Quando Lívia voltou a si, estava deitada numa cama de hospital.
Otávio estava sentado ao lado, com o notebook no colo, trabalhando. Como se tivesse sentido o movimento dela, levantou os olhos.
Os olhares se encontraram. Ele soltou um leve suspiro, quase imperceptível, mas a voz continuou fria, firme:
— Gostou de sentir na pele o que é ser humilhada? Espero que isso te sirva de lição. E que não volte a procurar confusão com a Marina.
Lívia virou o rosto para o outro lado, em silêncio.
Uma lágrima escorreu pelo canto do olho, sem nenhum som.
Antes, ela via Otávio como uma salvação.
Mas agora, olhando bem, o que ele fazia com ela não era diferente daquilo que os agressores da faculdade faziam.
Otávio encarou a garota calada na cama.
Por algum motivo, algo nele se contraiu por dentro.
Ela tinha inveja. Atacou Marina. Estava apenas colhendo o que plantou.
Mesmo assim, por que ver aquela lágrima doía tanto?
Foi então que a porta se abriu, e uma enfermeira entrou:
— Sr. Otávio, o ar-condicionado do quarto da Srta. Marina parou de funcionar...
Otávio franziu a testa:
— Se quebrou, manda consertar. Vai me avisar por causa de uma bobagem dessas?
— Já chamamos a manutenção, mas só chega daqui a uma hora. Ela está sentindo muito frio, e o hospital não tem quarto vago pra trocar.
Ao ouvir isso, Otávio se levantou de imediato.
— Que tipo de hospital é esse? Um ar-condicionado leva uma hora pra consertar? A Marina tem saúde frágil, não pode passar frio. Deixa ela vir pra cá. Troca com a Lívia.
— Mas... — A enfermeira hesitou, olhando para a cama.
Lívia tinha alergia severa a pimenta, e havia sido forçada a ingerir uma grande quantidade. Embora estivesse fora de risco imediato, o esôfago e a mucosa do estômago continuavam gravemente lesionados. Qualquer mudança poderia colocar tudo a perder.
Mas Marina só tinha comido um pedaço de bolo de castanha. Depois de algumas injeções antialérgicas, já estava melhorando.
Para Otávio, no entanto, tudo o que Lívia tinha passado parecia não ter importância alguma.
— Tá esperando o quê? Se a Marina pegar um resfriado, esse hospital fecha as portas!
Com a ordem dita nesse tom, a enfermeira não teve escolha.
Logo em seguida, Lívia foi transferida para o quarto de Marina.
Otávio ficou com Marina. Lívia ficou sozinha. Deitada naquela imensa enfermaria vazia, o olhar perdido no teto.
Ao lembrar de tudo o que tinha vivido nos últimos dias, não aguentou mais segurar. As lágrimas começaram a cair, uma atrás da outra.
E, no meio do choro, sentiu um frio repentino.
Levantou os olhos. O ar-condicionado estava ligado, soprando rajadas contínuas de vento gelado.
Naquele instante, tudo fez sentido.
Marina nunca esteve com frio. Nunca houve ar-condicionado quebrado.
Ela tinha inventado tudo aquilo só para trocar de quarto com Lívia, para ver ela ali, sozinha, se contorcendo de frio. Era a maneira dela de descontar a raiva, de se vingar.
A temperatura do quarto foi caindo pouco a pouco. Lívia sentia o frio se infiltrando nos ossos, nos músculos, fazendo até os dentes tremerem.
Tentou chamar ajuda. Mas a garganta estava inchada, não saía som algum.
Esticou a mão para alcançar o botão de emergência. O braço, fraco, não aguentou. Depois de alguns segundos, caiu de novo sobre o lençol.
Tomada pelo desespero, encolheu o corpo o máximo que pôde, tentando preservar o último calor que ainda restava.
Não sabia quanto tempo passou. Mas, enfim, alguém notou que ela estava ali — esquecida num quarto que mais parecia um castigo.
Quando Lívia conseguiu abrir os olhos com esforço, o que viu foi o rosto de Marina, distorcido por um sorriso cruel.
— Lívia, olha só pra você. Está igual a um cão sem dono. Otávio fez tudo isso só pra me ajudar a me vingar de você. Te quebrou até o fundo da alma, e agora todo mundo tem as fotos da sua humilhação. Estão se divertindo às suas custas. Ah, e sabe o melhor? Uma produtora de filmes pornôs entrou em contato comigo. Querem saber se você topa ser a protagonista do próximo filme. Hahahaha... — Marina ria alto enquanto falava.
Quando se cansou, agarrou com força o ponto mais ferido do braço de Lívia e apertou sem piedade.
O sangue espirrou de imediato.
Lívia viu tudo escurecer.
— Agora você deve ter entendido, né? Quem ele ama de verdade. Se tiver um pingo de noção, assume logo que sua mãe era amante. E depois some da minha frente. Só de olhar pra sua cara já me dá enjoo.
O brilho nos olhos de Lívia desapareceu, engolido por um vazio profundo.
Sumir?
Ela sumiria, sim.
Muito em breve, partiria para longe.
E dessa vez, seria pra nunca mais voltar.