Capítulo 2

Com toda sua honestidade, Yara não sabia de onde arranjou coragem o suficiente para sugerir uma coisa daquele tipo. Estava nervosa, precisava avisar a Angela que precisaria dela como uma assistente de novo, óbvio, se ela ainda quisesse. Quando voltou para o carro, estava prestes a ligar o motor e voltar para casa e arrumar suas coisas, quando recebeu um telefonema de Oliver. 

“Yara…onde você está agora?

Na frente do cartório, prestes a ir para casa. Yara respondeu casualmente, escondendo suas emoções. 

“Emily se machucou, poderia por favor vir aqui e nos ajudar? Ela não quer ir ao hospital”. — Ela com certeza tinha palavras para soltar no momento, mas esperou mais um pouco. Queria ver cada reação de Oliver. — “Meu amor, eu preciso de você nesse momento. Se o produtor do evento de amanhã descobrir que ela se machucou na véspera, ela não poderá participar. Venha o mais rápido possível!”.

Se sentiu enojada, ao ouvir o falso sentimento em sua fala. Segurou a risada anasalada e desligou o telefone, soprando apenas um “Tudo bem”. Ainda não estava crendo que Oliver usou seus sentimentos por todos esses anos, mas ela já não tinha como voltar atrás, então apenas seguiu em frente. E muito em frente. Pensou, lembrando-se com quem tinha se casado. 

Quando estacionou o carro, ficou alguns minutos ainda dentro dele sem a mínima vontade de sair, mas precisa atuar muito bem, até conseguir sua posição novamente na indústria de entretenimento. Seus olhos voaram para seu celular, Angela estava no hospital já que havia acabado o horário de almoço e de descanso. 

Apertou o aparelho em suas mãos e resolveu ligar assim mesmo, odiaria que ela soubesse de tudo por outra pessoa. Angela era a única pessoa que realmente esteve com ela em todos os momentos, e agradecia por ter feito uma amiga como ela. 

“Yara? Posso ajudar em algo?” — A voz soou preocupada e o som de fundo era como algo soprando, e ali Yara soube que ela não estava atrapalhando o trabalho dela.

—  É incrível como você sempre sabe o que falar, sabia? — Riu suavemente, apoiando a cabeça no volante. 

“Acha que fui sua assistente atoa?” — A voz incrédula da ex-assistente a deixou mais aliviada em saber que mesmo que os anos passem, Angela continuaria ao seu lado. 

— Angela, se eu… — Suspirou, levantando a cabeça e fitando a empresa daquele que um dia amou. — Começar minha carreira de modelo de novo, você ainda quer ser minha assistente?

A mulher ficou sem reação do outro lado, deixando Yara um pouco triste. Talvez tenha ido longe demais. Era muito pedir para ela largar a vida dela novamente e a seguir na vingança. Angela no início era apenas uma assistente, até que Yara resolveu abandonar sua carreira de modelo e entrou no curso de enfermagem. 

Angela sempre teve uma admiração muito grande pela top model, e a seguiu de perto. Depois da ajuda que Yara deu à sua família, o único jeito de mostrar sua gratidão, foi a apoiando em sua vida. Angela também se formou em técnica de enfermagem, e começou uma nova vida junto a Yara.

— Me desculpe! — Pediu, se sentindo uma idiota por querer que Angela viva por si, e não por ela. — Tenha um bom trabalho. 

“Eu aceito trabalhar mais uma vez ao seu lado, Srta Sanchez”. —  A voz soou emocionada, deixando Yara de olhos arregalados. — “Será sempre uma honra trabalhar ao seu lado”.

— Certo, eu agradeço. — Yara desligou o celular alegre, mas o sentimento passou assim que saiu do carro e entrou na empresa. Apoiou a cabeça no espelho do elevador e fechou os olhos, com os braços cruzados. 

Estava entrando em uma nova vida, onde não seria mais estúpida e ninguém iria conseguir a usar mais. Além de que, agora havia um marido ao seu lado. Quando a porta do elevador se abriu, Yara se deu de cara com Oliver de costas para ela, falando algo com sua secretária. 

— Querido. — As palavras pareciam sair errado de sua boca, e ela se condenou mentalmente por aquilo. — Estava com saudades.

Aquilo era uma mentira, mas ela precisava fingir, mesmo que se sentisse mal falando aquilo. Se ela não agisse no modo de sempre, ele ia desconfiar muito rápido, e ela queria o fazer sofrer o máximo que puder. 

