Os olhares dele estavam diferentes, quase sorridentes. Eu estava prestes a agradecer quando o telefone tocou. O rosto dele mudou completamente, transbordando ódio. Aquele homem era um completo mistério. Ele murmurou baixinho:
— Deixarei você em casa, e eu sairei novamente. Chegarei tarde.
Ele falou com tanta naturalidade, como se dar satisfação a uma estranha — que agora era sua esposa — fosse algo raro. Romeu parou o carro para eu descer, entregou-me uma cópia da chave e olhou nos meus olhos, assustado. Algo estava errado. Mil pensamentos cruzaram minha mente. Aquilo não parecia fazer parte da sua arrogância habitual.
Entrei na casa e me senti completamente perdida naquele espaço enorme. Um piano decorava o ambiente com elegância. O sofá tinha a cor mais viva possível: vermelho, a cor do amor. Um clichê, talvez, mas estava ali, marcando presença bem no meio da sala.
Fui até a cozinha para preparar algo. Sobre a mesa, havia um bilhete:
"Eu sei que não encontrará nada para comer, então... deixarei o cartão e a senha para ir às compras. Compre o que quiser."
Anny, Anny... temos muito trabalho a fazer. Até lá, esse grande homem precisa aprender muitas coisas. Ai, ai... eu, esposa de Romeu Goz. Fui às compras. Comprei o necessário para o jantar. Mas, ao voltar, vi meu "marido" com uma mulher. Ela também era jovem. Senti vontade de fazer uma cena de ciúmes — precisava parecer real.
— Posso saber o que está acontecendo aqui?
— Conversando — disse ele friamente. — Já que está aqui, Anny, apresento minha irmã: Tatiana Goz.
— Prazer, Tatiana. Me desculpe pelo meu jeito, não foi minha intenção.
— Essa é a famosa Anny Goz? — perguntou Tatiana. — Não precisa se desculpar. Eu faria a mesma coisa no seu lugar.
Sorri, envergonhada pelo incidente.
— Sim, minha irmã. Ela é minha esposa.
— Boa escolha, irmão. Muito atraente, sua esposa.
— Obrigada pelo elogio, fico lisonjeada.
— Sinta-se mesmo, Anny. Estou falando a verdade.
— Vamos, meninas. Está tarde — disse Romeu. — Ajudarei com as compras.
— Obrigada!
Estava tão cansada que mal sentia os pés. Graças a Romeu, não voltei a pé para casa. Tatiana veio conosco. Me ajudou a preparar o jantar enquanto tomávamos vinho.
Romeu, por outro lado, não largava o telefone. Falava em quatro idiomas: português, coreano, espanhol e italiano. Estava fechando parcerias com a empresa Hoppy. Depois de tudo, ele tirou a camisa — estava suado, o dia e a noite haviam sido exaustivos para todos nós.
Como uma boa esposa dedicada, chamei-o para jantar. Quando fui servir o vinho, ele deixou cair um garfo. Abaixei-me para pegá-lo, e ele também. Sussurrou no meu ouvido:
— Dormirá no meu quarto hoje, para minha irmã não desconfiar de nada.
— Não se preocupe.
Sentei-me ao lado dele, fingindo ser um casal perfeito. Ele sorria forçadamente, me tocava, me beijava... Era tudo muito estranho para mim. Nunca namorei, nunca beijei alguém. E agora, ali estava eu, sustentando essa mentira. Sentia-me mal por aceitar algo tão sério apenas para proteger sua reputação. Era para fingir um casamento perfeito... Mas será que Anny está fazendo isso direito?
Tatiana me ajudou a limpar a cozinha. Aproximou-se de mim e perguntou:
— Anny, você e o Romeu... já tiveram a primeira vez de vocês?
Ao ouvir a pergunta, ele se engasgou com o café, ficando vermelho. Respirei fundo e respondi:
— Sente-se, cunhada, vamos conversar sobre isso. Sim, a resposta é sim. A nossa primeira vez foi linda. Meu esposo preparou um banho de espuma com pétalas de rosas vermelhas — as minhas preferidas. Romeu foi muito cuidadoso.
