Depois de colocar Lily na cama, Rafael se recostou na cadeira de balanço da varanda, o ranger suave da madeira acompanhando o ritmo de suas memórias. Quase quatro anos haviam se passado, mas o eco daquela ligação ainda o assombrava. A noite avançava no céu de Flecheiras , um contraste cruel com o céu cinza opressivo do dia em que seu mundo desabou.
A voz do outro lado da linha estava embargada, hesitante, e a cada palavra a ficha caía, pesada e fria. Sua irmã, Lívia, e seu marido, Ricardo, mortos. Um acidente. E no meio daquele vazio, um fio tênue de esperança e terror: Lily, a sobrinha de apenas dois anos, estava viva, hospitalizada em Flecheiras.
Ele lembrava da corrida desesperada, o carro engolindo a distância entre sua vida agitada na capital e aquela pequena cidade do litoral. Rebeca, sua noiva, tentara consolá-lo, suas palavras soando ocas diante da amplitude da perda. Eles acolheriam Lily, era o plano, natural e inquestionável. Ou assim parecia.
As primeiras semanas em Flec