POV Miguel Carrascal
Eu franzi a testa, meu corpo enrijecendo visivelmente. À minha frente, a garota dos óculos gigantes, vestida estranhamente, estava, indiscutivelmente, apontando o dedo na minha direção.
Suas palavras martelavam na minha cabeça: “Eu quero aquele homem. Eu pago para ele ser meu namorado falso por um mês.”
— Perdão — enfiei o celular no bolso e caminhei na direção dela, olhando ao redor para ter certeza de que ela não se referia a mais ninguém no lounge. — Você está me confundindo.
Os olhos de Gregory caíram imediatamente sobre mim. Ele gaguejou, na intenção de desfazer o mal-entendido, mas foi interrompido pelas palavras impacientes da garota.
— Entenda, eu não tenho muito tempo. O homem que me humilhou publicamente vai noivar amanhã. Eu disse que levaria o meu namorado rico. Eu não posso chegar de mãos vazias.
Essa garota estava achando que eu era um objeto para ela carregar?
— Senhorita, acho que há um engano — meus olhos cinzas se estreitaram sobre ela. Tentei dar um passo à frente, mas Gregory colocou a mão na minha frente, me bloqueando.
— Você quer que ele a acompanhe neste projeto? — Gregory perguntou, voltando a apontar para mim.
— Sim, eu o quero. Ele é bonito e parece muito rico. Não tem como dar errado.
— Então você terá — as palavras de Gregory me pegaram totalmente desprevenido. Agarrei o braço dele, exigindo uma explicação silenciosa, mas ele continuou, como se eu não estivesse ali. — O investimento inicial é de quinze mil dólares para esta parceria de um mês.
— Você está me comparando a uma mercadoria? — Eu sussurrei, minha fúria contida me fazendo ranger os dentes.
A garota sorriu, abrindo a bolsa e entregando um cartão de crédito a Gregory. Ele continuou me ignorando, pegando o cartão e efetuando o pagamento. Meus olhos se arregalaram quando percebi o que meu amigo acabara de fazer.
— Preciso que você esteja amanhã, em frente à universidade. Por favor, esteja bem-vestido e com um bom veículo. Eu disse que você era rico, então você precisa parecer rico, entendeu?
Quanta arrogância. O que ela pensava que eu era? A pele do meu pescoço queimou com irritação. Ela falava sem parar, atropelando as palavras, nervosa. Por um momento, a paixão desesperada em sua voz foi encantadora. Até eu me lembrar da confusão em que eu estava metido. Eu não sabia o nome dela, e nem precisava.
Eu precisava desfazer esse mal-entendido.
Ela ajeitou os óculos que caíam constantemente do seu rosto após deixar o endereço onde eu deveria encontrá-la sobre o balcão. Lançou um último olhar para mim; seus olhos estavam tristes, desesperados, mas em seguida um brilho surgiu neles, como se tivesse acabado de encontrar a solução para um problema de vida ou morte.
Abri os lábios para explicar quem eu era, quando ela girou os pés e saiu correndo. Fiquei com os punhos fechados, observando a garota desaparecer. Eu não acredito que me coloquei nessa situação e não consegui desfazer o problema.
— O que diabos aconteceu aqui?
Perguntei, e Gregory não conseguiu abafar o sorriso. Ele caminhou até mim, retirando o crachá de “Recepcionista”.
— Aquela garota te contratou para ser o namorado falso dela por um mês, Miguel.
Gregory é meu melhor amigo e, sim, o dono deste “lounge” que ele usa como fachada para a agência. Venho aqui quase diariamente. Conversar com ele é a única coisa que tem me ajudado a tentar esquecer o que aconteceu nos últimos trinta dias.
— Eu não sou seu funcionário, nem um acompanhante de luxo. Chame essa garota de volta e desfaça o negócio.
— Tarde demais, o dinheiro já está na minha conta. E a taxa é irrevogável.
Aquilo só podia ser uma brincadeira de mau gosto. Eu sabia que ele não estava blefando.
— Eu não vou ajudar aquela garota a se vingar de ninguém.
— Eu vou dividir os quinze mil dólares com você.
— Você parece que esqueceu quem sou — balancei a cabeça, incrédulo. — Acha que preciso desse dinheiro? Quinze mil dólares não pagam nem os sapatos que estou usando.
— Eu sei disso — Gregory concordou, sério. — Mas pensei que seria bom para você sair de casa e ir a uma festa. Um mês já se passou, Miguel. Você não pode viver o resto da vida se culpando.
— Eu deveria decidir isso, e não você — minha voz soou autoritária, carregada de dor. — Pode esquecer esse negócio. Eu não vou aparecer na universidade para vê-la.
— Ela tem vinte e seis anos e está no último semestre da faculdade de direito, Roberta. Você prestou atenção em tudo o que ela disse? — Gregory zombou, me provocando.
— Eu não quero saber nada sobre essa mulher — bufei, interrompendo suas palavras. — Arrume um dos seus funcionários para ir no meu lugar.
Balancei a cabeça, as palmas das mãos úmidas. Girei a aliança no meu dedo, distraído. A expressão de Gregory se fechou.
— Você precisa seguir sua vida, Miguel. Amanda ia querer isso.
— Seguir a vida saindo com uma estranha e mentindo para todo mundo? — A dor estava gravada em minha expressão de angústia. — Eu não deveria ter vindo aqui.
Afastei-me sem dizer mais nada, um nó apertando minha garganta. Percebi que a garota não estava mais por perto e me senti um idiota por não ir atrás dela e desfazer a confusão.
Enquanto ligava o veículo, decidi esquecer tudo. A agência era de Gregory, e ele que resolvesse seus problemas. Mas no caminho para casa, lembrei dos olhos tristes daquela mulher e do quanto ela parecia desesperada.
Pensar nisso me encheu de raiva, porque eu já estava envolvido.
Que se dane! Foi um dia longo. Enfiei o papel com o endereço da universidade no bolso que peguei no balcão sem Gregory perceber e decidi que pensaria sobre isso depois.