RAVENEla nunca liga muito para os presentes, nem para os bolos. Nada a anima tanto quanto vir aqui.É um canto afastado da floresta que rodeia o castelo.Vejo como se aventura entre as árvores com curiosidade. Seu cabelo castanho-avermelhado solto, esvoaçando ao vento, uma tiarinha na cabeça e seu vestido rosa claro.Procura entre os arbustos, se agacha, ergue o nariz… e a observo cheirar o ar.Sigo-a de perto, meio escondida, e então a vejo chegar à clareira de sempre. Corre e revira tudo ao redor, até encontrar a caixinha no chão.O presente deixado para ela — como todos os anos.Ela o pega com um sorriso no rosto, mas nem sequer o abre, apenas olha ao redor, ansiosa.Eu não sinto, nem cheiro nada… deve estar usando algum truque, mas Amber o percebe. Ela sempre o percebe.— Oi, por que você nunca aparece, Duende? Tá com medo? Eu não vou te machucar — diz com sua vozinha infantil.Já me perguntou várias vezes, e sempre repito a mesma mentirinha tola: que é um duende da floresta, que
RAVENSomos responsáveis por ela, os pais confiaram em nós… mas como cuidar de dois adolescentes que agora são apenas amigos, e até quando isso vai durar?Os machos demoram mais pra perceber certas coisas, mas eu vejo como Zeraphina olha pro meu filho — e aquele olhar nunca foi de amizade.Já sinto cheiro de desastre se aproximando. Mas agora, preciso focar em um problema de cada vez.Observo as gêmeas ajudando Amber a procurar como sempre nos arredores. Desta vez, noto minha pequena nervosa e meio perdida.Me aproximo, preocupada.— O que foi, cachorrinha? Está se sentindo mal?— Não… é que… não sinto o Duende, como nos outros anos — diz fazendo biquinho, com aquela ruguinha na testa que puxou do pai.— Tem certeza? Procura bem… ele pode estar por aí, bem escondidinho — ajudo a afastar galhos e folhas.As gêmeas quase estão arrancando os arbustos pela raiz, procurando o tal presente do Duende — ou talvez o próprio Duende — ou qualquer coisa que as faça se sujar.Essas meninas são uma
RavenCaminhei pelos corredores dessa mansão enorme.Minhas mãos tremiam e suavam de nervosismo.Meu corpo ainda estava coberto de feridas, principalmente as do abdômen, que quase tiraram minha vida.Eu estava a caminho de ver meu salvador, o homem a quem devo estar viva hoje. Mas, acima de tudo, o único homem que pode me dar vingança e redenção.Fui conduzida até uma sala enorme e, no final, quase como se estivesse num trono, o vi sentado, revisando alguns papéis sobre uma mesa gigantesca.Só de estar na presença dele eu já me sentia intimidada. Ele é um Alfa puro. Mas eu... eu também não sou qualquer coisa, não mais. Então, busquei coragem dentro de mim e caminhei até o Alfa Walker.— Disseram que você pediu uma audiência comigo, que era algo muito importante — ele disse com aquela voz profunda, sem nem levantar os olhos do que estava lendo.— Eu tenho uma proposta pra te fazer — soltei depois de engolir em seco, e minha loba me dava forças, mesmo que a pressão do Alfa a mantivesse
Raven1 MÊS ANTES...As lágrimas caíam dos meus olhos sem que eu conseguisse evitar, meus nós dos dedos estavam brancos de tanto apertar o lençol, tentando cobrir meu corpo machucado, enquanto a vergonha e o nojo de mim mesma me consumiam.— Para de chorar como se eu tivesse te estuprado à força. Foi você quem veio com as próprias pernas se enfiar na minha cama.— Já chega dessa atitude de mártir, você tá começando a me irritar — ouço aquela voz cínica, enquanto ele se veste aos pés da cama e me olha com aqueles olhos tão odiosos e desprezíveis.— Então... minha irmã... você prometeu libertá-la... — digo, suplicante, enxugando as lágrimas que não param de cair, e o nó na minha garganta mal me deixa falar.— Vamos ver isso depois — ele responde como se não fosse nada, mesmo depois de já ter me prometido que não a entregaria como oferenda, se eu finalmente cedesse ao seu assédio.— Depois, não! Alfa, você prometeu que tiraria ela da seleção se eu... se eu me entregasse pra você... como
