CamilleO céu estava cinza quando fui levada, sem ao menos um aviso, para um lugar que eu sabia ser ainda mais distante da liberdade. As paredes do carro escuro refletiam minha angústia, e a cada quilômetro que passava, uma parte de mim ia se quebrando.Eu já não sabia mais onde estava ou para onde estava indo, mas sabia que minha vida, ou o que restava dela, não me pertencia mais.A decisão havia sido tomada. E, por mais que eu implorasse, por mais que minha voz tremesse ao pedir que ele reconsiderasse, Javier parecia ter se distanciado cada vez mais de mim. Seus olhos, que antes estavam cheios de desejo e, talvez, até de algum tipo de carinho, agora estavam vazios, frios e decididos. Ele havia feito sua escolha, e eu não fazia parte dela."Você precisa estar segura, Camille", ele dissera. Aquelas palavras ecoavam em minha mente como um eco distante, sem sentido. Não havia segurança onde eu estava sendo levada, não havia conforto em qualquer lugar fora de seus braços, mesmo que fosse
Camille2 meses depoisA rotina no convento era estranha, mas, ao mesmo tempo, simples e quase confortante.Não havia mais caos, nem o som incessante de passos rápidos nos corredores, nem o som de tiros e explosões. Era o tipo de silêncio que sufocava, mas que, de algum modo, me permitia respirar. A cada dia, eu me levantava cedo, logo ao amanhecer, e seguia o ritmo das freiras.A vida no convento se resumia a uma sucessão de tarefas diárias: orações, cuidados com as crianças, arrumação e limpeza. Nada além disso. Era uma vida sem surpresas, sem interrupções. Uma vida que não me lembrava mais quem eu era antes de ser arrancada de tudo o que amava.Eu tentava me acostumar à ideia de estar ali, de viver com elas, entre as paredes frias do convento, como se isso fosse a minha realidade agora. Mas havia algo que nunca saía de minha mente. O vazio dentro de mim, um vazio profundo que crescia a cada dia, se espalhando por minha alma, me consumindo. O silêncio do convento me deixava com muit
CamilleO convento por fim se tornou um lugar familiar para mim, mas não era um lar.Não havia calor ali, apenas o frio da separação e a solidão que me consumia lentamente. A rotina simples que havia me cercado desde minha chegada não parecia aliviar a dor que eu sentia por dentro. Ao contrário, ela apenas me forçava a encarar a verdade de que estava longe de tudo o que conhecia, longe do homem que amava, e, pior ainda, longe da liberdade que eu tão desesperadamente desejava.Mas havia momentos, pequenos momentos, quando a solidão se tornava insuportável, que a ideia de fugir tomava conta de mim. Eu sabia que não era sensato, sabia que não seria fácil e que, se fosse pega, as consequências seriam ainda mais terríveis. Mas a ideia de correr para longe daquele convento, para longe das regras e da opressão, me trazia uma sensação de alívio que eu não conseguia ignorar.Era uma manhã fria quando a oportunidade, ou a ilusão de uma oportunidade, se apresentou. As freiras haviam me solicitad
CamilleA dor era como uma onda gigantesca, quebrando contra o meu corpo sem piedade.Não havia intervalo para recuperar o fôlego, e o suor que escorria pela minha testa parecia queimar minha pele. Cada contração me deixava mais próxima de um abismo, mas também de um novo começo.Eu sabia que aquele era o momento pelo qual havia esperado nos últimos meses, mas nada poderia ter me preparado para o que estava enfrentando.Minha mente estava em um redemoinho de medo e desespero. Eu implorava entre gemidos e lágrimas para que me levassem ao hospital, para que me tirassem daquele inferno de dor e incerteza. Mas as freiras, com suas expressões sérias e calmas, apenas balançavam a cabeça.— Deus proverá, filha. Ele está conosco — disse Irmã Teresa, segurando minha mão com firmeza. Seu toque, que deveria ser reconfortante, só aumentava minha angústia. Eu queria gritar com ela, queria arrancar minha mão da sua e fugir dali. Mas não havia para onde ir.— Não! Eu não aguento! — gritei, minha voz
