Paloma estava confusa. A história de César e Leliana soava estranha demais.— Entendo… — disse, pousando o copo sobre a mesa. — Mas ninguém comenta o fato de ela viver sob o mesmo teto que ele?— Ela não mora lá — corrigiu Nicácio. — Pelo menos, ainda não. Tem uma casa em Campina Grande, bem longe daqui.— Então ela e o marido moravam em outra cidade, mesmo com a fábrica funcionando aqui?— Muita gente também não entende isso. Mas há explicações plausíveis.— Como quais? — insistiu Paloma, curiosa.— Jonas viajava bastante, talvez não precisasse estar por aqui. E há quem diga que Leliana Monteiro se recusava a morar em Cabaceiras, por achar a cidade pequena demais. Confesso que consigo entender.Paloma permaneceu em silêncio, girando o copo entre os dedos. Tinha certeza de que havia outra razão — e havia mesmo.— Também comentam que Jonas simplesmente proibiu Leliana de se mudar para cá.— Por quê?— Porque ela e César já teriam tido um caso antes do casamento. Na verdade, todos esper

César estava ali, tirando um espeto da churrasqueira ao lado de outros homens. Paloma jurava que nunca tinha visto tanta carne junta na vida. Apesar de usar roupas simples; bermuda caqui e camisa polo; ele se destacava, a postura naturalmente imponente.Era impossível não se distrair, observando o vai e vem dos músculos dos braços dele enquanto trabalhava.— Não seja ridícula — ralhou consigo mesma, voltando a prestar atenção no ambiente.E onde estaria, afinal, a bela e elegante Leliana?— eja só… nosso grande líder mostrando mais um talento — comentou Nicacio, com ironia no olhar para César. — Será que existe alguma coisa que esse homem não saiba fazer?Paloma reprimiu um suspiro. Nicacio não precisava exagerar em tudo. A língua afiada dele já começava a cansá-la.César tinha sido generoso ao abrir a própria casa para aquela festa dos funcionários, mas ela não quis sair em defesa dele. Vai ver era mesmo ingenuidade sua não perceber que, no fundo, talvez aquilo fosse só uma forma de

Paloma sentiu o rosto queimar.Por que ele tinha que dizer exatamente as coisas que faziam sua pele arrepiar?E, pior ainda, por que o corpo dela reagia desse jeito justamente com ele, um homem que provavelmente estava se divertindo às custas dela?Não ia se enganar achando que era especial ou qualquer bobagem de conto de fadas. Já era adulta o suficiente para saber que não era nenhuma versão moderna da Cinderela. E, além de tudo, ele tinha Leliana.— Não acha que a Sra. Monteiro teria escutado se eu gritasse? — ela perguntou, tentando soar firme, embora a voz quase saísse trêmula. — Não imagino que você ia querer que ela nos visse.César arqueou uma sobrancelha, um sorriso cínico brincando no canto da boca.— Você teria gritado? Mesmo? — ele falou devagar, como se saboreasse a provocação. — Porque, sinceramente, um segundo antes, não me pareceu que ia ser esse o caso.— Oh, você é tão convencido! Quem você pensa que é na fila do pão? — disparou, mais para esconder o nervosismo do que

— Eu não estava com ele, eu só tinha acabado de…— Ah, não? — César interrompeu, a voz carregada de ironia. — Esperei junto ao seu carro por um bom tempo e, como você não aparecia, resolvi procurá-la. Acho que me viu, não? Ou talvez não tenha notado… estava tão entretida com a bebida na mão e aquela conversa animada, deixando que ele admirasse o seu vestidinho.— Não foi nada disso! — protestou Paloma, indignada.Não conseguia entender por que ele estava tão interessado em saber com quem ela conversava ou se alguém a paquerava. Ele mesmo tinha a ex-cunhada para aquecer a cama. Se fosse qualquer outro homem, poderia até pensar que era ciúme. Mas César? Não fazia sentido. Paloma sabia que, para ele, não passava de uma pedra o sapato.— E eu, preocupado, achando que tinha exagerado… pensando que você estava magoada. — Ele soltou um riso curto e sem humor. — Foi quando percebi que talvez você preferisse presentes em vez de desculpas. Afinal, dinheiro parece ser o que mais importa para voc

Nos dias que se seguiram, o pensamento em César insistia em rondá-la, como uma sombra incômoda que não se dissipava.E afinal, que diferença faria se ele e a ex-cunhada resolvessem ou não se casar?Isso não apagava o que ele já havia feito com ela: o pagamento suspeito entregue à tia Cida, o “acidente” que rasgou sua blusa, a prepotência com que a acusara de valorizar mais o dinheiro do que as desculpas. Sem contar aquela “advertência”, que na verdade soara como uma ordem, para que se mantivesse longe de Nicacio.— É o cúmulo… — murmurou, sentindo a raiva crescer.Mas então, um frio lhe percorreu o estômago. Talvez o mais provável fosse nunca mais ver César Monteiro.Na terça-feira, a imobiliária apareceu com um cliente para visitar o casebre.Paloma, no entanto, seguia imersa na tarefa de esvaziar o lugar das coisas de Charles.Separou uma pilha de livros e levou até um sebo. Eram títulos de todos os tipos: de estudos sobre indústrias a tratados de geologia, da história da escravidão