Azura sempre foi mimada pelo pai e sempre se envolveu em problemas que misturavam bebedeiras, roubo e trapaças nos jogos de azar, que sempre terminavam com sua caravana de ciganos saindo mais cedo de alguma cidade se desculpando e fugindo dos Sentinelas do Rei. A única solução vista pela família foi o banimento. Agora longe de casa com seu cavalo Salazar, a Cigana vai descobrir seus limites, buscando elevar seu nome junto aos grandes e um dia voltar para casa. Ela só não contava que se apaixonaria por um capitão grego e partiria em uma jornada além da sua imaginação, por um universo repleto de mitologia, rivalidades, traição e amores. Tudo isso enquanto luta pela sua vida e tenta salvar um mundo onde os deuses agem como humanos inconsequentes.
Leer másO povo nômade de Khan Shamur era considerado um povo livre e independente, mesmo devendo alguns “favores” ao Reinado. Tinham a liberdade de se moverem para onde bem entendiam, desde que não interferissem no governo local e não causassem confusões em demasia.
O povo de Khan era liderado por Samul Zatter, um homem dedicado a família, sábio e forte. Sua esposa Emília Erin era considerada a mulher mais bela entre os nômades e também a pérola do Reinado, cobiçada pelo próprio rei Álvar, o mesmo que juntou todos os povos que lutavam para dominar as terras de Alderon em um único, causando obviamente, a revolta de alguns clãs, mas foi considerado um ato de sabedoria e heroísmo pela maioria, pois foi graças a isso que conseguiram defender Alderon dos bárbaros chegando em grandes números nos seus poderosos navios de batalha, vindos do além mar desconhecido. O que poucos sabem, inclusive Emília, foi o terrível duelo travado por Samul e o próprio rei em prol de quem ficaria com ela. Samul venceu o rei oferecendo misericórdia em troca de uma vida pacifica para ele e também para seu povo. Álvar era inteligente e aceitou a barganha, e seguiu com sua vida, se casando com uma nobre de algum clã conhecido.
A verdade era que o povo de Khan começou a se mudar com mais frequência que de costume e não era devido a terra ruim ou aceitação da população local, pelo contrário, sempre eram bem vindos em qualquer lugar. O povo era alegre e sempre levava algum tipo de festival para onde fossem. Dança, jogos e sua famosa bebida feita de frutinhas que se assemelhavam aos olhos negros de demônio, com uma casca amarga e escura, mas por dentro, branca e doce, que chamavam de Licor do Olho Negro. Tudo isso era seu cartão de entrada em qualquer lugar. O problema começava quando sua filha rebelde Azura, começava a frequentar as tabernas locais, seduzindo homens tolos, jogando dados e roubando suas moedas, não que ela precisasse. Ela sempre chegava em casa embriagada, fugida, as vezes com hematomas de alguma briga. As vezes as coisas eram tão serias, que o povo vinha pedir a retirada dos nômades em nome da amizade geral para evitar maiores problemas.
Azura tinha toda a beleza e inteligência da mãe, a força e a resiliência do pai. Juntava tudo isso com a teimosia de um adolescente e temos nas mãos uma bomba de confusão prestes a explodir. Com seus cabelos longos e ondulados, de um negro profundo e brilhante, seu rosto se encaixava perfeito, como a obra prima de um escultor inspirado pelos deuses. Com seus lábios carnudos e da cor de uma rosa, olhos grandes e completamente negros, não deixavam pistas para saber o que pensava. De estatura mediana, suas roupas não foram feitas para ocultar os seus dotes físicos. Seu busto avantajado, mas não exagerado estava sempre exposto em um decote perigoso para os homens de vontade fraca. Sua cintura era moldada pela dança que executava com maestria e por sempre correr e montar suas pernas eram fortes e grossas, seguindo o contorno perfeito de seu corpo. Para azar dos incautos que ousavam ir mais além, Samul ensinara a sua filha a arte da esgrima e a garota se mostrara uma aluna talentosa, aprendendo técnicas avançadas e perigosas, muito além do que seu pai esperava. Seria a filha perfeita, motivo de orgulho para todo o clã. Belíssima, poderosa e inteligente. Mas a sua teimosia, curiosidade e os vícios causavam problemas sem fim, não somente para sua família, mas para todo o clã. Sua beleza era o veneno que deixava os homens perturbados e sua dança os hipnotizava, deixando para trás qualquer virtude que possuíam. Quando estavam nesse ponto, Azura conseguia o que pedisse. Era como magia.
Com dezesseis anos já tinha trago mais problemas do que um grupo de jovens delinquentes. Em seu quarto, um baú enorme e trancado, escondia os tesouros que arrancava dos tolos. Colares, pulseiras, ouro, pedras preciosas, estatuetas estranhas, itens mágicos e até mesmo armas e não foi somente uma vez que apareceu alguém reclamando algo que ela roubara ou que tivesse sido enganado no jogo pela garota.
