A BABÁ E O VIÚVO RECLUSO
A BABÁ E O VIÚVO RECLUSO
Por: Tônia Fernandes
####PRÓLOGO

A DESPEDIDA

O celular vibrou na bancada de mármore branco enquanto Ellen ajeitava a alça do vestido e conferia o reflexo no espelho do closet. Ela ainda se encantava com os cabelos caindo sobre os ombros, o rosto levemente corado e os olhos brilhando de felicidade.

— Oi, Halley, — atendeu sorrindo. — Eu ia te ligar irmã, como sempre, nosso time de gêmeas funcionando, adivinha...Tenho uma novidade pra te contar, estou tão feliz!

— Ah, é? Então vamos almoçar juntas hoje, e você aproveita para me contar com detalhes, essa novidade que te trás felicidade? — Que tal aquele restaurante onde a gente sempre ia quando estava na faculdade?

— Nossa, quanto tempo que não vamos lá não é? Me dá uns 40 minutinhos? A Sophie acabou de dormir, vou deixar tudo organizado com a governanta e vou te encontrar.

— Te espero, irmã, não me faça comer sozinha, viu? — disse Halley, com uma risada doce demais.

Ellen desligou o celular com um sorriso bobo nos lábios. Respirou fundo e acariciou a barriga quase imperceptível. Ainda não havia contado a ninguém, Halley, seria a primeira a saber sua descoberta, e Léo quando chegar, vai ter uma surpresa. Na verdade, nem fez o teste de sangue, fez o de farmácia.

“Leonard vai surtar de felicidade...”, pensou, saindo do quarto em passos leves. Sophie estava dormindo, só iria a governanta para ficar de olho nela.

— Doris, vou sair para almoçar com minha irmã, Halley, você pode ficar de olho na Sophie ? Ficarei no máximo duas horas fora, ela vai dormir até às 14horas , esse horário já estarei em casa.

— Tudo bem, senhora, pode deixar que cuidamos da pequena.

Ellen pegou a bolsa, desceu a escada com a graciosidade de quem vive um conto de fadas e entrou no carro estacionado na garagem. Ela mesmo gostava de dirigir. Dizia que era sua válvula de escape, mesmo que Leonard preferisse que ela andasse com segurança reforçada.

Já Halley estava parada no restaurante, olhando impaciente para o relógio. Os minutos corriam lentos. Ela cruzou as pernas, pediu uma taça de vinho e discou um número salvo como “G”.

Mal Halley desligou o celular, o sorriso em seu rosto perdeu a doçura que mantinha durante a conversa com a irmã.

Com os dedos ágeis, ela acessou rapidamente a agenda de contatos e ligou para um número que nunca deveria constar em seu telefone, mas que, nos últimos dias, vinha sendo discado com frequência perigosa.

— Greg? — disse em voz baixa, olhando ao redor para se certificar de que ninguém do restaurante a escutava.

— Fala, o que foi agora?— respondeu ele, seco.

— Fez o que eu pedi?

— Tudo feito, soltei o carro com os freios ajustados como combinamos, ela não vai chegar até o restaurante .

O coração de Halley acelerou, havia ensaiado aquele momento tantas vezes na cabeça que agora tudo parecia mecânico.

— Tem certeza de que ninguém vai desconfiar?

— Ela vai estar sozinha, e quando o laudo sair, vai ser dado como falha mecânica. Ninguém vai investigar freio de carro de madame que saiu apressada, confia em mim, nunca falhei com você.

Halley sorriu, um sorriso discreto, mas que acendia em seus olhos um brilho frio e calculista. Ela respirou fundo, ajeitou os cabelos e respondeu com naturalidade:

— Perfeito, me avisa se tiver qualquer novidade. Agora, deixe comigo, o show vai começar.

Ela encerrou a ligação e pousou o celular sobre a mesa, ao lado da taça de suco de frutas vermelhas. Olhou para o relógio, faltava cinco minutos para o meio-dia.

Exatamente na hora combinada, ela pegou o telefone novamente e ligou para Ellen, pronta para interpretar seu papel na tragédia que ela mesma havia arquitetado.

— Você vai demorar para chegar Ellen, estou faminta?

— Estou no cruzamento da Avenida Imperial, fica tranquila, estou bem perto, em dez minutos chego ai.

— Ok.. vou pedir o almoço, o de sempre para você? — A voz de Halley se calou subitamente ao ouvir do outro lado um estrondo seco, metal contra metal, o som inconfundível de vidro estilhaçado... e um grito abafado:

— Halley... Ai, meu Deus...

E o silêncio.

Halley afastou o telefone do ouvido devagar, com os olhos arregalados. Olhou ao redor, como se estivesse sendo observada, e levou a mão à boca, fingindo espanto, e chamou o garçom.

— Por favor, um copo d’água, acho minha irmã... A algo aconteceu com ela.

O celular vibrou outra vez, um número desconhecido.

— Senhorita Halley? A senhora é irmã de Ellen Salazar?

— Sim, quem fala por favor, algum problema?

— Lamentamos informar, mas sua irmã sofreu um acidente de carro . Ela não resistiu aos ferimentos.

