O Grito Silencioso
O apartamento amanheceu envolto por uma névoa úmida.
Lá fora, o som distante de sirenes misturava-se ao canto rouco de pombas nos parapeitos. Gabriel acordou antes mesmo dos raios de sol.
O braço latejava, mas a dor era menor que o aperto no peito.
Os olhos pesados avistaram, na escrivaninha, o vidro de um calmante que Raquel deixara estrategicamente ao alcance, como se fosse uma ordem para mantê-lo calmo.
Ele recusou o comprimido, sacudiu a cabeça e tentou ignorar a mão invisível que apertava seu coração.
Era sexta, dia de terapia. Mas Raquel disse a Ronaldo, na frente do menino, que a sessão era supérflua que ali, em casa, ela cuidaria.
— Ele não precisa de mais uma madrasta babá, declarou Raquel, em tom de conselho.
— É coisa da psicóloga, essa choradeira.
Ronaldo acenou, desviando o olhar. Gabriel sentiu a humilhação quente como chama.
Apertou o ursinho e saiu de casa para caminhar na sacada, pendurado no corrimão metálico. Lá embaixo, a rua parecia um ri