que via mais do que eu gostaria. – Eu te conheço desde que você era uma pirralha que colocava areia no meu macarrão na praia. O que aconteceu? E não me diga 'nada'. Esse 'nada' está estampado no seu rosto.
Eu hesitei. O acordo de confidencialidade era uma mordaça. Mas Lorenzo não era qualquer um. Ele era família.
– Eu fiz algo estúpido, Enzo. Algo incrivelmente estúpido.
– Isso não é novidade,– ele brincou, mas seu tom era gentil. – Elabore.
Respirei fundo o ar frio da noite milanesa. – Você conhece o ator, Li Wei?
Lorenzo ergueu uma sobrancelha. – Quem não conhece? Ele é o embaixador da Lusso. Vi o rosto dele em um outdoor do tamanho de um prédio hoje. Por quê? Ele criticou suas joias? Devo organizar um boicote fashion?
– Pior,– murmurei. – Eu bati nele.
Lorenzo engasgou com o café, seus olhos se arregalando em uma mistura de choque e admiração mal disfarçada. – Tu... cosa? Você bateu em Li Wei? O Li Wei?– Ele me olhou de cima a baixo. – Mia cugina selvatica, você se superou.
– Não tem graça, Enzo. A irmã dele me fez assinar um acordo de confidencialidade. Ameaçou arruinar minha apresentação. Arruinar tudo.
A diversão desapareceu do rosto de Lorenzo, substituída por uma seriedade protetora. – Ok. Por que você bateria no homem mais fotografado da Ásia? Ele mereceu, presumo.
Contei a ele. Sobre Sofia, o golpe, a foto, a minha fúria cega. Deixei de fora a mentira que contei a ela depois, a vergonha era grande demais para admitir em voz alta.
Ele ouviu em silêncio, seu rosto se tornando uma máscara pensativa. – É uma história horrível,– ele disse finalmente. – Mas... não parece o estilo dele.
– O que você quer dizer?
– Li Wei,– Lorenzo ponderou, olhando para o horizonte. –Ele é o garoto de ouro. Sua imagem é controlada com precisão militar. Arriscar um escândalo internacional por... alguns milhares de euros? É confuso. Não se encaixa na marca. É como se a Ferrari lançasse um cortador de grama. Simplesmente não faz sentido, vamos ter que investigar melhor.
Suas palavras, ditas com a lógica de quem entende o mundo da imagem e da marca, plantaram a primeira, semente de dúvida em minha mente. Eu a enterrei imediatamente.
– Ele é um ator, Enzo. A vida dele é fingir.
– Talvez,– ele concedeu, sabiamente não pressionando. Ele me conhecia bem o suficiente para saber quando recuar. – Mas a irmã dele, Li Lin, não é atriz. Ela é um tubarão. Se ela te encurralou, tome cuidado, Siena. Tubarões sentem o cheiro de sangue na água. E agora, você está sangrando.
Ele colocou a mão no meu ombro, um gesto de companheirismo e apoio. – Amanhã, você vai se concentrar no seu desfile. Crie a sua magia, mostre a eles quem é Siena Amoretti Dal. Deixe que eu mantenho meus ouvidos abertos. O mundo da moda é menor do que parece. E muito mais fofoqueiro.