Salvatore estava em seu posto, a postura rígida e os olhos atentos, como sempre. Nada escapava de sua vigilância. A base estava tranquila naquela manhã, e a sua única missão era garantir que tudo funcionasse como deveria. Ele não tinha tempo para distrações. Como soldado, ele foi treinado para focar, para não se deixar levar por sentimentos ou fraquezas. A guerra não perdoa, e ele sabia disso melhor do que ninguém. O treinamento, as batalhas, a disciplina; tudo o moldara. A partir do momento em que vestiu o uniforme, sua vida havia se resumido a uma única missão: cumprir sua função sem vacilos. O conceito de misericórdia nunca fizera parte do seu vocabulário.
Quando ouviu os passos se aproximando, o instinto o alertou antes mesmo de os ver. Nada passava despercebido em seu campo de visão. Ele estava posicionado na entrada da base, o portão imponente à sua frente, seu olhar firme como sempre. Mas algo, naquela manhã, pareceu mexer com o ar. A jovem que se aproximava caminhava com a postura de quem não estava ali por acaso. Havia algo nela que chamou sua atenção, algo que não sabia identificar imediatamente. Seu olhar avaliava cada movimento dela, cada passo, como se fosse uma ameaça em potencial. Salvatore se manteve firme, sem expressar nenhuma emoção. Ela se aproximou mais, até parar diante dele, e ele imediatamente fez o que foi treinado para fazer... barrar a entrada. — Senhorita, qual é o motivo da sua visita? — Salvatore manteve sua voz firme, controlada, sem qualquer interesse. Ela o avaliou por um momento, os olhos curiosos, mas não parecia intimidada. — Sou Olivia Fiore, filha do general Riccardo Fiore. — Ela disse, tentando passar a autoridade de seu nome. — Estou aqui para fazer uma surpresa para o meu pai. Ele não sabe que voltei da Rússia. Salvatore a observou atentamente, mantendo sua expressão impassível. Olivia Fiore. O nome não significava nada para ele naquele momento. Ela poderia ser quem fosse, mas isso não mudava seu dever. Ele tinha um trabalho a fazer, e a missão estava clara. — Senhorita, sem autorização formal, não posso permitir sua entrada. O general Fiore está ocupado no momento. — Respondeu ele, sem mudar a postura. Olivia parecia surpresa por um instante, mas rapidamente recuperou a compostura. — Eu entendo as regras, mas meu pai me autorizou a entrar. Ele não vai gostar disso. — disse ela visivelmente irritada. Salvatore observou-a atentamente, pegando seu celular, e rapidamente, uma voz soou do outro lado. Era o general Riccardo, ele continuava neutro, enquanto ouvia Olivia, pedindo para que o general liberasse sua entrada. Quando o general liberou sua entrada, Salvatore apenas fez um gesto afirmativo, sem questionar. Ele sabia que, na hierarquia, não havia espaço para resistência. Quando a porta se fechou atrás de Olivia, ele permaneceu de pé, ainda com a mesma postura rígida, como uma estátua que não se movia, não se deixava afetar. — A senhorita pode seguir pelo corredor, primeira porta à direita, é o escritório do general. — Salvatore disse, sem demonstrar qualquer emoção em suas palavras. Apenas observou Olivia se dirigir até o escritório de Riccardo, a vendo sumir virando o corredor. Algum tempo depois, Salvatore se dirigia até o escritório do general para informá-lo de que precisavam de sua presença na sala de comando. O general se despediu de Olivia e pediu para que Salvatore esperasse. Salvatore se manteve de pé, perto da porta, rígido, enquanto aguardava o retorno do general. — Não tem muita conversa para um soldado, não? — Disse Olivia, forçando um sorriso. Salvatore a observou