Mundo ficciónIniciar sesiónO corredor parecia ainda mais longo quando Luna saiu do quarto de Elias. O silêncio ali tinha peso, como se cada parede fosse capaz de absorver e amplificar emoções. Ela respirou fundo, tentando organizar os pensamentos, mas antes mesmo de dar dois passos, o ar ao redor dela mudou.
Um movimento.
Ela sentiu antes de ver.
Adrian Valmont emergiu da sombra no final do corredor como alguém que já sabia que estava prestes a interrogar um suspeito. A postura dele era impecável, rígida, poderosa. Mas o olhar… o olhar era uma lâmina prestes a penetrar qualquer defesa.
— Você fala demais — ele disse, sem saudação, sem introdução, sem suavidade.
Luna se virou por inteiro.
— Eu tento conversar com ele, não com paredes — ela respondeu, firme, sem desviar.
Os olhos de Adrian estreitaram-se.
— Elias não precisa de alguém conversando com ele. Precisa de estabilidade. Regras. Rotina.
— Regras e rotina não substituem presença — rebateu Luna. — Nem carinho.
O maxilar dele travou.
— Não presuma que entende meu filho — ele disse, aproximando-se mais um passo.
Luna manteve os pés firmes no chão.
— E o senhor não presuma que entende meus métodos.
Ele deu uma risada curta, sem humor.
— Você entrou nesta casa há poucas horas e já se considera uma especialista?
— Eu só estou fazendo meu trabalho — respondeu. — O senhor me contratou para cuidar dele, não para ignorá-lo como se fosse um problema a ser administrado.
Aquilo o atingiu.
Luna percebeu.
Os olhos dele escureceram, não apenas de raiva, mas de algo mais profundo. Algo ferido.
— Você não sabe nada sobre nós — ele disse, devagar, cada sílaba carregando um peso inteiro de tragédia não dita.
— Então me ensine — ela murmurou. — Ou pelo menos me deixe tentar.
Ele respirou fundo, uma respiração curta, tensa, contida.
— Você é ousada demais para alguém que precisa desesperadamente deste emprego — ele disse.
Luna levantou o queixo.
— E o senhor é controlador demais para alguém que finge não se importar.
O silêncio que veio depois pareceu quase… elétrico.
Adrian a observava como quem tentava identificar uma ameaça ou um erro no sistema. Mas havia algo mais atrás daquele olhar calculado: um incômodo, um desejo de entender por que, pela primeira vez em muito tempo, não tinha pleno domínio da própria casa.
Antes que qualquer um dos dois pudesse continuar, um som suave interrompeu o confronto.
Um objeto caindo no chão.
Os dois viraram ao mesmo tempo.
Elias estava parado na porta do quarto, segurando um carrinho pela metade, os olhos muito grandes, muito escuros, olhando de um para o outro.
E havia medo ali.
Luna deu um passo em direção a ele, devagar, como se aproximasse de um animal ferido.
— Ei… está tudo bem — ela disse, com voz calma, gentil, acolhedora. — Eu não vou a lugar nenhum.
O menino não se moveu, mas seus dedos apertaram o carrinho com força.
Ela se agachou um pouco, ficando na altura dele.
— Você quer…? — começou ela.
Mas não terminou.
Porque Elias deu um passo hesitante.
Até parar exatamente diante dela.
A respiração de Luna falhou.
E então, como se rasgasse um véu invisível entre os dois mundos — o mundo dele silencioso e o dela quebrado — Elias levantou a mão.
Devagar.
E tocou a mão de Luna.
Um toque pequeno.
O calor da mão dele atravessou a pele dela, subiu até o peito e explodiu em alguma parte escondida que ela achava que estava morta desde o hospital.
O mundo parou.
Adrian deu um passo involuntário à frente, como se tivesse visto algo impossível acontecer.
O menino apertou a mão dela.
E Luna devolveu o aperto.
— Eu estou aqui — disse, com um nó na garganta. — Eu fico. Prometo que fico.
Elias deu outro pequeno aperto, como se tivesse acabado de escolher.
Luna.
Ele escolheu Luna.
Adrian parecia incapaz de falar.
— Isso… — ele murmurou, rouco. — Isso não acontece. Ele nunca…
Luna ergueu o olhar.
Encontrou o dele.
E viu a dor.
O homem bilionário, poderoso, impenetrável… estava quebrado.
E ela sem querer acabara de tocar a peça mais sensível dele.
A voz de Adrian saiu baixa, trêmula, quase um sussurro:
— O que você fez com meu filho?
Luna respirou fundo.
— Nada — respondeu. — Só o vi.
E aquela foi a primeira vez que Adrian percebeu que talvez tivesse contratado não apenas uma babá.
Mas uma mulher capaz de desmontar tudo o que ele tentou proteger — inclusive ele mesmo.
E a mansão pareceu respirar diferente, como se entendesse que algo enorme tinha acabado de começar.