Romeu me olhou e sorriu pela mentira que eu acabara de contar. E foi a primeira vez que vi aquele sorriso. Fiquei boba. Seu rosto, sua barba bem desenhada... aquele sorriso deu um novo contorno à sua frieza. Estava tão envolvida na mentira que ela começou a parecer real. Pensei:
"Acorda, Anny. Você está em um pesadelo, não em um conto de fadas."
Minha cunhada me olhava perplexa. E eu... estava viajando em algo impossível. Tatiana sorriu e me chamou, mas eu estava tão distraída que só respondi:
— Ham?
Rimos disfarçadamente. Cruzei os braços e fui surpreendida por Romeu, que me estendeu uma xícara:
— Amor, preparei algo para você. Não sei se o doce do café está ao seu gosto.
Peguei a xícara, enquanto Tatiana nos observava, achando tudo lindo. Agradeci com um sorriso. Mas reparei bem: Romeu estava pálido, desconfortável. Pensei em inventar uma desculpa para que todos se recolhessem.
Observei-o por longos segundos, tentando entender o que se passava. Algo ele escondia. Meu sexto sentido dizia que havia dor, algo pesado no coração dele. Pessoas confiavam nele facilmente, e talvez isso o machucasse.
Mordi os lábios pela primeira vez. Estava encantada por um homem... em êxtase. Tatiana deixou a taça na pia e foi para o quarto, exausta pela viagem. Fui até Romeu, que revisava documentos da empresa. Fiquei em pé diante dele, em silêncio, apenas admirando. Ele ergueu os olhos:
— Diga, Anny. O que você quer? Não fique me olhando feito uma boba.
Presumia tudo o que ele diria. Engoli em seco e respondi:
— Não é nada... Apenas não me sinto bem em ficar sozinha esta noite.
— Então sente-se naquele sofá e fique quieta.
Sorri. Estava bem com a companhia dele, mesmo que ainda fosse um estranho. A exaustão me pegou. Peguei no sono, sem sequer dar boa-noite.
Naquela elevação entre sonho e realidade, senti algo me tocar. Um cheiro suave. E palavras sussurradas, como se viessem do coração:
— Eu não consigo me apaixonar, menina... Eu sei que você é atraente e linda. Seu rosto, seu sorriso marcante... você é perfeita. Qualquer homem te desejaria. Eu não sei o que houve comigo depois que... eu sei que você não entenderá. Com o tempo, sei que vai se cansar de mim e voltará para o seu mundo. E eu... voltarei para a minha vida de antes. Anny... se eu pudesse me apaixonar...
---Quase chorei com as palavras dele. Não fui capaz de me mexer. Romeu Goz é tão misterioso que chegou ao ponto de fugir dos próprios caminhos. Estava apenas começando a sentir o peso da solidão.Na manhã seguinte, acordei no sofá com o pescoço dolorido de tão duro que estava. Me estiquei com força e percebi que Romeu me observava, desviando o olhar logo em seguida e voltando a ler o jornal. Ele estava sem camisa. Olhei para o relógio: eram 7h30 da manhã. Fui até o closet e peguei uma camisa social azul, um terno preto e uma gravata cinza. Deixei tudo disposto em cima da cama. Abri a gaveta para pegar um de seus relógios importados. Fiquei parada em frente ao espelho e pensei: Como alguém pode ser tão rude consigo mesmo? Ele não me pareceu tão ruim assim. Eu, como mulher, preciso de mais do que brincar de casinha. Romeu, com aquele hábito de levar a mão à boca para morder os lábios, me deixou confusa. Nunca vai me enxergar como mulher. Fui boba por aceitar esse casamento. Fui infantil. Ve