De fato, Azura não precisava de nada disso. Os nômades não eram propriamente ricos, mas eram autossuficientes e tinham posses consideráveis e até mesmo ouro para casos de emergência. Samul não entendia essas atitudes, mas relevava na maioria das vezes porque se lembrava de quando era jovem e quanta besteira fizera na vida. Não adiantava proibir sua filha de ir as tavernas, trancá-la e muito menos colocar alguém para vigiá-la. Ela simplesmente conseguia burlar qualquer segurança e abrir qualquer fechadura. As vezes se arrependia de a ter mimado demais.
Foi no fim do verão que as atitudes da garota chegaram ao ápice. O Khan estava acampado bem ao sul, próximo ao vilarejo de Gremoire, um vilarejo praticamente sem importância, meio esquecido pelo reinado, mas eles produziam um ótimo vinho de frutas cítricas. Azura havia fugido no meio da noite para a taverna local e na tentativa de trapacear nos dados foi descoberta por um aprendiz de mago que morava ali. Obviamente só foi descoberta depois de ter “limpado” os bolsos de vários na taverna. Os aldeões furiosos tentaram reaver o seu dinheiro, mas a garota se recusou a devolver sem lutar, desafiando quem estivesse disposto. Logo os homens ali, subestimando a garota, avançaram ao ataque. Antes de recuar diante dos números de atacantes a garota deixou vários feridos.
O vilarejo em peso foi até o acampamento dos nômades, pedindo sua retirada imediata pagando o prejuízo dos homens feridos ou que entregassem a garota para julgamento.
Samul, pagou a dívida, acalmando os ânimos com bastante licor e ouro. No amanhecer do dia, levantaram acampamento e partiram. Ainda não tinham destino certo, mas o líder do Khan havia tomado uma decisão. Deixou o acampamento avançar e ficou para trás para conversar com a sua filha rebelde.
- Olha, Azura. Seus atos estão prejudicando todo o nosso povo. Não entendo a real dos seus motivos de agir dessa forma, mas isso tem que parar.
Ele estava furioso e preocupado, mas tentava conversar com a garota não somente como pai, mas como líder de um clã.
- O que eu posso fazer? Eu estou cansada dessa vida monótona, eu quero mais, quero tudo que esse mundo tem a oferecer a mim e um pouco mais. Não posso ser recriminada por isso. – Respondeu a garota em tom altivo.
- Entendo perfeitamente isso que você quer dizer. Já tive minha época assim também, mas tenha cuidado, não deixe que a ganância te suba a cabeça, isso pode ser perigoso e também nunca subestime a vida ou ela pode lhe dar-lhe uma rasteira.
A garota ouviu calada. Samul olhou para o acampamento que avançava lentamente e pensou na fera que sua esposa ficaria depois do que estava prestes a fazer.
- Eu pensei muito sobre isso e creio que já está passando da hora.
Samul parou o cavalo na frente do de Azura, a obrigando a parar também.
- A partir de hoje, você Azura Zatter, detentora do meu nome, não pertence mais ao Khan Shamur, você está banida, até que encontre o que procura, satisfaça suas vontades e cresça como mulher e ser humano.
Azura arregalou os olhos, espantada. Esperava algum tipo de castigo, mas, ser banida era algo duro de aguentar. Ela não disse nada ao pai. Nem ao menos reclamou. Samul foi novamente de encontro a caravana, fazendo com que a carroça onde os pertences da filha estavam parasse. A deixou pegar o que seu cavalo pudesse carregar. A garota pegou algumas joias, ouro e uma boa espada curta que roubara recentemente. Levou também a maioria de suas roupas, afinal não poderia andar por ai, maltrapilha. Seu cavalo Salazar reclamou do peso extra, não estava acostumado a carregar nada mais pesado que sua dona, mas resignou-se ao fardo depois de receber uns tapinhas carinhosos no focinho.
Azura partiu sem dizer nada nem olhar para trás. Cavalgou o mais rápido que podia, rumo a aventura que sonhara a muito tempo para si. Do alto de uma colina, Samul observava com lagrimas nos olhos a sua filha partir, orando para os deuses que a protegessem e a guiassem nessa nova jornada.