seriamente e apenas respondeu com sua voz firme e tranquila. — Conversa não é parte do meu trabalho, senhorita. — Ele disse sem desviar o olhar. — Sempre tão rígido? Deve ser cansativo manter essa postura o tempo todo. — Olivia comentou, cruzando os braços. — Disciplina não é cansativa, é um hábito. — Respondeu ele, seco. — E você tem algum outro hábito além da disciplina? — Ela perguntou, com um tom levemente provocativo. Salvatore manteve-se impassível por um instante, antes de responder. — Cumprir meu dever. Esse é o único hábito que importa. Quando Olivia ia fazer outra pergunta a Salvatore, o general Riccardo entrou na sala, se despediu da filha e pediu para Salvatore acompanhá-la até a saída da base militar. Salvatore abriu a porta, e esticou o braço indicando a saída. — Até logo, senhorita Fiore. — Disse, com um tom suave, mas ao mesmo tempo, a frieza em sua voz se fazia presente. — Até logo, Salvatore. —Ela respondeu, após ficar algum tempo observando Salvatore, como se quisesse lhe fazer mais perguntas. Salvatore estava focado, sua postura imperturbável enquanto acompanhava Olivia pelos corredores da base. Não importava quem ela fosse ou o que estivesse acontecendo. Ele foi treinado para lidar com qualquer situação com um único propósito.. cumprir sua função. E naquele momento, sua função era garantir que ela deixasse a base sem causar nenhum problema, sem complicações. Ele caminhava ao lado dela, mantendo o ritmo rápido, sem sequer desviar os olhos da frente. A base era um labirinto de corredores e áreas de segurança, e Salvatore conhecia cada centímetro dali. Não havia falhas, não havia margem para distrações. O silêncio entre eles era denso, mas ele não se importava com isso. A guerra o ensinara a viver na solidão, a trabalhar sem qualquer forma de interação desnecessária. Olivia parecia querer quebrar aquele silêncio. Ela lançou um olhar para ele, mas ele não se incomodou em olhar de volta. O que ela pudesse pensar ou sentir não interessava. Seu objetivo era simples...assegurar que ela seguisse o caminho até a saída da base e então, finalmente, deixá-la partir. — Está tudo bem, eu sei onde estou indo — ela disse, tentando, talvez, aliviar a tensão que pairava no ar. Salvatore manteve seu ritmo firme. A resposta que ele deu foi breve, objetiva, como sempre. — Não posso permitir que você se desvie do caminho. Ele não tinha intenção de ser rude, mas sua maneira de ser não permitia mais do que isso. Ele não era o tipo de homem que se deixava influenciar por palavras ou gestos. Seu trabalho, sua missão, sempre foram sua prioridade. A guerra não deixou espaço para gentilezas. Enquanto caminhavam em direção à saída, Olivia não parecia muito interessada em conversar, mas suas tentativas de quebrar o gelo o fazia perceber que ela, de alguma forma, queria desafiar seu comportamento rígido. Ele notou o jeito como ela olhava para ele de vez em quando, como se tentasse decifrá-lo. Mas isso era irrelevante para ele. A chegada à saída da base foi silenciosa, quase como uma conclusão inevitável do que já estava claro para ambos. Não havia mais nada a ser dito. A porta pesada da base se abriu lentamente, e Salvatore parou ao lado dela, observando o exterior com a mesma calma de sempre. O ambiente lá fora era vasto, imponente, e ele sabia que o mundo além da base era um lugar sem misericórdia, onde o jogo de poder e sobrevivência se jogava em uma escala muito maior. Olivia deu um último olhar para ele, talvez buscando alguma reação, talvez esperando uma gentileza que ele não seria capaz de oferecer. Mas Salvatore permaneceu