Sou Manuela Romanova (II)

Quando saí no portão, Simone estava saindo de dentro de sua casa. Começamos a rir e corremos juntas em direção ao ponto de ônibus.

- Ingressos da 4 Nipes à venda a partir das 7 horas de hoje. – Ela deu um gritinho histérico.

- Então... – comecei, sem saber ao certo como explicar.

- “Então”... – ela me olhou, desconfiada – Não existe desculpa para não comprar. É a 4 Nipes! Nós esperamos por este momento desde os 16 anos, quando aqueles desgraçados entraram num palco pela primeira vez.

- Tem a formatura da Rarlat. E a minha mãe quer fazer uma festa.

Simone riu:

- Como assim Irene quer fazer uma festa? Ela não tem dinheiro nem para se sustentar, como vai fazer uma festa de formatura para a insuportável da Rarlat?

- Eu, não fale assim. Ela é minha irmã.

- Não biológica.

- Sabe que a considero sim a minha irmã.

- Pois não deveria. Ela é horrível com você.

- Simone, imagina se todas as pessoas adotadas não considerassem seus pais e irmãos que não são de sangue como família! Qual seria o sentido disto, então?

- Estas mulheres merecem todo o seu ódio. São pessoas horríveis.

- Poderia ser pior...

- Tipo, você morrer? Ou ter nascido cega? Ou... ter a pele 90% queimada?

Comecei a rir:

- Você é uma pessoa horrível!

- “Eu” sou uma pessoa horrível? – ela arregalou aqueles olhos grandes e escuros – Aquilo que você chama de família que é horrível. Eu sou... justa.

- Talvez eu compre o ingresso. Tenho... como pedir um adiantamento. Ou... quem sabe ganhar o bônus de funcionária do mês.

- Você nunca vai ganhar o bônus. Dominic jamais lhe daria este gostinho, por mais que mereça. A não ser... que esteja disposta a dormir com aquele filho da puta. E só de pensar na cena, juro, tenho vontade de vomitar.

- É a minha irmã caçula que vai se formar, por isto cogitei fazer a festa. Rarlat é melhor que a Carly.

- Caralho, a Rarlat é dissimulada e mentirosa. E a Carly? Bem, ela dormiu com o seu noivo. Você não pode pensar nelas antes de você mesma, entendeu?

- É uma formatura. Um... marco na vidinha dela.

- Ah, não! – ela gritou – isto eu não vou admitir. Esquece o que falei sobre você ser a Cinderela. Você é a Branca de Neve, que foi lá e abriu a porta para a bruxa e ainda comeu a maçã. É muita burrice numa só pessoa!

- Ok, vou comprar o ingresso. – Suspirei, vencida.

- Se não comprar, eu mato você. É a 4 Nipes, amiga. E Fred Hunt é a sua vida.

Trabalhar no Hotel Bali era divertido. Eu gostava de limpeza e organização, trabalhava ao lado da minha melhor amiga e conhecia sempre alguns hóspedes legais... e outros nem tanto. Vez ou outra ganhava gorjetas e aquilo me ajudava bastante. Embora eu fosse uma das melhores funcionárias, pois nunca faltava, chegava sempre no horário e fazia tudo certo, nunca ganhei o bônus de funcionária do mês, porque Dominic, meu ex, não me dava a chance.

Eu já tinha limpado a suíte principal, que havia acabado de desocupar e estava descendo com meu carrinho de produtos de limpeza quando fui puxada para um canto do corredor.

Engoli em seco quando senti as mãos de Dominic sobre mim, seu corpo me imprensando contra a parede.

- O que você quer? – perguntei, de forma firme.

- O que eu quero? O de sempre, claro: você. – Sorriu num tom perverso e debochado.

Dizer que Dominic não era um homem bonito seria uma mentira bem mal contada. Aqueles olhos azuis sempre foram expressivos. Tinha traços marcantes e o nariz era reto, bem desenhado, e os lábios perfeitos e bem delineados. E eu ainda lembrava do gosto que tinham. Atualmente usava uma barba rala e bem amparada, que cobria o queixo e parte das bochechas, o que o deixava com um ar mais sério. Os cabelos eram castanho escuros, levemente ondulados, de comprimento médio e geralmente os usava penteados para trás.

- Me deixe em paz, Dominic. Eu só quero... trabalhar.

- Sabe que você pode ter muitos benefícios ficando comigo, não é mesmo?

- Tipo... ser traída na minha própria cama? – não me contive, arqueando uma sobrancelha enquanto o encarava.

- Manu, esqueça aquilo. Foi um erro.

