Caelum se aproximou de nós com passos firmes, a postura imponente de um rei que sabia exatamente como lidar com qualquer situação. Seus olhos estavam fixos em Lis e nos lobos que a acompanhavam, avaliando-os, mas também deixando claro que não estava nem um pouco incomodado com a presença deles.Ele sempre soubera como manter a autoridade, como proteger o seu território sem demonstrar fraqueza. E ali, diante de mim, o vi mais uma vez, assumindo seu papel com a mesma confiança que o fizera ser o líder do Clã Eclipse.— Bem-vindos ao nosso clã — disse ele, sua voz grave, mas convidativa. — Vejo que lutaram ao nosso lado e por isso, merecem nossa hospitalidade. Vamos fazer com que cuidem de seus feridos. Podemos acomodá-los por uma noite. A segurança de todos é nossa prioridade.Lis o observou em silêncio, sua expressão impassível, enquanto seus lobos pareciam relaxar à medida que a tensão na atmosfera começava a diminuir. A ideia de se refugiar no Clã Eclipse parecia ser um alívio para t
A noite envolveu a Matilha Eclipse em um silêncio pesado, quebrado apenas pelo murmúrio do vento entre as árvores e pelo ocasional uivo distante de um lobo solitário. O ataque das criaturas ancestrais havia deixado cicatrizes não apenas na terra, mas também na alma de todos ali. O cheiro de sangue ainda impregnava o ar, misturado ao aroma das ervas curativas usadas para tratar os feridos. Depois de garantir que todos estavam seguros e que Lis e seus guerreiros haviam sido acomodados, eu finalmente pude voltar para Caelum. Ele estava sentado em um dos bancos de pedra dentro de nossa tenda, sua expressão impassível, mas eu sabia que ele estava cansado. Seu ombro esquerdo estava ferido, um corte profundo atravessando a pele desde a clavícula até o início do peito. — Você deveria ter procurado uma curandeira antes de ficar brincando de líder durão — murmurei, pegando um pano limpo e um frasco de tintura de ervas. Caelum ergueu os olhos para mim, um brilho de diversão neles. — Eu e
O som das risadas e da música se espalhava pela clareira, um contraste marcante com a tensão e a destruição que havíamos enfrentado há tão pouco tempo. Os guerreiros do Clã Eclipse, junto dos novos aliados de Lis, estavam reunidos ao redor das fogueiras que lançavam um brilho quente na noite escura. O aroma de carne assada e ervas se misturava ao ar, e pela primeira vez em dias, o peso da guerra parecia um pouco mais leve. Caminhei entre os guerreiros, observando a alegria genuína estampada nos rostos de cada um. As crianças corriam descalças entre os adultos, suas risadas se misturando ao crepitar da madeira queimando. Alguns anciões contavam histórias antigas sobre batalhas passadas, enquanto os mais jovens brindavam à vitória. Eu me sentia cansada, exausta até, mas não quis me afastar. Precisava ver com meus próprios olhos que meu povo estava bem. — Não está aproveitando a comemoração? — a voz grave de Caelum soou ao meu lado, tirando-me dos pensamentos. Virei-me para ele e enco
Os meses passaram como folhas levadas pelo vento, rápidos e imprevisíveis. A paz temporária que nosso clã conquistou nos permitiu respirar, mas a ameaça ainda pairava sobre nós como uma tempestade prestes a desabar. Lis tornou-se minha mentora, uma guia nesse novo mundo que se desenrolava dentro de mim. Desde que a conheci, algo em seu olhar me dizia que ela via além do que qualquer um poderia enxergar. Talvez fosse sua conexão com a magia, talvez fosse seu olhar experiente, ou talvez ela simplesmente compreendesse o fardo de carregar um poder que não pedimos para ter. — De novo — sua voz soou firme, mas paciente. Eu estava no meio da clareira, os pés descalços tocando a terra fria, o corpo coberto de suor. Lis me treinava com disciplina, moldando minha magia como se ela fosse uma extensão de mim, não um poder descontrolado esperando para escapar. Fechei os olhos e tentei sentir o fluxo da energia ao meu redor. O vento sussurrou nos meus ouvidos, o cheiro das árvores e da terr