Quando viu que Oliver iria dar um abraço forçado nela, o rosto de seu mais novo marido veio em sua mente, a fazendo se esquivar de forma sutil. Prometeu que não iria se aproximar intimamente de nenhum homem, e ela cumpriria. Afinal, já sabia o sentimento de ser traída.

— Sai agora do hospital, não me abrace. — Murmurou, passando por ele e seguindo em direção ao escritório dele, já sabendo que a modelo estaria lá. Sabia que Oliver a estava olhando com o cenho franzido no momento, e apenas fingiu não se importar.

— Ai, não me toque! — O grito estridente e enojado soou, fazendo Yara revirar os olhos.  Sentada na poltrona do presidente da empresa, estava a loira, que tinha acabado de estapear a mão da faxineira, que estava analisando o ferimento da modelo. — Não quero pegar nenhuma doença sua!

A mulher de cabelos pretos cerrou as mãos em punho, vendo aquela cena em sua frente e nenhum superior da loira abrir a boca para defender a faxineira. Yara caminhou a passos pesados até a mais nova, não se importando em quebrar aquele piso de porcelanato com seu salto. Ela estava irritada, e não deixaria aquilo passar abatido. 

Agarrou o pé da modelo rudemente, quando se curvou, fazendo ela tomar o susto com sua ação. Com um sorriso falso no rosto, Yara se virou para fitar os olhos verdes da amante de seu ex-noivo. A mesma a encarava com confusão e pôde perceber o brilho de raiva irradiar das esmeraldas.  

— Tão bonita, Srta Lewis. — Viu todos, e até a própria modelo ofegar diante daquele elogio repentino. O sorriso de Yara morreu rapidamente, dando lugar a uma linha reta e olhos nebulosos. — Pena que seu caráter faz todos esquecerem disso. 

— O que? — A indagação de Emily não passou de um sopro, e logo seus olhos se voltaram para seu amante, que estava de olhos arregalados ouvindo a interação das duas. — Senhor Davis, vai deixar ela me tratar tão mal assim?

E lá estava a Emily vitimista. Yara largou o pé da mesma com certo nojo, antes de levantar e estender a mão para a faxineira, que a fitou com receio. Não a julgava, no meio de tantas cobras, aceitar algo tão natural era realmente preocupante. 

— Yara! Olha como fala com nossa modelo. — Oliver deu um passo à frente, cruzando os braços. — Sabe que ela é quem vai sustentar nossa empresa, trate-a como uma rainha. 

Rainha? Está tentando me humilhar, seu verme?

Yara o encarou por cima do ombro com os olhos estreitos, o fazendo tombar a cabeça para o lado, analisando-a com cautela. Ela estava diferente, e isso o deixou com uma pulga atrás da orelha. 

— E porque você não defendeu sua faxineira do mesmo jeito? — Se virou para o encarar com o queixo erguido. — Se não fosse por ela, essa empresa estava um lixão, de tão porca que a senhorita Lewis anda sendo nos últimos dias. 

Todos ficaram de boca aberta com o que tinham escutado. A faxineira encolheu os ombros, antes de agradecer em um sussurro a ex-top model. Sabia que ela estava se colocando em problemas apenas para a passar por cima daquela humilhação que sofreu, e não sabia como agradecer. 

Observando a silhueta da mulher, ela notou a postura determinada e poderosa de Yara de lado. Era uma bela mulher, que não precisava humilhar pessoas por seu trabalho ou seu  poder aquisitivo. Admiração, era isso que reluzia no olhar da senhora que agora observava tudo com cautela. 

— Yara, eu não sei o que aconteceu, mas você está arisca demais hoje. — Oliver descruzou os braços e andou até a noiva, apertando levemente os ombros dela com a mão. — Sei que está chateada por não podermos nos casar hoje, mas não jogue sua frustração em cima de Emily, ela está dando seu melhor pela empresa. 

Segura a boca, Yara!

— Então, diga para a sua modelo, não jogar as frustrações em cima da faxineira que veio apenas a ajudar. — Tirou as mãos dele de seu ombro, se sentindo desconfortável com seu toque. 

O homem suspirou e com as mãos mandou que todos saíssem, deixando apenas Yara, a faxineira, a modelo e ele dentro de seu escritório. Ele indicou com a cabeça para que a noiva começasse seu trabalho em cuidar de Emily e ela respirou fundo antes de ajoelhar e agradecer a faxineira por ter adiantado o trabalho de pegar a caixa de primeiros socorros.