- Eu já esqueci. Mas ainda assim não vou voltar para você.

- Carly me seduziu.

- E você me traiu.

- Eu ainda quero você.

- Não, você quer só o que não teve de mim.

- Eu duvido que neste tempo todo que passou você não tenha transado com alguém. E ok, eu a perdoo por não ter dado a sua virgindade a mim. E agora... quero levá-la para a cama. E mostrar tudo que você perdeu.

- Nem que fosse o último homem no mundo eu dormiria com você, Dominic.

Ele pôs a mão na minha coxa e foi subindo vagarosamente, de forma libidinosa, enquanto me encarava.

- Me solte, por favor. Ou... vou denunciá-lo ao responsável pelo hotel.

Dominic riu:

- Tudo que vai ganhar com isto é uma bela demissão.

- O que existia entre nós acabou e você sabe disto. – Retirei a mão de forma firme e violenta da minha coxa.

- Tenho uma promoção para oferecer... para alguém que já é funcionário da rede.

Engoli em seco. Só Deus sabia o quanto eu queria ser promovida. E não era pela troca de função e sim pelo valor que viria a mais no meu salário.

- Se ser promovida significa que vou ter que dormir com você, prefiro morrer sendo a camareira e sem aumento de salário. – O encarei.

Vi a fúria em seus olhos azuis e o empurrei antes que a situação piorasse e Dominic me machucasse de alguma forma.

Peguei meu carrinho e abri a primeira porta que encontrei, trancando-a com a chave. Claro que eu sabia que Dominic tinha cópia de todas as chaves, mas para minha sorte ele não tentou entrar.

Escorei-me na porta e fechei os olhos. Meu peito estava apertado e a respiração acelerada. E eu nem sabia se tinha medo ou nojo de Dominic.

A experiência do namoro com ele me serviu para ficar traumatizada e nunca mais me envolver com ninguém. E nem sei se era pela traição ou pelo fato de aquele homem me perseguir todos os dias da minha vida.

Apesar de Dominic ter sido horrível, eu chegava a me culpar algumas vezes. Talvez se tivesse transado com ele, Dominic não teria dormido com Carly. Ao menos foi o que ele alegou logo depois do ocorrido:

- Eu sou homem, porra! Estamos juntos há mais de um ano e você não transou comigo! Carly estava ali, me provocando o tempo todo.

Eu não sei se Dominic foi o primeiro de Carly. O certo é que depois disto ela já tinha dormido com quase metade da cidade. Tudo bem que a cidade era pequena, mas eram homens demais na lista. E ela tinha completado 18 anos há bem pouco tempo.

Peguei meu celular do bolso e fiz o que eu mais queria na vida. Comprei o ingresso para o show da 4 Nipes. O valor era alto, mas valia a pena. Era a minha chance de ver Fred ao vivo. E eu sabia que talvez jamais teria uma oportunidade daquela novamente.

A 4 Nipes era uma das bandas mais famosas do mundo. Viviam em turnês pelos mais diferentes países. E eu curtia todos os integrantes, cada um com seu jeito totalmente diferente do outro, mas que juntos faziam um som simplesmente incrível.

Quando cheguei em casa naquele final de tarde, início de noite, minhas irmãs estavam reunidas com minha mãe na sala. Estavam assistindo televisão e comendo pipocas.

Quando fui abrir uma das portas, mamãe avisou:

- Não bata a porta. Não abra a boca. E não respire. Estamos na melhor parte do filme.

Ela fechou a boca e começou o comercial.

- Que porra! – Carly me olhou – Você traz tanto azar que junto com a sua chegada veio o comercial.

Respirei fundo e estava subindo para tomar um banho quando Rarlat disse:

- Manu, é a minha formatura este mês. Você vai pagar a minha festa, não é mesmo?

A olhei e, sentindo o coração acelerado, avisei, tomando coragem:

- Não vou poder pagar a sua festa, Rarlat.

Minha mãe arregalou os olhos e levantou, gritando:

- Como assim você não vai pagar a festa da sua irmã caçula? Rarlat se esforçou durante anos e agora irá se formar. E está dizendo que sua irmã não merece uma festa?

- Você é mesmo uma ingrata! – Carly me fuzilou com o olhar.

- O que você fez com o seu dinheiro?

- Eu não tenho dinheiro. – Aleguei.

- Mas tem um cartão de crédito para emergências. – Rarlat lembrou.

- Eu usei.

- Usou? E qual foi a emergência? – mamãe quis saber.

- Eu... comprei um ingresso para o show da 4 Nipes.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP