♡ Bianca ♡
O toque estridente do celular arrancou-me do sono em um pulo. Estiquei o braço para silenciar o demônio eletrônico antes que o homem ao meu lado acordasse também. Nem desliguei a chamada e outra se fez ouvir com a foto da minha mãe preenchendo a tela.
Merda!
Agarrei o vestido vermelho, amassado no chão, e enfiei-o no corpo enquanto corria para fora do quarto, fechando a porta para não acordá-lo.
— Bianca, finalmente! — A voz aguda de Marta Malocchio perfurou meus ouvidos e levou de vez meu sono. — Onde você está? Estou ligando e mandando mensagens desde o papelão que fez ontem!
Respirei fundo.
— Estou bem, obrigada por perguntar.
— Essa é a maneira de falar com sua mãe? — Ela bufou. — Jéssica está destruída depois do que você fez.
— Depois do que EU fiz? Foi ela que transou com meu noivo no dia do MEU casamento, lembra?
— Você é a mais velha, Bianca. Precisa entender. Jéssica é frágil, não tem culpa se seu noivo a seduziu.
Frágil. A palavra ecoou na minha mente como um tiro. Frágil era a desculpa perfeita para tudo. Frágil justificava as mentiras, os empregos perdidos, os namorados roubados. Frágil era o passe livre para ser uma merda de pessoa.
— Não perdoarei a fragilidade que sempre fode com a minha vida — anunciei encerrando a ligação.
Era estupidez. Em algumas horas receberia outra ligação, mas, por algumas horas, dona Marta estaria armando um script novo para defender a filha predileta.
Olhei para o quarto fechado, onde ele ainda dormia. O desconhecido. O homem que me fez gritar até perder a voz. O mesmo que, por algumas horas, me fez esquecer que eu era a Bianca Malocchio – a noiva traída, a irmã trocada, a filha que nunca era suficiente.
E agora?
Totalmente sóbria, analisei minha falta de arrependimento. Nada. Apenas um desejo perverso: que Aidan me visse assim - banhada em prazer, cabelos desalinhados, pele marcada por outra mão, outra boca, outro corpo. Que soubesse que, longe de passar a noite chorando minha humilhação, passei gritando de êxtase.
Olhei meu celular. Não me surpreendendo com as várias notificações, apenas o silenciei e voltei para o quarto.
Ele ainda dormia, rosto parcialmente enterrado no travesseiro.
Perfeito.
Deitei ao seu lado e posicionei o braço dele em volta da minha cintura, contendo o ar nos pulmões quando ele resmungou algo ininteligível.
Confirmando que não o acordei, posicionei a câmera do celular em um ângulo perfeito: meu sorriso de vingança, o braço marcando território na minha cintura. Um filtro sutil para realçar a cena.
Clique.
Analisei a foto. Uma obra-prima. Eu parecia poderosa. Desejada.
Abri minha rede social, dedos dançando na tela:
Alguns perdem anéis. Eu ganhei um upgrade. #ViradaDePágina Marcaçāo: @AidanHart.
Meu coração disparou, mas não de medo ou arrependimento. De satisfação. Ele merecia cada facada de ciúme, cada segundo de insônia imaginando quem passou a noite e a manhã ao meu lado.
Recolhi minhas coisas em silêncio antes de partir em definitivo. Na porta, olhei uma última vez para o homem que foi meu cúmplice involuntário na minha vingança.
Obrigada pelo serviço. A vingança nunca tinha sido tão doce e prazerosa.
Com os saltos nas mãos para não despertá-lo, saí sorrateira.
A chave ainda estava na porta – prova da nossa urgência. O elevador desceu, devolvendo a cada andar um pouco da Bianca certinha.
Na rua, verifiquei as mensagens.
Mãe e Pai: Seja madura, Bianca. Sua irmã está sofrendo também. Seja compreensiva.
Aidan: Nos vemos em casa.
Jéssica: Ele não admiti, mas me ama.
Meus dedos apertaram as extremidades do aparelho até doer antes de responder a mensagem da cobra que tenho como irmã:
Fique com esse lixo. São feitos um pro outro.
Olhei para o prédio atrás de mim. A tentação de voltar para aqueles braços – de trocar meu inferno por outro mias agradável – quase me derrubou.
Não.
Café preto. Trabalho. Reconstrução.
Essa é minha nova missão.
Foi apenas uma noite. Nunca mais verei esse homem novamente, determinei.
~*~
O banho quente tinha levado parte da tensão do confronto com minha mãe, mas não o gosto amargo que ficou na minha boca. Preciso de café. Muito café. Assim que as portas do elevador se abriram no andar da presidência, apressei o passo em direção à pequena copa do andar, a expectativa pelo líquido fresco me guiando como um farol. Enchi minha caneca até a borda. Hoje lidarei com reuniões, planilhas, curiosos e meu ex cretino, preciso de combustível suficiente para não cometer um crime.
Foi quando virei para sair da copa e ir para minha mesa que o um mau presságio de terno azul-petróleo barrou minha felicidade, com um sorriso que já me fez derreter, e que agora só me dava raiva.
— Bianca, precisamos conversar — ele fechou a porta, aproximando-se com passos calculados.
Fechei meus dedos com força em volta da caneca.
— Caso não seja sobre a empresa, não temos nada a conversar, Diretor Hart. — Mantive o tom neutro, profissional, como se ele fosse só mais um colega irritante de trabalho. O que em parte ele é. A outra parte é um tremendo babaca traidor.
Ele suspirou, dramático, como se estivesse carregando o peso do mundo.
— Vi a foto que tirou e creio que estamos quites. A perdoo, como sempre fiz até hoje.
— Sempre fez?! — O encarei em dúvida se ouvi direito. — De que exatamente me perdoou?!
— Pelo seu distanciamento nos últimos meses. — Os olhos azuis perfuraram os meus, fingindo vulnerabilidade. — Sempre cansada e ocupada quando preciso.
— Ah, ótimo! — soltei indignada. — Deixa ver se entendi. — Apertei os óculos no nariz, como se isso me ajudasse a decifrar a audácia desse cretino com cara de anjo. — Você me traiu, de novo, e com a minha irmã, porque não te dei atenção?
— Talvez, se você tivesse sido mais presente...
— Que conveniente! Se eu estivesse presente, talvez, quem sabe, eu evitasse você cair de boca na minha irmã.
Ele franziu a testa, como se eu estivesse sendo irracional.
— Você sempre faz isso. Transforma tudo em um ataque. Eu só queria explicar que não foi premeditado.
— Ah, claro! A culpa é minha EU não te dei atenção. EU te ataco. EU te empurrei pra dentro das saias dela minutos antes do NOSSO casamento.
Aidan soltou um riso baixo, quase condescendente.
— Vocês duas sempre competiram. Deveria saber que isso ia acontecer.
Pisco.
É O QUÊ?
Meu corpo reagiu antes do meu cérebro. Num movimento rápido joguei o café nele.
O filho da puta ágil, desviou.
O café voou em um arco perfeito e...
Acertou em cheio o peito de um homem que abriu a porta da copa.
O choque não vem por acertar a pessoa errada, o choque me mortifica ao me dar conta de quem acertei.
— O que faz aqui?