Felizes no casamento

Foi quando viu seu marido na cama do hospital, machucado e inconsciente, que Vinícius sentiu a imponência no seu mais puro estado pela primeira vez. Não adiantaria pensar no que poderia ter feito pra evitar, e com Ivan ali, acidentado, já não podia fazer nada pra ajudar. 

Só podia esperar. Sentar-se lá, na cadeira ao lado da cabeceira e esperar, ouvindo os bipes longamente espaçados dos aparelhos enquanto olhava pro rosto gélido do marido, pedindo aos sussurros para que ele acordasse. 

E ainda estava esperando, porque foi Ivan de sete anos atrás que despertou primeiro, antes do marido; o que não esperava era se ver, agora, com vinte e cinco anos, tão, mas tão encantado com aquele Ivan, seu roommate pelo qual, na época, ele não estava assim tão interessado. 

Ivan era aquele rapaz sério, dedicado, certinho e tímido, mas extremamente competente no quesito ser útil aos outros. O Vinícius de dezoito anos só conseguia achar o outro um tanto brega, mesmo sendo um bom amigo; além do mais, não fazia nem ideia de que atração sexual de homem pra homem era possível. 

E como conseguia ser tão lerdo quando mais novo, sinceramente?! Aquele Ivan era tão adorável: suas passadas curtas, seus repentinos abraços, seus sorrisinhos de canto, inocentes, seu corar a cada instante, e além de tudo, sua calma diante da difícil situação; enfim, franco, com os outros e consigo mesmo, controlado, esse era o Ivan de dezoito anos, mil vezes mais maduro que ele naquela idade. 

Tirou-lhe as roupas devagar, primeiro o short, depois a box e então a blusa, apreciando com cuidado cada pedacinho daquele corpo emagrecido e frágil pelo tempo sofrido do coma, mas ainda marcado pelas belas curvas do seu amado dançarino.

— Tão lindo... — suspirou, subindo as pontas dos dedos pelo abdômen que tremeu ao toque. 

Olhou para Ivan, que recuou e baixou os olhos; passou o braço pela sua cintura, puxando-o novamente para perto e levantando seu rosto com um toque gentil no queixo. 

Pouco mais alto, mais maduro, os cabelos prateados lisos em cascatas. É, era o corpo do seu marido, cujo calor e rubor, e aconchego, fazia-lhe tanta falta, mas aqueles olhos...aqueles olhos eram do Ivan mais novo, do seu amigo mandão pelo qual demorou a se apaixonar e mais ainda pra se dar conta da paixão, que dirá admitir: agora estava louco por ele, pelo seu jeitinho, e em tão pouco tempo que se sentia culpado. 

Será... será que era errado? Estaria ele traindo seu esposo por aquele alguém que Ivan já não era mais? 

— Se você não quiser, nós paramos por aqui...

— E- eu quero! — ele gaguejou, mas foi incisivo; decidido. — Eu quero, é só você me mostrar como nós... — ficou vermelho, bem mais do que já estava — ...como nós... fazíamos...

Acariciou-lhe a bochecha com as costas dos dedos. Ah, Ivan!... Não vai dar pra fazer como nós fazíamos. Aquele Ivan já consciente da sua sexualidade porém ainda virgem não faria com ele como o fazia sete meses antes, não mesmo. O Ivan de vinte e cinco anos certamente deixaria o de dezoito completamente desconcertado.

— Eu vou te ensinar... — pegou as mãos pequenas nas suas, sentindo-as suadas — ...como se fosse sua primeira vez, tudo bem? 

Seu queixo tremeu um pouco, mas depois de um breve momento de insegurança ele fez que sim com a cabeça. Vinícius riu soprado, baixando o rosto na curva do seu pescoço pra deixar uma linha de selinhos até sua orelha; aquela demonstração de afeto tão singela já o fazendo arrepiar todo. Tão novinho...droga, se fosse mais esperto naquele tempo... Se bem que duvidava muito que Ivan demonstrasse aquela fragilidade toda pro seu eu mais novo. 

— Sei o que você deve estar pensando — sussurrou ali —, mas eu não me incomodo por você não se lembrar, nem um pouco. — subiu a mão na sua cintura pela linha da coluna, dedilhando as vértebras, uma por uma, como que contando; Ivan estremeceu fortemente. — Só quero cuidar de você.

