DE REPENTE, MERCENÁRIA

A noite a taberna se transformava no antro de diversão que ela sempre gostou e estava acostumada a lidar. Os aventureiros cansados que vinham de outras regiões, buscavam na cerveja, hidromel e nas canções do bardo ali presente, o merecido sossego e a alegria da jogatina. A nômade se sentia em casa, mas não deixou de sentir uma certa saudade da antiga caravana e dos rostos conhecidos dos vilarejos visitados. sentada em uma das mesas no meio da taverna, a chegada de um grupo barulhento chamou sua atenção. Dois homens de aparência peculiar, cabelos longos e ondulados amarrados para trás, usando um aro fino e dourado prendendo os cabelos. Eles eram altos e corados de sol, o corpo musculoso e definido, narizes aquilinos e rosto quadrado. Os olhos castanho-claros, brilhavam sob as grossas sobrancelhas. As roupas eram bem peculiares, diferentes de tudo que Azura já havia visto. Um único tecido de um azul vibrante e leve, dava a volta pelas pernas e na cintura e prendia-se ao ombro esquerdo, de forma singela e relaxada, decorado com um botão detalhado em forma de um ramo de trigo. Sua sandália tinha grossas grevas cobertas com tiras de couro cru e na sua cintura uma espada curta e reta, com o punho gasto pelo uso. Ele possuía um olhar mais altivo e imponente, como um nobre. Seu companheiro usava uma túnica que ia até a altura dos joelhos. Por cima uma loriga segmentada e um cinturão de couro com anéis de aço, às costas uma javelin de altíssima qualidade e um gladio embainhado preso a cintura. Seu olhar sério, prescrutou todo o salão da taverna, olhando com atenção todos os presentes, avaliando as possíveis ameaças. De braços dados com o nobre, uma mulher de longos cabelos castanhos, olhos e pele claríssima, afogueadas pela bebida, usando uma longa túnica adornada e vermelha berrante, dava risadas de forma escandalosa, tocando de forma intima os ombros do seu acompanhante.

Por um breve instante o olhar do guerreiro cruzou o de Azura e o mesmo não pode deixar de se surpreender com a beleza da cigana. Ela percebeu o olhar interessado e retribuiu com um sorriso discreto. Sua curiosidade foi despertada de imediato. De onde vieram? Quem eram eles?

Logo atras um grupo de bêbados entrou abruptamente, obrigando os peculiares recém chegados a saírem da porta e escolher um lugar para se sentarem. O que tinha a aparência de guerreiro foi até o balcão e pediu uma caneca de água fresca. Seu sotaque era diferente, meio arrastado e duro, mas dava pra entender bem o que ele falava. O taverneiro olhou com estranheza, mas atendeu ao pedido sem demora, a voz grave e autoritária do guerreiro impunha um respeito automático a quem ouvia. Azura acercou-se vagarosa e discretamente.

- Meio estranho parar em uma taverna e beber água, não?

O estranho olhou para ela curioso, avaliando se valia ou não a pena responder.

- De fato, prefiro permanecer sóbrio em terras estranhas.

- A verdade é que você também pode ser considerado um estranho. – Azura o olhou de alto abaixo, analisando todos os detalhes daquele estranho guerreiro. – Você tem que ficar de olho no seu mestre não?

O guerreiro riu alto e com gosto.

- Não estou de pajem senhorita...

Azura também riu graciosamente, admitindo sua errada conjectura. 

- Azura Zatter. – Ela estendeu a mão em cumprimento.

O guerreiro a tocou de modo suave, amenizando o contato de sua mão calejada de batalhas, com a mão macia e delicada da cigana.

- Eu sou Heitor de Tera – o toque dos lábios finos do guerreiro em sua mão, levantaram um arrepio, que percorreu toda o pescoço de Azura.

Apesar do contato delicado, ela sentiu a força e a imponência daquele homem misterioso.

- Venho de Hélade, de uma pequena ilha chamada Tera, próximo a Creta.

- Desconheço essas terras, mesmo eu que passei a vida toda viajando em caravana e conhecendo lugares diferentes a cada estação. E muito fico curiosa em saber como são essas terras. Vocês usam armaduras e roupas diferentes, parecem bem confortáveis devo dizer.

- São bem adequadas para batalha. Vocês, aqui nesse continente usam metal demais pelo corpo, e roupas demais também. Ir para a cama com uma dessas damas deve ser bem trabalhoso, considerando quanta roupa elas usam.

Heitor sorriu matreiramente. Azura se surpreendeu com a sua franqueza.

- Bom, digamos que temos técnicas pra retirar rapidamente as roupas, sem deixar o fogo do desejo se apagar.

Azura bebia sua cerveja devagar contrariando sua natureza. Se sentia atraída e queria enfiar a cara em um barril inteiro de cerveja, mas precisava ir com calma para não perder seu objetivo. Ela pode sentir os olhares da mulher que acompanhava o nobre, sobre ela. “Boa coisa não vai ser eu aposto.” Pensou ela.

- Quem é o seu amigo?

- Ele é um ilustre passageiro do meu navio Trógon*. Viemos de muito longe, investigando os boatos sobre alguns artefatos de interesse de nosso rei. Ele foi enviado como emissário para averiguar a veracidade dos boatos. Como bom aventureiro aceitei trazê-lo para esse lado dos mares, com interesse em conhecer essas terras e provar o valor dos guerreiros que aqui vivem.

- Parece um bem nobre objetivo. – Os olhos de Azura brilharam de curiosidade. – Então algum desses artefatos está por essas terras?

- Não me importo de falar porque não é uma missão secreta. Mas sim, parece que um dos artefatos está em uma caverna nas montanhas próximas, sob o domínio de criaturas grotescas conhecidas como globins.

- Acho que se refere aos GOBLINS do Monte Dorso. – Ela enfatizou o erro de pronúncia dele.

- Exatamente! – Heitor parecia surpreso e ignorou o fato de a cigana ter lhe corrigido. – Então você conhece o local.

Azura se fez de entendida.

- Mas é claro! Pode não parecer, mas também sou uma mercenária. Estou sabendo da matrona, a procriadora das criaturas. Se existe algum artefato valioso estará escondido no covil da criatura.

Heitor se mostrou ainda mais surpreso, mas estava visivelmente satisfeito com a reviravolta que os deuses botaram em sua jornada.

- Então parece que teremos uma agradável parceria, claro se você aceitar se juntar a nós.

Heitor exibiu seus dentes em um alvo sorriso.

- Claro que aceito! – exclamou a cigana.

Ela havia se desligado por um instante. Respondera sem pensar, atraída pelo aventureiro de terras distantes.

Quase não deu por si, quando seus lábios tocaram os de Heitor. E menos ainda enquanto subiam as escadas, apressados, como adolescentes que não conheciam o amor. Ela realmente mostrou a facilidade em retirar a sua complicada vestimenta, enquanto que para ele, foi mais fácil ainda se livrar da sua. Azura sentiu a força e o calor do corpo daquele soldado misterioso, capitão de navio vindo de uma terra desconhecida e o sabor que sua pele tinha em seus lábios era algo que ela nunca havia sentido.

Parecia que ela já havia embarcado no navio, navegando em mares suaves e profundos.

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