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O minarete mouro da Mesquita Cutubia, do século XII, ergue-se imponente, visível da janela do meu escritório. De onde estou, também avisto a Medina — uma cidade murada, vibrante e antiga, herança viva do Império Berbere. Suas ruas estreitas formam um labirinto de sons e aromas: os souks fervilham com tecidos coloridos, cerâmicas artesanais e joias tradicionais.
Estou em Marrakesh, a joia imperial do oeste do Marrocos. Aqui, entre mesquitas, jardins e mercados, reina o contraste entre o luxo e a história. O meu palácio, um símbolo de poder e tradição, ergue-se em um dos bairros mais ricos e privilegiados da cidade.
— Soberano — ouço a voz de Omar, meu conselheiro mais antigo.
Giro a cadeira e o encaro. A expressão dele carrega uma ansiedade incomum. O silêncio pesa entre nós.
— Algo errado? — pergunto, a voz firme, mesmo com a curiosidade crescente.
Ele demora a responder, e isso só aumenta meu desconforto.
— Há... uma pessoa que deseja falar com o senhor. — A voz de Omar treme, coisa rara para um homem sempre tão sereno.
— Essa pessoa se identificou?
Ele engole em seco, visivelmente perturbado.
— É sua... esposa.
— Como? — Pisco, incrédulo, certo de ter ouvido errado.
— Sua esposa — repete, a contragosto, quase sussurrando.
Allah! Que brincadeira é essa? Reprimo o impulso de gritar, mas a fúria atravessa minhas palavras.
— Quer dizer que Aysha está aqui? Minha futura esposa?
Ele balança a cabeça em negativa.
— Não, soberano. É... Anna.
O chão parece se abrir sob meus pés. Por um instante, o ar me falta. Meus punhos se cerram, as mandíbulas se travam.
Anna.
Omar me observa em silêncio, ofegante. Ele sabe. Ele viu o que ela fez comigo — a revolta, a dor, a ruína.
Primeiro veio a ira.
Afundei até o fundo do poço. Houve dias em que eu sequer conseguia levantar da cama. Se não fosse minha família, meus amigos... talvez eu não estivesse aqui agora.
A verdade, aquela que mal suporto admitir, é simples: sem Anna, eu apenas sobrevivi.
Passo a mão pelos cabelos, tentando conter a maré de lembranças que me invade. Recordações dela — de nós — que nunca me abandonaram. São fantasmas que aparecem sem aviso: um perfume, uma mudança no vento, uma canção... qualquer coisa é suficiente para reabrir feridas antigas.
Demorei anos para aceitar a ausência dela, mas aceitar não é esquecer. Caminho para frente, sim, mas sempre olhando para trás.
Usei todos os recursos possíveis para encontrá-la nos Estados Unidos. Contratei detetives, divulguei seu nome — tanto o de solteira quanto o meu sobrenome que ela levou. Cogitei até que tivesse mudado de identidade. Paguei por anúncios, espalhei suas fotos pela Califórnia, onde a conheci.
E nada. Nenhuma pista.
Agora, de repente, ela está aqui.
A fúria me domina. Dou um soco na mesa; o impacto ressoa pela sala e a dor na mão é menor do que a que sinto no peito.
Allah!
Levanto-me, começando a andar de um lado para o outro, feito um leão enjaulado. Sinto o sangue pulsar espesso nas veias. O ar se torna pesado. Minhas têmporas latejam, o suor escorre pela testa.
Fecho as mãos, abro-as de novo. Tento respirar, mas o ar parece faltar. Seguro-me no encosto da cadeira até o corpo obedecer.
Ela está aqui.
O simples fato de saber disso é como abrir, de uma vez, a caixa que contêm todas as memórias que jurei manter seladas. Elas escapam, cortantes, e me atingem com força devastadora.
Mas Anna não verá minha fraqueza.
Encaro Omar, tentando recuperar o controle da voz:
— Onde ela está?
— Na sala, senhor.
Dou um sorriso amargo, a incredulidade ainda me corroendo.
— Mando-a entrar? — pergunta ele, hesitante.
— Não. — Endureço o olhar. — Eu irei até lá.







