03 – O PESO DO LUTO

POV: HAPHEL

Tudo passou como um borrão confuso. As luzes, os sons, as perguntas dos policiais... nada parecia real. Quando contei sobre a ligação, a voz ameaçadora e os rosnados, disseram que eu estava em estado de choque. Que minha mente havia criado aquilo como forma de lidar com o trauma.

— Aquilo não foi imaginação. — Murmurei, com a voz baixa, os olhos pesados e ardidamente cansados. Diante da lápide da minha mãe, toquei a pedra gelada com a ponta dos dedos. — Eu vou descobrir quem fez isso com você, mamãe... Eu prometo. Vou encontrar essa coisa e fazê-lo pagar.

Beijei os dedos e os apoiei sobre o nome gravado na pedra. Um arrepio percorreu minha espinha de cima a baixo, deixando meu corpo rígido por instinto. Algo estava errado.

Levantei a cabeça devagar. A sensação de alguém me observando.

Olhei em volta no cemitério, atenta a qualquer movimento. O vento soprava leve, mas a sensação de estar sendo vigiada era sufocante. O estômago apertou, um frio subiu pela barriga. Meus dedos se fecharam em punho, aquela ameaça ainda ecoava em minha mente:

“Você será a próxima, princesa.”

— Por que aquela voz me chamou de princesa? — Murmurei, esfregando os braços. — Você sabia que algo estava vindo, não sabia, mamãe? Por isso estava tão assustada...

Sequei os olhos com o dorso do punho, respirando fundo para me manter de pé. Peguei o celular, mas algo na tela me fez parar. Uma notificação. Uma única mensagem. A Gravação, franzi o cenho. Era da minha mãe.

Toquei, hesitante.

— Oi, filha. É a mamãe. — A voz dela preencheu meus ouvidos, congelei. Meus dedos apertaram o aparelho, os lábios começaram a tremer. — Se está ouvindo essa mensagem, é porque... eu tive que partir. Me desculpe por te deixar assim.

— Mãe... — Sussurrei, quase sem som. Um nó se formou na garganta com tanta força que mal consegui engolir.

— Haphel, me perdoe, filha... Eu menti para você. — A voz da minha mãe tremia na gravação. — Ocultei o seu passado achando que, assim, te manteria segura. Longe daqueles que desejam o seu mal.

Ela fez uma pausa, e só o som da sua respiração já me deixou tensa.

— Mas infelizmente... aquele maldito nunca vai te deixar em paz.

Segurei o celular com mais força, o coração disparado. Dei um passo para trás e olhei para a lápide.

— De quem você está falando, mãe? — Perguntei em voz baixa, o olhar fixo na pedra fria. — Quem te fez viver com tanto medo?

A mensagem continuou, e a próxima revelação me atingiu.

— Seu pai não foi embora como eu te disse. Ele foi assassinado. Pela mesma pessoa que agora te caça. — A voz dela falhou, e um gemido abafado entregou a dor que ela tentava esconder. — Ele era um homem incomum, filha. Um ser extraordinário. Diferente de tudo o que você pode imaginar. Tudo o que fizemos foi por você. Para proteger quem você é. Para proteger nossa linhagem.

— Linhagem? — Repeti em voz baixa. — Por que ela me enviaria isso antes do ataque? — Sussurrei, engolindo em seco. — Se sabia que estava em perigo... por que não fugiu?

A gravação continuou, e a voz dela ganhou força:

— Você não pode ser pega, Haphel. Se for, tudo estará perdido. Promete que vai me ouvir? — respirou fundo. — Preciso que encontre Aidan Belmont. Ele é o único que pode te manter segura. Diga a ele... diga que... está na hora de pagar a dívida do Alfa Bryan.

— Alfa? O que é um Alfa? — Murmurei. — O que meu pai tem haver com isto?

— Ele saberá o que fazer. Vai te manter protegida. — A voz da minha mãe soava trêmula. — Na gaveta... está o colar de presa. Entregue a ele. É a prova de quem você é.

— Mas... quem eu sou? — Passei as mãos pelos cabelos, inquieta, os dedos pressionando a testa enquanto o coração martelava no peito. — Quem é esse homem?

A gravação seguiu, e cada palavra soava como uma despedida final:

— Eu sinto muito por tudo, Haphel. Ser sua mãe foi a maior honra da minha vida. — Ela respirou fundo. — Eu te amo, minha menina... Por favor, seja forte. Corajosa. Lute. Sobreviva... Confie em Aidan Belmont.

O áudio encerrou.

— Como posso confiar em alguém que nunca vi? — Sussurrei, a voz falha, mordendo o lábio com força para conter as lágrimas que insistiam em cair. — Como vou encontrá-lo?

Fechei os olhos com força, tentando afastar a dor latejante na cabeça. O rosto daquele homem veio à mente sem esforço. A forma como me segurou quando tudo desabava... o calor do seu corpo, firme, presente, me fez sentir protegida, mesmo por instantes. Meus braços se arrepiaram só de lembrar. Não fazia sentido, mas algo nele... algo me puxava.

Voltei à delegacia. Queria agradecer. E, no fundo, esperava que ele pudesse me ajudar a encontrar o tal Aidan Belmont, o nome que minha mãe me deixou como última esperança.

— Como assim ele não existe? — Questionei, sentindo a indignação subir ao encarar o policial da recepção.

Ele se manteve impassível, o tom seco e direto.

— Não temos nenhum investigador ou policial com essas características ou nome, senhora. — Repetiu. — Provavelmente confundiu com alguém. Ou foi enganada.

— Não, eu não confundi. — Respondi de imediato. — Ele sabia do chamado na minha casa.

— Não houve registro de nenhum agente novo naquela ocorrência. — Ele respondeu com frieza, já perdendo a paciência. — Se alguém apareceu lá, não era um dos nossos.

— Você tem certeza absoluta? — Gaguejei.

— Sim, senhora, não temos investigadores na delegacia. Somos uma cidade pequena. — O policial concluiu, pegando o telefone que tocava insistentemente, deixando a conversa de lado.

— Então, quem era aquele homem que me deu carona? — A pergunta saiu quase como um sussurro.

Cheguei em casa ainda tentando entender tudo o que tinha acontecido. Assim que desci do carro, parei bruscamente.

Ele estava ali.

Em pé, apoiado na estrutura de madeira da varanda, o corpo relaxado, mas com uma presença impossível de ignorar. As mãos acima da cabeça seguravam a madeira, os braços tensionados deixavam os músculos ainda mais definidos. O tronco inclinado para frente, como se estudasse o ambiente... ou me esperasse.

Alto. Forte. O corpo parecia moldado na medida certa entre força e controle. A postura era bruta, o porte físico marcante, como o de alguém treinado para a guerra. Mas o que mais me prendeu foram os olhos.

A cabeça dele se ergueu lentamente até cruzar o olhar com o meu. As íris cintilavam em tons dourados intensos, com nuances amareladas que pareciam mudar sob a luz. Um arrepio percorreu minha espinha. Aquilo não era normal. Nem um pouco.

— Você demorou para voltar. — Ele disse, com a voz baixa, grave, firme. Não era uma pergunta. Era uma constatação.

Engoli em seco, meu coração acelerando de novo.

— Quem realmente é você?

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