Úrsula adentrava o clube como uma tempestade silenciosa. O salto fino tocava o mármore com precisão, o vestido preto justo como uma segunda pele, a fenda discreta revelando a curva da coxa. Ela desfilava pelo salão com a calma de quem sabia que estava sendo observada; e ela sabia. Os olhos dos homens percorriam seu corpo, as mulheres a fitavam com um misto de desdém e inveja. Úrsula gostava dessa energia.
A música eletrônica preenchia o ambiente, as luzes pulsavam no ritmo, e ela se deixou levar, os quadris marcando o compasso enquanto as mãos se moviam soltas pelo corpo, como se fosse dona de si, como se fosse feita para dançar. Um sorriso discreto pairava em seus lábios pintados de vermelho, os olhos negros faiscavam sob a luz. Ela não se preocupava em escolher, apenas esperava o jogo acontecer. Nenhum homem com aliança havia se aproximado. Ainda. Foi então que sentiu o olhar dele. Um toque sutil, como se a encarasse sem medo, sem pudor. Ele tinha no máximo 30 anos, alto, pele morena de tom quente, barba rente e bem-feita, cabelo castanho escuro ligeiramente bagunçado, como se tivesse passado os dedos por ele momentos antes. A camisa branca estava dobrada até os cotovelos, justa no peito largo, as calças de alfaiataria bem cortadas. No pulso, um relógio de luxo, e na mão... Nada. Nenhuma aliança. Mas havia algo. Um detalhe sutil: a marca fina, quase imperceptível, de onde um anel costumava estar. A pele um pouco mais clara na base do dedo anelar. Úrsula sorriu, e o sorriso era felino, carregado de intenção. Ele se aproximou, a voz baixa e confiante: — Você dança como quem sabe exatamente o que está fazendo. Ela deu uma risada suave, como se não se importasse com o elogio, mas gostasse dele. — E você olha como quem sabe exatamente o que quer. Os olhos dele brilharam, um canto da boca se ergueu em um sorriso enviesado, e os dois se aproximaram, o calor entre os corpos crescendo. Úrsula deslizou uma mão pelo braço dele, a ponta dos dedos roçando a pele exposta. Ele a segurou pela cintura, firme, mas sem pressa. — A noite é longa, mas às vezes ela passa rápido demais para certos jogos. — Nem todos os jogos precisam durar a noite toda, às vezes um final rápido é suficiente — ela respondeu, com um brilho provocante nos olhos. Ele inclinou a cabeça, a respiração quente perto do ouvido dela. — Um lugar mais reservado, então? Ela mordeu o lábio inferior, fingindo hesitar, mas o olhar era puro convite. — Eu conheço um lugar perfeito. --- O quarto era um santuário de excessos: paredes de veludo carmesim, luzes baixas filtrando tons dourados sobre lençóis de seda negra. No centro, uma cama larga como um convite, com a cabeceira acolchoada e espelhos estrategicamente posicionados, refletindo ângulos que aguçavam a imaginação. Úrsula entrou primeiro, seus saltos marcando um compasso firme no chão. Parou diante da cama, deslizando os dedos pelas hastes do cabelo, os olhos negros faiscando como se carregassem um segredo antigo. Ele veio logo atrás, sem tirar os olhos dela, como um animal hipnotizado pelo faro de caça. Ela tirou o sobretudo de pele com um movimento estudado, os ombros nus iluminados pelas lâmpadas âmbar. O vestido escorregou pelo corpo como se o próprio tecido soubesse que não era digno de permanecer ali. Sob a luz suave, sua pele parecia dourada, um campo de calor a ser explorado. Ele se aproximou devagar, o paletó caindo com descuido, os dedos desabotoando a camisa como quem desembrulha um presente caro. Os olhos de Úrsula acompanharam o movimento, e quando as mãos dele tocaram sua cintura, ela estremeceu, sentindo o calor pulsar sob a pele. Os toques eram uma coreografia silenciosa: dedos que deslizavam pela curva da cintura, que encontravam