Soltou o ar fortemente. Oh my, oh my... Estava muito difícil acreditar que aquele homem era Vinícius, muito. Ele sempre teve uma voz grave, mas nunca lhe causara aquele efeito; talvez porque o roommate nunca sussurrou no seu ouvido antes? Sim, talvez, mas também talvez porque nunca lhe falara naquele tom, arrastado e sexy daquele jeito. Aliás, o Vinícius que conhecia não o olhava daquele jeito, não o abraçava daquele jeito, daquele jeito que fazia um geladinho gostoso subir pelo estômago e virar um arrepio na nuca. 

Sim, tinha um crush pelo seu colega de quarto, que já temia e agora sabia que viraria um abismo de queda livre e irremediável mais tarde, mas era total e completamente não correspondido pelo simples fato de: Vinícius era muito criança, mesmo já na faculdade. 

Mas aquele Vinícius ali, céus!... Aquele Vinícius...como foi? Como aconteceu? Como é possível? Como aquele menino devagar quase parando virou um projeto de idol que diga-se de passagem era seu marido? E, que droga, justo quando estava casado com aquele Vinícius mil vezes melhor que o dos seus sonhos perdeu da cabeça qualquer experiência útil para aquele momento. 

Sim, estava morrendo de vergonha de ser virgem justo com um homão daqueles, mas Vinícius estava tão cuidadoso consigo, tão gentil, tão... Ah, ele era tão perfeito! Perfeito até demais pra ser verdade. E se não fosse de verdade? E se ele estivesse… em coma, ainda, e tudo aquilo fosse coisa da sua cabeça?

Vinícius colou os lábios nos seus e o apertou no abraço; uma mão no lado do seu pescoço, deixando que deitasse a cabeça nela pra que o beijo encontrasse seu melhor encaixe. Ah, não,  aquele beijo era gostoso demais pra ser só sua imaginação, e mesmo que fosse, que importava? Passou os braços pelos ombros largos e se entregou completamente, pros beijos apaixonados da boca quente, pros toques intensos das mãos hábeis, pros sussurros nada inocentes daquela voz grossa ao pé dos seus ouvidos, o fazendo arrepiar e tremer cada vez mais forte. 

Em dado momento já estavam ambos nus e caindo juntos na cama; Vinícius se ajeitando por cima, se apoiando com os cotovelos no colchão pra não pôr seu peso sobre Ivan, mas perto o suficiente pra escorregar o torso suado no dele, causando nos membros tesos uma fricção gostosa pros dois; pra ele um estímulo leve, uma provocação simples de preliminar, mas muito mais pro garoto abaixo dele, se contorcendo descontroladamente.

— Ivan... — Os cabelos cinza grudados na testa molhada de suor, os olhos brilhando expelindo lágrimas a cada piscada, as bochechas rubras, os lábios inchados abertos pros gemidos manhosos e incessantes. Pegou nas mãos pequenas, entrelaçando os dedos nos dele, sem tirar os olhos daquele Ivan completamente derretido.

Aquilo era demais pra ele, já completamente perdido na insanidade: aquele estímulo fazendo alastrar um calor insuportável por dentro, sua pele em chamas, os cabelos de fogo caindo na sua direção, em torno daquele rosto perfeito, a pele cor de canela brilhando atrás de uma fina camada de suor; a língua inquieta dançando sobre os belos lábios vermelhos, os olhos amendoados semicerrados, ele no reflexo das íris castanhas. Vinícius o olhava com tanta fome, e sede...como se ele fosse algo apetitoso mas bonito demais pra não ser apreciado antes de devorado. 

— Vini... — Choramingou; estava se sentindo estranho, agora; apertou as mãos entrelaçadas nas suas e fechou os olhos; arqueou as costas e juntou as pernas, contraindo até os dedinhos dos pés; na sua cabeça a imagem daquele Vinícius de cabelos castanhos sob uma luz lilás, de novo, gemendo e se contorcendo exatamente como ele estava agora, só que abaixo de si. — Ah! Ah! Vini!...

A sensação que estava sentindo agora era gostosa, a que sentiu naquele momento também, e o misto das duas o lançou pro sétimo céu num segundo. 