O som do vento cortando pelas folhas altas era quase meditativo. O ar cheirava a terra úmida e flores silvestres, com o toque sutil de uma tempestade que ainda se formava no horizonte. Estávamos na clareira mais afastada do Clã, onde o silêncio reinava e a natureza parecia respirar junto conosco.Lis estava à minha frente, com os cabelos prateados presos em uma trança simples e os olhos fixos nos meus. Ela segurava um bastão de madeira negra que usava como canalizador, embora eu soubesse que ela não precisava daquilo. Era mais simbólico. Uma lembrança de que até os mais poderosos às vezes precisavam de raízes para se manterem firmes.— De novo — disse ela, firme, mas paciente.Eu respirei fundo, sentindo o peso do cansaço acumulado. A gravidez avançava, e meu corpo começava a dar sinais claros de que não podia manter o mesmo ritmo de antes. Mas havia uma urgência latente em tudo. O tempo corria, e o mundo não esperaria por mim.— Está tudo bem se desacelerar — Lis comentou, como se ad
O frio da manhã beirava o gélido, mesmo com o céu limpo e o sol já subindo preguiçosamente no horizonte. Eu estava na varanda da mansão, envolta em um manto grosso, com as mãos pousadas sobre meu ventre arredondado, sentindo os primeiros raios de luz aquecerem minha pele. A gravidez já avançava o suficiente para que os movimentos do bebê fossem constantes, e às vezes, imprevisíveis.Mas hoje... havia algo diferente no ar.Freiren se revirava inquieta dentro de mim, os sentidos aguçados, como se uma presença invisível se arrastasse pelas sombras da floresta. Ela ainda não dizia nada — não com palavras — mas havia uma tensão no modo como rosnava em silêncio, como se esperasse algo surgir do nada.“Fique alerta”, ela murmurou por fim. “A magia se mexe em lugares que não vemos.”Respirei fundo, tentando me concentrar, mas algo em mim se agitou. Não era exatamente medo. Era uma sensação antiga, instintiva, que crescia com o mesmo ritmo que minha ligação com a terra, com a magia, e com o fi
O tempo passou com a leveza de um sopro e o peso de uma tempestade. Cada dia que nascia trazia novas descobertas, não apenas sobre a magia que fluía em mim, mas sobre o corpo que mudava a cada fase da lua. Já não era apenas eu. Nunca mais seria. A vida dentro de mim crescia com uma força ancestral, preenchendo todos os espaços da minha alma — e também exigindo de mim uma coragem que eu nunca soube que tinha. Lis foi incansável. Mesmo com minha barriga avançada e as costas reclamando a cada passo, ela me treinava com firmeza, como se soubesse que o tempo estava contra nós. E talvez estivesse. O feiticeiro ainda espreitava nas sombras. Sentíamos sua presença, mesmo quando os ataques cessavam, como se ele apenas aguardasse o momento certo para se erguer com fúria renovada. Mas ao lado de Lis, e com Caelum sempre próximo, eu aprendi a usar a magia não apenas como defesa — mas como extensão de quem eu era. — Concentre sua energia aqui, Izzy — disse Lis, tocando meu peito suavemente. —
A primeira dor veio como uma onda surda, pesada e profunda, arrancando-me o ar por um momento. Eu estava no jardim dos fundos da mansão, colhendo folhas de hortelã com Lis para o chá da noite, quando ela me olhou de lado, olhos estreitados como se ouvisse algo que o mundo ainda não captava.— Sentiu?Assenti, levando a mão à barriga. A dor já havia passado, como se nunca tivesse estado ali, mas deixou para trás um calor estranho, uma promessa silenciosa. Meus dedos apertaram levemente a barriga arredondada e senti o bebê se mover — não como das outras vezes. Era diferente. Mais forte. Quase impaciente.Lis largou as folhas.— Está começando.Minha garganta secou.— Tem certeza?Ela me encarou com a calma que só os séculos trazem.— Eu conheço esse olhar. E conheço essa energia. Está na hora, Izzy.A notícia correu como fogo entre as árvores. Quando cheguei ao quarto, Caelum já estava lá, olhos arregalados, o rosto dividido entre ansiedade e amor bruto.— Agora? — ele perguntou, como s