Halley se levantou bruscamente.

— O quê? Não! Ela estava vindo me encontrar... meu Deus, ela tem uma bebê... O marido dela está viajando, o que vai acontecer agora?

— Precisamos que algum familiar vá até o Instituto Médico Legal para o reconhecimento. A senhora é a parente mais próxima?

— Sou, mas ela é casada, preciso avisar ao esposo dela, o Leonard... ele precisa saber, meu Deus, ele está viajando, como ele vai reagir?

Ela se afastou alguns passos, fingindo lágrimas, e em seguida discou para o cunhado.

— Léo... sou eu, Halley, aconteceu um acidente com Ellen, preciso que você volte para casa agora, é uma tragédia.

— O que houve?

— A Ellen, ela sofreu um acidente, a caminho do restaurante, marcamos um almoço, eu estou no restaurante, e alguém me ligou. Ela... se foi, Léo.

— O quê?! Não, pode ser, meu amor não pode ter partido, isso é um pesadelo... gritou Leonard do outro lado chorando.

— Volta para casa, a Sophie precisa de você, eu... estou indo ao IML agora.

Enquanto desligava, Halley caminhava com a expressão mais convincente que conseguia simular. Por dentro, no entanto, seu coração batia acelerado por outro motivo: o jogo tinha começado, e ela pretendia vencer.

NO IML

O ambiente era frio. O cheiro de desinfetante, misturado com algo metálico e indefinido, enchia o ar. Halley apertava os braços contra o corpo, tremendo levemente — uma mistura cuidadosamente encenada de choque e dor.

— Senhora Halley Silver? — chamou o funcionário, aproximando-se com uma prancheta nas mãos. — A senhora é irmã de Ellen Silver Salazar?

Ela assentiu com um nó na garganta e lágrimas falsas brotando nos olhos.

— Sim… eu sou a irmã dela.

— Meus sentimentos, a senhora é, até o momento, o parente mais próximo que conseguimos localizar, o marido da senhora Ellen foi contactado?

— Eu avisei, ele está a caminho, estava viajando a negócios. — disse, afundando os dedos na bolsa como se tentasse conter o tremor. — Eles têm uma filha… a Sophie.

O funcionário respirou fundo, com um olhar que se endureceu pelo costume de presenciar cenas como aquela. Ele fez um gesto com a cabeça.

— Por aqui. Precisamos confirmar a identificação. É um procedimento padrão.

Halley seguiu os passos do homem com passos lentos. As paredes brancas, os corredores gelados, as portas de metal... Tudo parecia saído de um pesadelo. Quando pararam diante de uma cortina cinza, ele falou:

— Está preparada?

Ela respirou fundo. Apertou os olhos e forçou uma lágrima solitária a escorrer pela face.

— Sim.

A cortina foi puxada com lentidão, Halley não precisou fingir por muito tempo.

O choque de ver a irmã ali, imóvel, pálida, com o rosto parcialmente machucado pelo acidente, paralisou-a por um instante, aquela era Ellen, sua irmã e espelho, e também sua maior rival, que agora está aqui morta.

Nenhuma dor ou arrependimento da parte dela — nem remorso, mas um misto de inveja mal resolvida com a imagem perfeita da mulher que agora jazia inerte.

— É ela? — o funcionário perguntou.

Halley deu um passo à frente, segurando o choro que agora era um misto de encenação e emoção verdadeira.

— É…a minha irmã… — disse, a voz embargada. — Ela me ligou… minutos antes… disse que estava vindo me encontrar… Meu Deus… por quê?

O funcionário anotou algo, e com gentileza, fechou a cortina.

— Obrigado, pode aguardar na recepção? Vamos liberar o corpo assim que o marido dela chegar e autorizar os trâmites.

Halley assentiu, secando os olhos com um lenço que puxou da bolsa. Saiu do corredor e foi até o banheiro mais próximo, assim que entrou, trancou a porta da cabine, encostou-se na parede de azulejos frios… e respirou fundo.

Pegou o celular do bolso, desbloqueou rapidamente e ligou.

— Greg.

— E aí?

— Vi com meus próprios olhos, ela está morta, — disse em voz baixa, fria. — Bom trabalho, vou depositar o restante do dinheiro, como sempre competente.

— Eu te disse, os freios cortados, vai dar perda total, ninguém vai suspeitar de nada. Não é a primeira vez que você me contrata, nunca falhei.

Ela sorriu sozinha.

— O carro bateu bem perto do cruzamento, como eu queria. E o bebê não estava com ela, perfeito. Só falta agora o Leo voltar e o palco está montado.

— Você vai conseguir mesmo?

— Agora ela está fora do meu caminho, a Sophie é pequena demais. E Leo vai precisar de ajuda e apoio de uma pessoa confiável, e quem melhor do que a cunhada dedicada e amorosa?

— Você é má.

— Eu sou inteligente, esse lugar era para ser meu, e agora... é só questão de tempo, vou consolar o viúvo.

Ela desligou, ajeitou a maquiagem, olhou-se no espelho e murmurou com um meio sorriso:

— Hora de encorporando o papel da irmã inconsolável.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
capítulo anteriorcapítulo siguiente
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP