Mundo de ficçãoIniciar sessãoNina Russo sabia que estava sendo vendida.
Não com essas palavras, é claro. Seu pai tinha orgulho demais para admitir que estava negociando a filha como se fosse gado no mercado. Em vez disso, ele chamava de "oportunidade". De "salvação para a família". De "seu dever como filha".
Mas Nina não era idiota. Aos 28 anos, ela havia passado tempo demais observando o mundo sórdido da máfia para não reconhecer uma transação quando via uma.
E ela era a mercadoria.
— Você vai usar o vestido azul — disse sua mãe, Caterina, entrando no quarto sem bater. Ela carregava um vestido de seda azul-marinho nos braços, o tipo de roupa cara que a família não tinha condições de comprar há pelo menos dois anos. — Aquele que realça seus olhos.
Nina olhou para o vestido e depois para a mãe. — Quando você comprou isso?
— Não comprei. — Caterina evitou o olhar da filha, ocupando-se em alisar rugas inexistentes no tecido. — Foi um presente.
— Dele?
O silêncio foi resposta suficiente.
Nina sentiu o estômago revirar. Matteo Salvatore já estava escolhendo suas roupas antes mesmo de se encontrarem oficialmente. Como se ela já lhe pertencesse.
Talvez já pertencesse.
— Mamãe... — Nina começou, mas a voz falhou. O que ela ia dizer? Que não queria fazer isso? Que aos 28 anos merecia escolher o próprio destino? Que a ideia de se casar com um homem que ela nunca tinha visto, um monstro sobre quem se sussurrava em toda Nova York, a enchia de pavor?
— Não comece, Nina. — A voz de Caterina saiu firme, mas havia algo quebrado em seus olhos. — Seu pai já decidiu.
— Pai decidiu ou foi forçado a decidir? — Nina se levantou da cama, cruzando os braços. — Quanto ele deve, mamãe? Quanto ele perdeu dessa vez?
Caterina estremeceu como se tivesse levado um tapa.
— Isso não é da sua conta.
— Não é da minha conta? — Nina soltou uma risada amarga. — Eu sou a moeda de troca e não é da minha conta?
— Abaixe a voz! — Caterina olhou nervosamente para a porta, como se temesse que alguém ouvisse. Provavelmente temia. As paredes daquela casa eram finas, e seu pai estava em algum lugar lá embaixo, provavelmente afogando a culpa em uísque barato. — Você não entende a situação em que estamos.
— Então me explica. — Nina deu um passo à frente, segurando os ombros da mãe. — Me explica por que eu tenho que me casar com um homem que nunca vi. Me explica por que esse é o único jeito.
Caterina fechou os olhos, e quando os abriu novamente, estavam úmidos.
— Seu pai deve três milhões de dólares.
O ar saiu dos pulmões de Nina de uma vez.
— Três... como?
— Jogos. Negócios ruins. Empréstimos com juros que ele não conseguia pagar. — A voz de Caterina tremeu. — Ele foi a Salvatore. Implorou por mais tempo. E Salvatore... ele ofereceu uma solução.
Você, Nina pensou amargamente. A solução sou eu.
— Matteo Salvatore precisa de uma esposa — Caterina continuou, as palavras saindo em um jorro desesperado. — Ele tem 39 anos, nenhum herdeiro, e a famiglia dele está pressionando. Ele escolheu você.
— Por que eu? — Nina sussurrou. — Existem centenas de mulheres mais jovens, mais bonitas...
— Você tem 28 anos. — Caterina disse simplesmente, e Nina entendeu.
Ela era velha demais para ser uma noiva desejável no mundo da máfia. Jovens de 18, 20 anos eram as preferidas — frescas, facilmente moldáveis, com anos de fertilidade à frente. Aos 28, Nina era considerada quase acabada.
O que significava que ela era perfeita para um homem que ninguém mais queria.
— Ele é... — Nina engoliu em seco. — Os rumores são verdade? Sobre o rosto dele?
Caterina desviou o olhar.
— Dizem que ele usa máscaras. Que metade do rosto foi queimado em um incêndio. — Ela hesitou. — Mas ele é poderoso, Nina. Rico. Ele vai cuidar de você.
Cuidar. Que palavra gentil para descrever uma prisão dourada.
— E se eu recusar?
A pergunta pairou no ar como fumaça tóxica.
— Então seu pai morre. — Caterina disse sem rodeios. — E provavelmente eu também. E você... bem, eles têm maneiras de fazer mulheres cooperarem. Maneiras muito piores do que um casamento.
Nina sentiu o sangue gelar. Ela conhecia as histórias. Mulheres que desapareciam, que eram encontradas em becos, que eram vendidas para bordéis em outros países. A máfia não tolerava desobediência, especialmente quando dinheiro estava envolvido.
— Quando? — Nina ouviu a própria voz, distante, resignada.
— O jantar é hoje à noite. Às oito. — Caterina estendeu o vestido azul. — Ele quer conhecer você antes de... antes do casamento.
— E quando seria o casamento?
— Logo.
Ela pegou o vestido das mãos da mãe, sentindo o peso da seda fina.
— Nina... — Caterina tocou o rosto da filha com mãos trêmulas. — Eu sinto muito. Se houvesse qualquer outro jeito...
— Mas não há. — Nina completou, afastando-se do toque. Ela não queria compaixão agora. Compaixão só tornaria tudo mais difícil. — Pode sair, mamãe. Eu preciso me arrumar.
Caterina hesitou, parecendo querer dizer algo mais, mas acabou apenas assentindo e saindo do quarto em silêncio.
Nina ficou sozinha com o vestido azul e o peso do próprio destino.
Ela caminhou até o espelho antigo no canto do quarto, observando o próprio reflexo. Cabelos castanhos ondulados caindo pelos ombros, olhos cor de âmbar que sua avó costumava dizer que eram sua melhor característica, rosto comum mas agradável. Não era feia, mas também não era uma beleza de parar o trânsito.
Era apenas... Nina. Uma mulher comum em uma situação extraordinariamente cruel.
— Você consegue fazer isso — ela sussurrou para o reflexo. — Você não tem escolha.
Mas quando começou a se vestir para o jantar que mudaria sua vida para sempre, Nina Russo se permitiu chorar. Apenas por alguns minutos. Apenas até que não houvesse mais lágrimas.
Porque a partir daquela noite, ela precisaria ser forte.
A partir daquela noite, ela seria propriedade de Matteo Salvatore.
E monstros não tinham piedade de lágrimas.