o caminho pelas costas nuas, que traçavam rotas invisíveis na pele macia. Ela o recebeu como uma onda recebe o vento: de olhos fechados, cabeça tombada para trás, a respiração entrecortada, os lábios entreabertos. A roupa dele foi desaparecendo aos poucos, como um ritual de desarmar armaduras. As mãos de Úrsula o percorriam como quem decifra um mapa antigo, sentindo a firmeza dos músculos, o calor do peito, a pulsação no pescoço. Quando ele se inclinou para beijá-la, os lábios se tocaram como faíscas acendendo um incêndio; um roçar suave, depois um puxar mais firme, a língua dançando com a dela em um compasso íntimo e inescapável. A cama os recebeu sem pressa, como se o mundo inteiro tivesse desacelerado. Os lençóis deslizaram sob seus corpos, enquanto os toques se aprofundavam, exploravam, marcavam territórios invisíveis. O cheiro dele, um misto de colônia amadeirada e desejo cru, misturou-se ao aroma do ambiente, saturando o ar. Ela o puxava para perto, os dedos cravados em seus ombros, e o tempo parecia se esticar em suspiros e beijos longos demais para caber em qualquer relógio. O ritmo era uma dança: ora suave, ora urgente, como uma música que se intensifica, que explode em notas altas e depois retorna ao sussurro, à respiração compartilhada no escuro. Os espelhos refletiam fragmentos: mãos entrelaçadas, bocas famintas, olhos fechados em deleite, a curva das costas dela arqueando para receber o calor dele. O tempo não importava. Só o agora, só os corpos entrelaçados, só a certeza de que, por aquela noite, eram apenas dois desconhecidos se devorando em silêncio, sem perguntas, sem promessas. E quando o último fôlego foi dado, quando os corpos cederam ao cansaço e ao calor compartilhado, Úrsula permaneceu ali, deitada, com um sorriso satisfeito no canto dos lábios pintados de vermelho. --- Ela acordou com a luz suave filtrada pelas cortinas pesadas do quarto. A seda dos lençóis ainda carregava o calor da noite anterior, mas a cama ao lado estava fria. O silêncio era cortante; a ausência dele era um eco nos cantos do quarto luxuoso. Ela se sentou devagar, o corpo ainda pesado, a pele marcada pelas horas anteriores, os cabelos bagunçados como se carregassem os segredos da madrugada. Sobre o criado-mudo, um bilhete dobrado, escrito à mão. "A conta já está paga. Desculpe pelo que aconteceu. Amo minha esposa. Isso não vai se repetir." Úrsula ficou imóvel, os dedos apertando o papel até ele quase rasgar. A caligrafia era firme, sem hesitação. As palavras, um soco no estômago. Ao lado do bilhete, um maço de notas, dobradas com descuido, como gorjeta jogada para uma funcionária qualquer. A respiração dela ficou pesada, o sangue queimando sob a pele. Ela não era uma prostituta. Nunca foi. Jogava o jogo do desejo, da conquista, da sedução, mas nunca cobrava. Não era sobre o dinheiro, era sobre o poder, sobre o controle. Aquilo a enojava: o bilhete, as desculpas vazias, o dinheiro como pagamento. O rosto dele voltou à mente como uma cicatriz fresca: o olhar escuro e denso, o sorriso enviesado, a barba rente, os dedos fortes em sua cintura. Úrsula se levantou, nua, o maço de dinheiro em mãos, os olhos faiscando raiva. — Covarde… — sussurrou, os lábios vermelhos crispados. Vestiu-se devagar, com movimentos precisos, como quem se arma para a guerra. Olhou-se no espelho: os olhos negros como poço sem fundo, a pele dourada sob o vestido preto, os saltos altos tornando-a mais letal. Ele podia ter fugido sem deixar um nome, mas não sem deixar vestígios. A sombra da aliança, o cheiro, o olhar, a voz. Aquela cidade podia ser grande, mas não era infinita. E ela era paciente. Ele não sabia, mas tinha acabado de entrar para o jogo de Úrsula. E Úrsula não perdoava.