— Perguntas para eu poder começar o tratamento. — A voz soou com puro desgosto. — Como se machucou?

— Realmente precisa disso? — A loira revirou os olhos, cruzando os braços e balançando o pé no rosto da morena. — Não é uma enfermeira? Pensei que era competente o suficiente para tratar qualquer ferida. 

— Certo, então a senhorita vai gostar quando eu deixar um pedaço de caco de vidro dentro do seu pé, né? — Levantou os olhos para a loira, com um sorriso zombeteiro serpenteando seus lábios. — Tenho certeza que quando cicatrizar, a senhorita não vai gostar da dor, mas se é assim que vai ser… 

— Deixei um copo de vidro cair no chão e fui tentar eu mesma limpar.— Respondeu urgentemente, temendo o que poderia acontecer consigo, caso não dissesse o que aconteceu. — Acabei pisando no caco de vidro e quando puxei rasgou um pouco mais e começou a sangrar. 

— Certo. 

Concentrada no que estava fazendo, Yara só ignorou todas as humilhações que Emily fazia a sofrer, mas não deixou barato quando mais uma vez, ela falou sobre o que a faxineira ainda estava fazendo ali.

— O que essa faxineira faz aqui ainda? — A loira olhou pra faxineira com um olhar de nojo. — Não quero respirar o mesmo ar que ela!

Yara notou pelo canto dos olhos a faxineira se retirando com os ombros encolhidos e a cabeça baixa, e antes que ela saísse da porta, fingiu fazer um movimento errado e tocou na ferida de Emily, a fazendo sentir dor e arfar. Um sorriso surgiu nos lábios da faxineira, que agradeceu mais uma vez  com o bater de boca, vendo as lágrimas surgirem nos olhos de Emily. 

— Desculpe. — Deu de ombros, como se não se importasse com a dor dela. — A senhorita está falando demais e está me atrapalhando. Pare de criancice  e se comporte, ou prometo que não vai ser um acidente da próxima vez. 

*

Dentro do hospital, Angela arrumava suas coisas com um grande sorriso no rosto. Saber que Yara voltaria para a carreira de modelo a deixou empolgada. Correu para a diretoria do hospital e esfregou as mãos. Iria agradecer por todo esse tempo que trabalhou, mas que voltaria para seu antigo emprego. 

Assim que sua entrada foi permitida, entrou com cautela, se sentindo nervosa por tudo ter acontecido de forma tão repentina. Ela acreditava em Yara, então com aquele pensamento, se acalmou. Sua chefe nunca faria nada para prejudicar os outros. Não os inocentes.

Completou mentalmente, deixando um sorriso maldoso escapar de seus lábios, mas logo se recompôs, lembrando-se de onde estava. Ela poderia entrar em apuros se alguém visse aquele sorriso de forma inapropriada. 

— Srta Weber? — O senhor sentado atrás da mesa de madeira escura a fitou por cima dos óculos. Em sua mão havia um documento, o qual Angela presumiu ser  as pesquisas do hospital das últimas semanas. — No que posso lhe ajudar?

— Eu venho agradecer ao senhor por tudo. — Fez uma breve reverência, em sinal de respeito por ele, que a fitou com o cenho franzido. — Aprendi muito nesses últimos anos, mas eu vim avisar que irei voltar para meu antigo trabalho. Obrigada por todos os ensinamentos!

— Eu nem sei o que dizer…do nada? — O senhor se levantou, retirando os óculos. — Aconteceu algo dentro do hospital, Srta Weber? Se sim, me fale, por favor!

— Devo avisá-lo de que a Srta Sanchez também vai sair? — Angela riu sem graça, vendo o homem arregalar os olhos e abrir a boca assustado. — Aconteceram algumas coisas nas nossas vidas, e a enfermagem consome muito nosso tempo, se o senhor entende…

— Eu entendo. — Sorriu amargo. — Também sei que essa não era a profissão de vocês e mesmo assim, o trabalho de vocês era perfeito!

— Nós ficamos felizes por dar nosso melhor neste hospital. — Sorriu com os olhos fechados. — Irei passar na administração. 

— Sem pressa. — O homem sorriu triste, vendo a mesma dar as costas. Sentia pena das duas mulheres, pois sabia o quão difícil seria o caminho de Yara para voltar ao topo, e tinha certeza que Angela seria sua assistente novamente. — Boa sorte…

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