(POV de Olivia)
— Papai, eu sinto sua falta, você vem me fazer companhia?
A voz doce que vinha do telefone de Ethan perfurou meu coração como se me atravessasse uma lâmina gelada de prata. Eu observei como todo o comportamento do meu companheiro se transformou com as palavras de Emma.
— Claro, princesa. Eu estarei lá. — Ethan respondeu, com a voz gentil e amorosa, em um tom que, em seus últimos dias de vida, Lily tinha implorado para ouvir.
Ele encerrou a ligação e se virou para mim, com os olhos cor de âmbar frios.
— Eu preciso ir. Victoria precisa de mim.
— Nossa filha está morta. — Sussurrei, segurando a Urna Cerimonial de Madeira da Lua contra o peito, com mais força. — Lily se foi e você vai correr para outra criança?
A mandíbula de Ethan se apertou.
— Pare com esse absurdo. Mais tarde a gente resolve isso.
Sem lançar outro olhar na direção da urna que continha as cinzas de sua filha, ele se virou e saiu. Momentos depois, o som do motor de seu carro ganhou vida, confirmando o que eu já sabia: Victoria e Emma viriam sempre em primeiro lugar.
Eu me sentei no chão do quarto de Lily, cercada por seus bichos de pelúcia e livros. Seu cobertor favorito ainda estava dobrado ao pé da cama, esperando por uma dona que nunca mais voltaria.
— Ele nem acreditou em mim. — Sussurrei para a urna. — Seu pai nem acredita que você se foi. Desde que Victoria, trazendo Emma consigo, tinha retornado ao território da Matilha Crista de Prata, nossas vidas tinham mudado drasticamente. A mulher que, anos atrás, havia abandonado Ethan, de repente se tornou sua prioridade novamente.
Lembrei-me de como Lily esperava na janela, todas as noites, na esperança de ver o carro do pai parar na garagem. Quantas vezes eu enxuguei suas lágrimas quando ele ligou para dizer que estava jantando com Victoria e Emma?
— Papai prometeu que viria ao meu recital. — Lily disse uma vez, com as pequenas mãos segurando o colar de Pedra da Lua. — Por que ele sempre escolhe Emma?
Eu não tive respostas naquele dia. E não tinha nenhuma agora.
(POV de Ethan)
O cheiro antisséptico do Abrigo Médico da Matilha Crista de Prata me recebeu enquanto eu passava pelas portas automáticas. Os funcionários abaixaram a cabeça respeitosamente quando eu passei, mas eu mal os notei.
Fui direto para a suíte VIP de Victoria. A porta estava entreaberta, revelando Victoria sentada ao lado da cama de Emma, acariciando o cabelo da filha.
Victoria olhou para cima, e uma expressão de surpresa surgiu em suas feições perfeitas.
— Ethan? O que está fazendo aqui? Eu pensei que você estaria com Lily no aniversário dela.
Emma sentou-se imediatamente, arregalando os olhos.
— Papai!
Victoria franziu a testa para a filha.
— Emma, você ligou para ele? Eu disse que ele estaria ocupado hoje.
O lábio inferior de Emma tremeu.
— É que eu tive um pesadelo com monstros. Eu fiquei com medo, mamãe.
Atravessei o quarto e sentei-me na beira da cama de Emma.
— Está tudo bem, princesa. Estou aqui agora.
Emma jogou os braços em volta do meu pescoço, e seu pequeno corpo tremia em soluços entrecortados de medo.
— Eu senti tanto medo, papai. Os monstros iam me pegar!
Eu a puxei para mais perto, inalando seu cheiro doce.
— Nenhum monstro ousaria chegar perto de você enquanto eu estiver por perto.
Os olhos de Victoria encontraram os meus sobre a cabeça de Emma.
— Mas e o aniversário de Lily? Olivia deve estar chateada.
Eu acenei com a mão, com desdém.
— Podemos comemorar mais tarde. Emma precisa de mim agora.
Victoria sorriu, agradecida, estendendo a mão para apertar a minha.
— Obrigada por encontrar o doador de rim, Ethan. Você salvou a vida da minha filha.
Eu retribuí o sorriso dela, lembrando-me das cordas que tive de puxar para garantir aquele doador.
— Eu faria qualquer coisa por Emma. Você sabe disso.
Os soluços de Emma se acalmaram enquanto ela se aninhava contra o meu peito. Os dedos de Victoria se entrelaçaram com os meus, quentes e familiares.
— Preciso falar com o Dr. Fletcher sobre a recuperação de Emma. — Eu disse, me soltando do abraço, gentilmente. — Por que você não a leva para baixo para tomar um pouco de ar fresco no jardim? O médico disse que caminhar seria bom para sua circulação.
Victoria assentiu, com os olhos cheios de gratidão.
— Vamos esperar por você lá.
(POV de Olivia)
O corredor do lado de fora do consultório do Dr. Fletcher parecia se estender infinitamente. Meus passos ecoaram contra o chão polido do Abrigo Médico quando me aproximei de sua porta, ainda segurando com força a Urna Cerimonial de Madeira da Lua.