firme, impassível. Ele não precisava de mais nada. — Até logo — disse ela, novamente, e sua voz tinha uma nota que ele não soubera identificar. Não importava. Ele apenas assentiu, a mesma expressão séria de sempre. Ela então se afastou, e o som dos seus passos foi se afastando até desaparecer. Ele ficou ali, observando a porta se fechar atrás dela, voltando para o seu posto, onde nada mais importava além da próxima tarefa que o aguardava. Para ele, mais uma missão cumprida, sem espaço para emoções ou arrependimentos. Porque, para Salvatore, a guerra não dá espaço para fraquezas. Nunca deu.Olivia entrou em casa com a cabeça fervilhando de pensamentos. Ela mal havia dado dois passos na entrada quando parou, o olhar perdido, como se estivesse tentando entender o que acabara de acontecer. A porta se fechou atrás dela, mas o som do fechamento parecia distante, abafado. Tudo o que ela podia ouvir era o ritmo acelerado do seu próprio coração, o eco das palavras que não saíram da sua boca, o silêncio pesado de um encontro que parecia ter deixado marcas que ela não conseguia apagar. Salvatore. O nome dele, o rosto dele, o modo como ele a olhou… tudo parecia girar em sua mente de forma incontrolável. Ela tirou os sapatos com um movimento automático, ainda sem desviar os olhos da parede à sua frente. Seus pensamentos estavam longe, muito longe, em um lugar onde ele estava constantemente presente. "Por que ele me deixou tão... confusa?" Olivia se sentou no sofá, mas a sensação de que a base, o portão, aquele homem sério e impassível, ainda estavam ali, a observando, não desapa
Olivia acordou no dia seguinte sentindo o peso de uma noite mal dormida. Seu corpo estava cansado, sua mente exausta. As palavras de Salvatore ecoavam em sua cabeça como um mantra cruel e imutável: "Eu nunca amarei ninguém. Nunca me apaixonarei." Ela rolou na cama, tentando afastar o aperto no peito, mas era inútil. Cada palavra dita por ele na noite anterior perfurava seu coração como lâminas afiadas. Ela sabia que ele não era um homem fácil, que carregava seus próprios fantasmas e cicatrizes. Mas ouvir aquilo da boca dele, com uma frieza quase cruel, foi mais doloroso do que imaginava. Mas por que aquilo a afetava tanto? Olivia não deveria sentir nada disso por ele. Conhecia Salvatore há poucos dias, ele era um completo desconhecido. Ainda assim, algo nele a puxava para mais perto, a fazia questionar seus próprios sentimentos e a lógica que sempre seguiu. Respirou fundo, sentindo a brisa da manhã entrar pela janela entreaberta. O sol já iluminava o quarto, mas para Olivia, tudo p
Olivia caminhava pelo pátio da base militar quando avistou Salvatore. Ele estava encostado em uma pilastra, os braços cruzados, observando os soldados em treinamento. Seu olhar era frio e distante, como sempre, mas havia algo na forma como sua mandíbula estava travada que denunciava um resquício de tensão. Respirando fundo, ela se aproximou determinada. — Salvatore, precisamos conversar. Ele virou o rosto lentamente para ela, expressão impassível, mas os olhos escuros brilharam com um relance de irritação. — Não temos nada para conversar, senhorita. — Você sempre diz isso, mas— — Porque é a verdade. Agora volte para dentro. A rispidez no tom dele fez algo dentro dela se contrair, mas Olivia manteve-se firme, cruzando os braços. — Por que você age assim? O que está tentando esconder? Ele riu de leve, sem humor, e desviou o olhar para o campo de treinamento. — Nada. Apenas não quero problemas. — Problemas? — Olivia estreitou os olhos, estudando cada detalhe da expressão dele.
Salvatore entrou na sala do general Riccardo, batendo continência. — Senhor, pediu para me ver? O general o encarou com olhar analítico e assentiu. — Sim, Salvatore. Preciso discutir a nova leva de recrutas. Alguns dos superiores estão preocupados com o desempenho dos mais jovens. Salvatore manteve a postura rígida. — Sim, senhor. Tenho observado o progresso deles e há alguns que precisam de treinamento intensivo. Especialmente em táticas de combate corpo a corpo. O general cruzou os braços, refletindo. — E quanto à disciplina deles? — Ainda precisa ser reforçada, mas estamos trabalhando nisso. O senhor pode confiar que até o final do mês teremos um esquadrão mais preparado. Riccardo assentiu, satisfeito. — Ótimo. Continue assim. Preciso de soldados fortes e leais. Salvatore fez uma breve continência. — Sim, senhor. O general o observou por um instante antes de dispensá-lo. Salvatore saiu da sala, ciente de que seu foco deveria estar no trabalho, não em distrações desnece
Olivia observou Salvatore se afastar com passos firmes e postura impecável. Ele não olhou para trás, não hesitou, apenas seguiu seu caminho como se nada além de sua rotina importasse. Ela sentiu uma mistura de frustração e curiosidade. Desde que chegou à base, percebeu que ele era diferente dos outros soldados. Não era apenas rígido ou disciplinado – Salvatore era um homem que se recusava a permitir qualquer tipo de proximidade. Mas Olivia não era o tipo que desistia fácil. Respirou fundo e acelerou o passo, saindo do pátio de treinamento e seguindo na mesma direção que ele. Não tinha certeza do que esperava com aquilo. Talvez apenas uma conversa, uma troca de palavras que não fosse tão distante e fria. Salvatore estava a poucos metros à frente quando ela chamou seu nome. — Salvatore. Foi a segunda vez que o chamou assim, sem formalidades. A palavra saiu naturalmente, mas carregada de intenção. Ele parou no mesmo instante. Por um momento, Olivia pensou que ele não fosse s
O despertador tocou suave, mas Olivia já estava com os olhos abertos antes mesmo do primeiro som ecoar. A luz da manhã invadia o quarto pelas frestas da cortina, e um leve vento balançava as folhas da árvore do lado de fora da janela. Ela se sentou na cama, prendeu o cabelo com uma presilha simples e bocejou baixinho. Ainda sonolenta, mas com uma estranha sensação de propósito naquela manhã. Levantou-se e seguiu até a cozinha em passos lentos, de meias. O chão frio contrastava com o calor gostoso do sol batendo pelas janelas. — Acho que vou fazer algo pro papà comer... — murmurou para si mesma, abrindo a geladeira. — Ele deve estar atolado de trabalho na base, como sempre. Separou os ingredientes com cuidado: pão italiano, queijo, presunto, tomate e folhas frescas de manjericão. Enquanto montava os sanduíches, pensou em como o pai sempre esquecia de comer quando estava imerso nos relatórios ou inspecionando os pelotões. Com os sanduíches prontos, empacotou tudo com cuidado,
Salvatore permaneceu parado por longos segundos, os olhos fixos na sacola como se esperasse que ela desaparecesse. Seu peito ainda subia e descia com o esforço do treino, mas agora, era como se o esforço maior estivesse dentro dele. O que ela queria com aquilo? Aquilo era um gesto simples, sim. Comida. Um agrado qualquer. Mas vindo dela, tinha um peso diferente. Tinha intenção. Tinha presença. E isso... isso o incomodava. Com a mandíbula travada, ele caminhou até o banco de concreto ao lado da parede do pátio e se sentou. Tirou as ataduras das mãos com movimentos lentos, tentando ignorar o que sentia. Quando abriu a sacola, sentiu o aroma do café, do pão fresco, do tiramisù ainda frio — e o estômago roncou antes que ele pudesse se conter. Resistência era seu forte. Mas nem sempre se tratava de não ceder à fome. Ele comeu em silêncio, o olhar distante. Não era só a comida que aquecia. Era a lembrança dela o preparando, dela decidindo levá-lo também em mente, quando poderia ter fei
Olivia caminhava de um lado para o outro em seu quarto, os braços cruzados e o maxilar travado de tanto pensar. Desde que saiu da base naquela manhã, depois de deixar a sacola nas mãos de Salvatore e ouvir aquele “obrigado” tão seco, ela não conseguia parar de se perguntar se tinha feito a coisa certa. Ele tinha agradecido, sim. Mas não como alguém que recebia um agrado. Foi quase como se as palavras tivessem saído com dor. Como se engolir aquele simples gesto tivesse custado algo precioso para ele. E isso só deixava tudo mais intrigante. Olivia suspirou, jogando-se de costas na cama. Seu quarto estava em silêncio, e ela odiava aquilo. O silêncio fazia com que os pensamentos tomassem conta — especialmente os que envolviam um certo soldado de rosto sério, olhar tenso e autocontrole em excesso. Ela pensava no momento exato em que ele segurou a sacola. A forma como demorou a reagir. Como se aquele gesto tão simples fosse, de algum modo, perigoso. "Ele tem medo de quê? Da comida o