Ouvi uma voz familiar: — O que faz na chuva, minha esposa?Romeu chegou naquele lugar me assustando — não esperava pela presença dele. Respondi sem rodeios: — Esbarrei em Oscar. Estava distraída, ele estava apenas pedindo desculpas pelo esbarrão. Vamos, Romeu.Ele me levou até o jornal. Pedi suavemente: — Pode ajeitar o guarda-chuva?Ele se ajeitou, colocando sua mão na minha cintura. Olhou para mim com um jeito delicado e doce. Arrumou o meu xale, que estava em volta do meu pescoço, e sussurrou: — Não quero que você se aproxime daquele idiota, está me entendendo, Anny?Fiquei surpresa com aquele pedido. Não conhecia bem aquele homem e não entendia o motivo de tanta aversão ao senhor Oscar.— Sim, Romeu. Como você quiser. Mas… o que ele fez pra você?— Ele é meu inimigo desde a faculdade. Trabalhamos juntos num evento para uma empresa de telefonia. O pai dele o colocou como encarregado, e eu tenho que aturá-lo até o fim do contrato — mais dois anos. O que eu pedi é uma ordem!— Est
— Tem muito. Eu não dei permissão para você me chamar pelo meu segundo nome. Vá se trocar, está me tirando do sério!— Seu babaca, me solta! Você não sabe o que é sentir prazer!Saí da sala subindo as escadas nua. Romeu me seguiu e me puxou fortemente pelo braço, me beijando com fúria e desejo. Eu sabia que ele estava lutando por tudo o que desejava. Beijei de volta, sentindo o calor do corpo dele no meu; sua boca na minha me deixava ainda mais excitada. Ele murmurou, depois de me empurrar após o beijo:— Na próxima vez, menina, não me provoque.Segurei no pescoço dele e o beijei novamente, de novo e de novo. Ele me levou até o quarto e disse:— Vista-se, Anny, como uma senhora Goz. Seja breve. Estarei esperando lá embaixo.Entrei no quarto, abri o guarda-roupa e peguei uma camisa social branca e uma saia preta. Prendi o cabelo em um coque. Antes de sair do quarto, calcei um salto preto e fechei a porta. Estava nervosa. Desci as escadas — meu marido me aguardava. Peguei na mão que ele
— Por isso que o Oscar te odeia tanto, por causa da morte da Katarina. Que babaca.— Não quero falar mais sobre isso. — Ele se levantou do sofá, ficou parado em frente à janela, com as mãos no bolso. Estava chorando. Foi a primeira vez que o vi tão vulnerável. Aproximei-me, fiquei atrás dele e o abracei fortemente, sentindo o calor do seu corpo. Me surpreendi com o toque de suas mãos sobre as minhas. Ficamos um bom tempo assim, agarrados em silêncio. Fui até a frente dele, fazendo-o sorrir. Romeu era lindo e atraente. Seu jeito frágil estava me conquistando, e isso me fazia querer ainda mais cuidar dele. Sussurrei:— Vamos até o seu quarto. Preparei um banho para você relaxar. Deixa eu cuidar de você? Uma coisa boa que aconteceu hoje foi que você me deixou te tocar, depois de meses de casados. Hoje mais cedo me deixou retribuir seu beijo...Ele pegou na minha mão, me guiando até o quarto. Me deixei levar pela emoção. Romeu abriu a porta, entrei um pouco assustada — nunca tinha ficado s
— Anny?— Vai ver se eu estou na esquina. Você não merece que eu te ouça.Saí correndo do quarto dele, sem ao menos deixá-lo explicar. Peguei minha bolsa e resolvi sair por aí, tomar um ar. Eu precisava esquecer, pelo menos por um momento.Romeu ficou sem entender. Vestiu suas roupas rapidamente e saiu correndo atrás de mim. Estava assustado. Pela primeira vez, sentia medo. Naquela noite, a avenida estava movimentada. Romeu procurou por todos os lugares, em todos os bares. Enquanto dirigia, pensava:“Por Deus, onde está essa mulher? Se acontecer alguma coisa com ela, eu nunca me perdoarei!”O celular tocou. Era o motorista, Hugo.— Diga?— Senhor, sua esposa está na empresa HOPPY.— Ok. Não saia daí até eu chegar. Não tire os olhos dela.— Certo, patrão.— Anny, Anny... O que eu farei com você?Romeu deu meia-volta, indo direto para a empresa. A velocidade estava a 100 por hora. Os pneus deslizavam pela pista, sem dó nem piedade. Ao chegar, deu a ordem para Hugo voltar para casa — ele
— Para que o dia amanheça logo... e tudo acabe — disse, com um sorrisinho sem cor.— Falta pouco para voltarmos para casa. Descanse, você vai se sentir melhor. Ah! Ficarei ao seu lado até se recuperar — ele prometeu.— E eu não vejo a hora de estar na minha cama — disse Anny. — Fernando?— Hum?— Quero lhe fazer uma proposta. Sei que é cedo ainda... Poderia dormir ao meu lado todas as noites? Tenho medo de que este pesadelo volte a me assombrar. Me promete? — pensou ela.Romeu sorriu sem graça e perguntou insistentemente o que ela pensava. Anny olhou para ele e negou:— Não é nada, falei em voz alta, só isso.Aquele momento foi mágico. Romeu ajeitou o outro lado da cama do hospital, enxugou suas lágrimas, mordeu os lábios, tentando devolver-lhes um pouco de cor, e sussurrou:— É sério mesmo, Anny, que eu tenho que deitar aqui?— Você prometeu, Fernando.— Está bem.Romeu deitou-se ao meu lado. Senti uma sensação de promessa cumprida. Ele deixou sua timidez de lado.— Romeu?Chamei mais
Naquela manhã, o dia começou bem. Para muitos, sim. Para poucos, também. Não há dias ruins para quem deseja viver em paz, mesmo carregando um fardo pesado. São coisas inevitáveis — talvez sim, talvez não. Não é teoria para aqueles que têm mentes completamente diferentes.Ao chegarmos em casa, depois de um dia de reencontros, uma moça estava parada na frente da entrada principal, nos esperando.— Bom dia, senhor Goz — disse a moça.— Bom dia. Sou a senhora Goz. O que deseja? — perguntei.— Pretendo falar em particular com o senhor Goz.— O que deseja? Afinal, quem é você? — perguntou Romeu, curioso.— Me chamo Dayana Valentina. Sou a funcionária que veio cozinhar para vocês. Fui indicada pela sua mãe, dona Cecília.— Ah… Entendi. Entre, por favor.Ela entrou na sala de estar. Observei-a dos pés à cabeça. Era uma moça muito bonita. Seu olhar era vago. Por ser tão bela, parecia que sofria, ou já havia sofrido, na vida. Ainda assim, me mantive alerta. Mesmo que parecesse boa ou inocent
— Por que ele deve ir até a delegacia? Meu marido não fez nada! Você, que é advogado, prenda esse xerife! Ele sim é o criminoso. Meu marido, não!Minhas amigas me ajudaram a pegar minha bolsa. Naquele momento, eu estava tão nervosa que mal conseguia assimilar o ocorrido. Romeu olhou para mim e sussurrou:— Não quero que me acompanhe, Anny. Será muito difícil pra mim, ver você naquele lugar. Prepare-se para a imprensa... todos ficarão em cima de você. Passe um tempo na casa da minha mãe. Ficarei mais tranquilo.— Não vou te deixar sozinho. Eu vou, e ponto final.— Que mulher teimosa... — disse ele, tentando disfarçar um sorriso triste.Estava tão nervosa que até a fome tinha passado. Percebi que meu marido estava com medo, mesmo tentando esconder isso, para não me deixar ainda mais abalada. Segurei firme uma de suas mãos. Ele precisava do meu apoio. Eu não entendia o motivo daquela covardia.Peguei o celular de Romeu e procurei o contato do advogado da família. Liguei imediatamente para