Raven— Não. Eu fiz isso pela minha irmã — respondi, fechando os olhos em agonia.Disse que não, porque não foi um estupro da maneira convencional, mas de certa forma, ele me forçou, me empurrou pra isso, porque, embora eu tenha caminhado sozinha até aquele quarto, eu tinha implorado muitas vezes pra ele não escolher a Verena, me ajoelhei e supliquei.Ela nem tinha completado 18 anos, ainda era menor de idade, minha mãe morreria por causa da doença no coração.Até me ofereci, num momento de desespero, pra ser o tributo no lugar dela, mesmo que isso significasse uma vida de escravidão, pior do que a morte. Mas ele só me olhou com desprezo e fez aquela proposta horrível.Disse que, se era pra ser a put4 do Rei Alfa como tributo, que era melhor ser a put4 dele.Esse sempre foi o objetivo dele, desde o primeiro momento em que colocou aqueles olhos obsessivos e nojentos em mim.Ele só se aproveitou do meu desespero.— Você podia ter esperado eu voltar, teríamos encontrado uma solução, eu t
RavenCabeça baixa, aguentando e aguentando, só por um gesto de boa vontade, só pela esperança de agradar à mulher que eu chamava de mãe.Eu sempre ficava responsável pela Verena. Na verdade, ela é só alguns meses mais nova que eu, nem é tão pequena assim. Mas bastava um fio de cabelo dela se estragar, e os castigos caíam sobre mim.Eu era a irmã mais velha e tinha que cuidar dela, garantir que nada acontecesse.Pra isso, sim, eu servia como irmã. Mas quando chegavam os brinquedos, os doces, os cosméticos, os vestidos e as roupas, tudo de melhor sempre era pra ela.Eu ficava com os brinquedos e roupas que ela descartava ou que não serviam mais.Nunca achei injusto. No meu coração, sempre soube que era a adotada, a falsa, e ela era a filha verdadeira.E eu era grata, mesmo pelo pouco que me dessem.Fazia o impossível pra não ser rejeitada, pra me encaixar naquela família, nessa matilha... que, no fundo, nunca me aceitou de verdade.Mas eu também não tinha pra onde correr.Sou como um r
RavenQuando voltei a abrir os olhos, por uma fresta minúscula que a inflamação me permitia, percebi que tinham me jogado em uma das celas.Úmida e sufocante, pequena, onde apenas um pouco de feno me separava do chão frio de pedra.Eu estava perdida, não sabia o que seria da minha vida agora.Mas logo, as respostas pras minhas perguntas chegaram — mais cedo do que eu esperava.— Já está consciente? — a voz que eu menos queria ouvir naquele momento falava comigo do lado de fora das grades: o Alfa da matilha.Levantei o rosto e o encarei com ódio e rancor.— Se você tivesse tido essa atitude antes, não teria sido uma presa tão fácil. Quem diria que a órfãzinha escondia esse gênio todo? — ele sorria com sarcasmo.— Esse era o espírito que devia ter tido na minha cama, e não o de uma frígida agonizante como você mostrou.— Você é um porco — cuspi, cerrando os dentes.— Comigo você fala direito, sua estúpida. Só porque te dei um pouco de privilégio, não se confunda... EU sou seu Alfa! — el
RavenEle não me devolveu o acordo para romper o vínculo e, se uma das partes não quer, não dá pra dissolver tão fácil assim, não sem mais poderes envolvidos ou sem que um dos dois morra.A escuridão o envolveu e a distância entre nós ficou ainda maior.Me afastei dali e nunca entendi por que ele não rompeu aquele compromisso odioso comigo. Por que, se eu estava dando a ele o que tanto queria, pra que pudesse se unir a outra loba?"Não me importa que você não tenha aceitado, no meu coração, eu sobreviva ou não, você nunca vai ser meu companheiro. Não quero sujar seus olhos com a minha presença, nunca mais" — foi minha última mensagem antes de ir embora, a caminho das terras do Rei Alfa.*****Já estávamos há dias na estrada, mal davam comida ou água pra gente.Só tiravam a gente das jaulas umas poucas vezes por dia, como se fôssemos bichos, pra fazer nossas necessidades fora do caminho — e se não, tinha que ser dentro da própria jaula.Qualquer reclamação ou demora, e o chicote descia