Vinícius acabou gozando também, mais de ver Ivan naquele estado de sensibilidade do que pelo estímulo em si. 

Soltou o ar fortemente, se deixando cair deitado ao lado do marido pra então puxar o corpo molinho pro seu colo, o ajeitando confortável nos braços. 

Ivan piscou letárgico, concentrado nos carinhos que Vinícius lhe fazia nos cabelos e pelas costas, deixando o sono vir e tomar conta dele. 

Foi como um cochilo curto de uns poucos minutos; sim, poucos minutos, tinha certeza, mas quando abriu os olhos o quarto estava completamente iluminado pela luz do sol entrando através de cortinas brancas. Se espreguiçou, levantando o tronco pelos cotovelos e olhando pro lado, esperando ver a cabeleira ruiva espalhada na fronha clara do travesseiro, mas não foi o que viu. O que viu foram cabelos loiros bagunçados sobre a testa de um rosto que conhecera a pouco. 

— Yuri...? 

— Se não for onze horas ainda, não se atreva a me acordar. — Ele murmurou com o lábio de baixo projetado pra frente, sem nem fazer menção de abrir os olhinhos apertados. Tão fofinho, parecia um gatinho.

— Mas você já está acordado. — Riu, acariciando os cabelos descoloridos enquanto apreciava o rostinho emburrado por um momento antes de suspirar, tomando coragem pra sair da cama, mas quando fez que ia se levantar, Yuri fechou o punho no seu pulso.

— Não... não vai embora.

— Você está agindo de forma fofa, senhor marrento? — Brincou, vendo-o abrir uma brechinha entre as pálpebras de um dos olhos. Sorriu pra ele. — Eu preciso ir, o Vinícius deve estar preocupado.

— Uhm... — ele murmurou longamente — Uhm. — então soltou-o e voltou a apertar os olhos, abraçando o travesseiro. Ivan sorriu consigo, se levantando da cama, começando a catar suas roupas caídas no tapete e vestindo-as. Sentiu o olhar do mais velho nas suas costas, mas não disse nada, preferindo esperar a pergunta vir, qualquer que fosse. — Vocês se conhecem a quanto tempo? — Bingo.

— Desde o colégio. — Respondeu, fechando a calça e pondo a camiseta. — Por quê? Preocupado? 

— Curioso. 

— Sei... — Deu a volta na cama, indo pegar sua carteira e celular em cima da estante à frente da janela. — Pensei que tinha dito que isso é só sexo.

— É só sexo — retrucou de pronto — Só fiz uma pergunta. 

— Suas perguntas são muito óbvias. — sorriu de canto, pondo a carteira e o celular nos bolsos de trás da calça. — Senhor Yuri. — se inclinou pra deixar um beijo nos lábios finos. Yuri o beijou de volta de imediato, levantando o torso e pegando no seu pescoço pra que ele não se afastasse. Sorriu na boca alheia, um sorriso cheio de malícia beirando o sádico do qual não sabia nem que era capaz. — Tchau, gatinho. — findou o beijo com um estalo — Deixa eu ir agora. 

— Tá... — ele suspirou, escorregando a mão do seu pescoço lentamente antes de afastar. — Se cuida. 

Acordou num susto, olhando em volta, confuso. 

— Amor? — Vinícius acabou acordando também com a agitação de Ivan no seu colo. — O que foi, meu bem? — apertou o abraço em torno dele; os dois ainda deitados naquela posição acabaram caindo no sono, mas certamente só por uns minutos — Tá tudo bem?

— Eu... — Deus, o que é que foi aquilo? Que sonho mais... — Nada, não foi nada. — voltou a abraçar Vinícius, escondendo o rosto no peito largo. 

Ficaram em silêncio por um bom tempo, mas acordados; Vinícius acariciando os cabelos do esposo, preocupado se não tinha passado do limites com ele ou se estava tudo bem mesmo, até que Ivan perguntou, num fio de voz. 

— Vini, nós somos felizes, não somos? Digo...

— No nosso casamento? — buscou seu olhar; ele parecia preocupado, o que o preocupou também — Claro que sim... Passamos por muita coisa...mas somos felizes, sim. 

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