O processo de recuperação de Euriacos foi acelerado graças aos cuidados e as magias de cura que Circe aplicava. Azura evitava questionar o que acontecera antes de chegarem a ilha. A própria Circe sentia a desconfiança da cigana e por isso uma noite resolveu contar-lhe como viera parar ali e porque se tornara prisioneira. Ela crescera no seio de ninfas, sendo ela mesma filha de uma ninfa. Porem o fato de ser filha de um deus caído a transformara em uma pária diante das divindades dominantes. Em sua tentativa de fuga, ela acabou atraída pela grande presença magica naquela ilha. O resultado foi ser capturada pela feiticeira Calíope, mas nunca ser ter sido de fato enfeitiçada. Sua ascendência lhe garantia imunidade total ao encantamento e acima de tudo impossibilitava que a própria feiticeira a matasse. Em pouco tempo então ela já entendia a base do poder da feiticeira, mas também era incapaz de matá-la, precisava de outros meios para isso. Os marinheiros que por ventura ancoravam ali,
Essa conversa breve com a jovem prisioneira, atraiu a atenção da feiticeira, que largou os homens comendo a lavagem porca, ludibriados pelo encanto lançado, crentes que saboreavam um delicioso banquete, em um aconchegante recinto. Azura não tentava nem imaginar o que eles estavam bebendo, parecia um liquido pegajoso e grosso.Calíope aproximou-se, suas escamas reluzentes tilintando como metal e suas patas rastejantes de lagarto caminhando vagarosamente na direção da cigana amarrada como um animal em uma armadilha.— Então temos aqui uma nova bela visitante.Sua voz era doce como o mel, e soava como a canção de um rouxinol. Azura sentiu um leve torpor tomando conta do seu corpo. Possivelmente até mesmo falando, Calíope conseguia enfeitiçar as suas vítimas.“Concentre-se! Não preste atenção as palavras dela. Agarre-se a uma lembrança boa e fixe-a na mente.”A cigana ouviu a voz de Circe ecoando em sua cabeça. Olhando para ela viu que ela fazia um tremendo esforço para se comunicar com e
Heitor foi pego totalmente de surpresa e Euriacos ao seu lado não conseguia emitir um som sequer. Azura estava espantada, pois esperava algum tipo de monstro, cruel, feio e asqueroso, mas estava diante de uma mulher elegante, de olhar vivido e inteligente, nem um pouco incomodada com a atitude tola dos homens ali presentes. Demorou alguns segundos para Heitor se recompor e dirigir-lhe a palavra. — Perdoe nossa intromissão. Devo admitir que esperava a presença de algo muito diferente do que os meus olhos veem agora. — Permita-me oferecer-lhes um lugar a minha mesa. Quanta descortesia a minha, uma anfitriã que não se apresenta aos convidados. Eu sou Calíope, essa é minha jovem aprendiz Circe. A feiticeira apontou para a criança que os encarava com olhar altivo e ameaçador, ao lado dela. Com um breve aceno de cabeça aos recém chegados ela retomou as suas atividades, carregando para o interior da caverna uma pilha de livros de aparência gasta. Com um gesto amplo das mãos, Calíope fez
O próximo passo seria uma ilha distante e desconhecida. Diziam que ali habitava uma antiga feiticeira, cruel e sedenta de poder. Ela possuía um dos artefatos o que fazia com que sua magia fosse muito mais poderosa que o normal.O Trôgon partiu com o despontar do primeiro raio de sol, aproveitando a brisa e o tempo perfeito. Carregado para quinze dias de mar, esperavam que no caminho pudessem encontrar outras ilhas para trocar mercadorias e assim reabastecer sem riscos. Os mares eram desconhecidos e imprevisíveis e nem sempre tudo corria como o esperado, mas os marinheiros e seu capitão eram experientes e estavam preparados para tudo.Apesar de Azura sentir que algo não se encaixava na história de Heitor, ela o seguia, cada dia aprendendo mais os truques do oceano e se familiarizando com a marinhagem e a tripulação. Era já considerada parte importante da equipe e todos respeitavam suas habilidades. Por vezes deleitava os marinheiros com uma bela dança, ao som do bardo Helder. Esses mom
Suja de lama e com a sua fina túnica em farrapos, Sareena sentiu, olhares diferentes a vigiando das sombras. Ela havia caminhado por horas, ignorando o cansaço, a fome e a sede que sentia. De subido, um silvo agudo a avisou do ataque iminente, em um instante desviou a cabeça para o lado, olhando o vulto veloz da flecha que passou zunindo e cravou -se na arvore atras de si. Ela não via seus agressores, mas conseguia determinar a localização de cada um. Ela podia senti-los através da densa sombra que os escondia. Concentrando a sua energia, ela conduziu a sua aura através das sombras e sentindo uma intensa fisgada na barriga ela se moveu numa velocidade incrível, dentro da própria escuridão. Isso surpreendeu seus agressores, que não esperavam que ela tivesse os localizado.— Não vim para lutar. – Ela olhou para seus agressores. Eram mesmo os elfos. Mas eles eram completamente diferentes do que ela havia imaginado e também divergiam totalmente das descrições que o povo local havia passad
Apesar de ser uma tripulante considerada, Azura ainda não estava completamente inteirada da missão em si. Esse era o assunto que ela queria ter com Heitor nos aposentos que o rei havia deixado para o descanso deles. Mas o capitão não estava muito para conversas. Deixando de lado sua túnica ele se apresentou a ela como havia vindo ao mundo, tomando- a nos braços sem dar tempo para que a cigana se esquivasse. Entre os beijos ardentes, o minoico a segurava firmemente pelos cabelos, desabotoando com uma das mãos o corpete de couro, alisando com as mãos fortes o corpo macio da cigana.Azura nunca havia provado tanta intensidade. O capitão estava ávido e ela mesma não conseguia se segurar. Com certeza a conversa sobre o trabalho poderia esperar até o dia seguinte.Esse foi de fato, o primeiro assunto que Azura quis tratar com Heitor após o desjejum. Ela notou claramente que o capitão tentava se esquivar do assunto. Ela o pressionou.— Como posso ajuda-lo se não me contar qual é de fato a mi
Último capítulo