Bati uma vez antes de abrir a porta. O Dr. Fletcher ergueu os olhos da mesa, sua expressão mudando de profissional para cautelosa quando me viu.
— Sra. Winters. — Ele disse, levantando-se da cadeira. — Eu não esperava por você.
Ele me chamava de 'Sra. Winters' porque seu Alfa nunca tinha me reconhecido como Luna.
— Eu preciso saber... — Eu disse, com a voz embargada. — Sobre o rim que seria doado para Lily, quem recebeu o órgão no lugar dela?
Os olhos do Dr. Fletcher se arregalaram.
— Não tenho liberdade para discutir as informações de outros pacientes.
Coloquei a urna em sua mesa.
— Esta é minha filha. Ela morreu esperando por esse doador. Um doador que foi misteriosamente redirecionado, no último minuto.
— Eu entendo sua dor...
— Não, você não entende! — Eu bati a palma da mão em sua mesa. — Minha filha está morta porque alguém com mais influência roubou a chance que ela tinha de viver!
Quando ele permaneceu em silêncio, caí de joelhos, o desespero era tamanho que abandonei todo o orgulho. — Por favor, Dr. Fletcher. Estou implorando.
Seu rosto suavizou com simpatia genuína.
— Eu realmente sinto muito por Lily, Olivia. Ela era uma criança doce.
— Então me diga a verdade.
Ele balançou a cabeça negativamente, mas eu percebi a maneira como seus olhos piscavam em direção à porta, na direção das suítes VIP.
— Foi para o filho de um membro de alto escalão da matilha, não foi? — Eu sussurrei.
O Dr. Fletcher ajustou os óculos.
— Não sei nada sobre as atribuições dos órgãos doados. Isso é tratado pela administração.
Mas seus olhos contavam uma história diferente. Toda vez que eu mencionava o doador, eles se moviam, confirmando minhas suspeitas.
— Obrigada pelo seu tempo. — Eu disse, finalmente, levantando-me e pegando a urna de Lily em meus braços, mais uma vez.
Saí do escritório, e a cada passo, minhas suspeitas se tornavam mais certas.
No saguão, eu congelei. Victoria estava perto da entrada com Emma, e ambas se viraram quando me aproximei.
Victoria imediatamente puxou Emma para trás dela.
— Fique longe da minha filha.
— Eu não estava indo a lugar nenhum perto de sua filha. — Eu disse, com a voz fria.
— Não direcione sua raiva para uma criança inocente. — Disse Victoria, em voz alta, chamando a atenção de uma funcionária que estava próxima. — Não é culpa de Emma que Ethan prefira passar tempo com ela.
Antes que eu pudesse responder, Ethan apareceu, e sua expressão se tornou sombria quando me viu.
— O que está acontecendo aqui? — Ele quis saber, posicionando-se imediatamente na frente de Victoria e Emma.
— Nada. — Eu disse, sentindo meu coração doer com a rapidez com que ele ficou do lado delas. — Eu estava indo embora.
— Ela estava olhando para Emma. — Victoria sussurrou, alto o suficiente para que todos ouvissem.
Emma espiou, meio escondida pela perna de Victoria.
— Ela está brava porque papai comemorou meu aniversário em vez do de Lily?
A pergunta inocente me atingiu como um golpe físico, levando-me de volta a um dia, à beira da piscina, quando Emma caiu e imediatamente culpou Lily, alegando que ela a havia empurrado. Ethan acreditou em Emma sem questionar, repreendendo Lily duramente, apesar de suas lágrimas e protestos.
Lily adoeceu naquela noite e, desde então, sua condição piorou rapidamente.
— Eu não a empurrei, mamãe. — Ela sussurrou, com o pequeno corpo queimando de febre. — Por que papai não acredita em mim?
Porém, olhando para a expressão inocente de Emma, algo mudou dentro de mim.
O rosto de Emma franziu na hora, com gemidos perfeitamente cronometrados para chamar a atenção máxima.
— Sinto muito se te deixei triste. — Ela disse, com a voz oscilando habilmente.
Victoria deu um passo à frente, colocando a mão no ombro de Emma.
— Talvez, se Lily tivesse sido mais forte, como Emma, ela poderia ter...
O tapa ecoou pelo saguão, antes mesmo de eu perceber que havia me movido. A cabeça de Victoria estalou para o lado, e uma marca vermelha floresceu em sua bochecha.
Eu não parei no primeiro. Minha mão bateu de novo e de novo, deixando marcas vermelhas brilhantes em seu rosto perfeitamente maquiado.
— OLIVIA! — A voz de Ethan ecoou pelo Abrigo Médico, enquanto ele me puxava para longe. — Você perdeu a cabeça?
Victoria tocou a bochecha avermelhada, e lágrimas brotaram em seus olhos. Emma gemia dramaticamente, agarrando-se à mãe.
O rosto de Ethan se contorceu de fúria, enquanto ele se elevava sobre mim.
— O que diabos há de errado com você?