CamilleO calor era sufocante, mesmo antes de eu abrir os olhos.O cheiro de fumaça invadiu meu quarto como um intruso indesejado, e por um instante, pensei que estava sonhando. Mas os gritos das freiras e o som de madeira estalando rapidamente arrancaram qualquer ilusão de que aquilo era um pesadelo.Levantei-me de súbito, o coração disparado enquanto meus olhos se ajustavam à escuridão do quarto. A fumaça preenchia o ambiente, densa e sufocante, queimando minha garganta a cada respiração. O único som que se destacava no caos era o choro dos meus bebês, um grito que cortava meu peito como uma lâmina.Corri até o berço improvisado onde eles dormiam lado a lado, pegando-os nos braços com cuidado, embora a urgência quase me fizesse derrubar tudo. Eles estavam assustados, seus pequenos rostos vermelhos e molhados de lágrimas.— Está tudo bem, meus amores. A mamãe está aqui. — Minha voz saiu trêmula, mas tentei manter um tom firme enquanto os embalava com uma mão e usava a outra para agar
JavierA música vibrava tão alto que parecia fazer o chão tremer.Luzes coloridas cortavam o ambiente em movimentos caóticos, iluminando brevemente os rostos animados dos convidados. A nova boate de Juan Carlos era, sem dúvida, extravagante, uma declaração de poder e ostentação que só ele poderia fazer.Estava ali porque não tinha escolha. Ele havia insistido para que eu comparecesse, e, depois do que acontecera com Camille e o bebê, manter o "inimigo" por perto era uma estratégia que eu não podia ignorar.Com um copo de uísque na mão, fiquei encostado no bar, observando tudo com desinteresse. O local estava abarrotado, mas minha mente estava em outro lugar. Eu não conseguia deixar de pensar em Camille.Eu me esforçava para acreditar que a distância era o melhor para ela, mas uma parte de mim gritava que eu havia errado ao deixá-la partir.— Senhor Javier, mais um uísque? — perguntou a bartender com um sorriso educado.— Sim, pode servir. — Minha voz soou mais rude do que eu pretendia
JavierVer Camille diante de mim foi como um soco no estômago, mas um soco que eu não sabia se queria evitar.Ela estava ali, tão real quanto a culpa que me consumia. E então, os bebês. Dois. Não era apenas um — eram dois. Dois pequenos seres que agora dependiam de nós, e eu nem tinha me preparado para essa realidade.Camille estava de pé agora, com um dos bebês nos braços, enquanto o outro repousava em um carrinho ao lado. Ela parecia cansada, exausta até, mas havia uma força em seu olhar que me fez entender que ela não era mais a mesma mulher que eu mandara embora.— Você não vai dizer nada? — A voz dela cortou o silêncio pesado da sala.Eu abri a boca, mas nenhuma palavra saiu.O álcool ainda fazia meu cérebro funcionar lentamente, mas não era só isso. Era o choque, a culpa, o fato de que, por meses, imaginei como seria tê-la de volta, mas nunca me preparei para o que dizer se isso realmente acontecesse.— Camille... — comecei, mas parei, ainda perdido nas palavras. Olhei para o be
CamilleO silêncio na mansão era algo que nunca havia me incomodado tanto quanto naquele momento.Depois de tudo o que aconteceu no convento, ver Javier andando de um lado para o outro, com o celular colado na orelha, me deixava inquieta. Ele estava diferente; mais atento, mais preocupado. Talvez fosse apenas a tensão de saber que agora tinha três vidas sob sua responsabilidade — a minha e as dos gêmeos. Ou talvez fosse algo mais.Sentada na sala, com Sofia adormecida em meus braços, observei Javier falar em um tom baixo e firme com alguém do outro lado da linha. Eu não conseguia ouvir exatamente as palavras, mas era óbvio que ele estava coletando informações sobre o ataque ao convento. A cada telefonema que fazia, parecia mais determinado.Mesmo assim, eu não conseguia evitar o sentimento de incerteza que corroía meu peito.Ele desligou e ficou em silêncio por um momento, os olhos fixos na janela. Alejandro, que estava no carrinho ao meu lado, soltou um pequeno gemido, mas continuou