Narrador
Um pesadelo estava acontecendo. Se ela tinha medo que Otávio soubesse da proximidade dela com Christofer, agora ele tinha visto tudo logo de uma vez.
A verdade inegável exposta diante dos seus olhos.
Como negar isso agora?
Luciana não aguentou aquela situação bizarra. Otávio a viu aos beijos com Christofer, e isso não poderia ser facilmente explicado. A única pessoa com quem ela não queria ser vista por seu amado foi justamente a que ela tinha beijado.
Não seria fácil negar o óbvio.
Luciana não conseguiu suportar. A pressão dela, já normalmente baixa, desceu a níveis perigosos e ela simplesmente sentiu um formigamento violento em seu corpo inteiro. Ela sentiu que ia desmaiar, mas não conseguiu pedir ajuda. Logo, sua visão escureceu, e seu corpo tombou.
— Luciana! — Christofer tomou um susto com o desmaio, mas conseguiu evitar que ela batesse a cabeça no chão estendendo o braço. Com a garota inconsciente nos braços, ele olhou para o médico à sua frente. — O que está acontecendo?!
Otávio estranhou um pouco e fez algumas verificações simples no corpo dela. Checou seus sinais vitais e pediu:
— Coloque ela no sofá.
Christofer a carregou até lá morrendo de preocupação, e segurou a mão dela.
Então, ele viu que Otávio estava olhando com muita curiosidade a proximidade deles, e soltou a mão dela. Luciana ia enlouquecer se soubesse que Otávio estava os vendo de mãos dadas.
— Ela teve uma queda de pressão. — Otávio murmurou, um pouco desconfiado, e se sentou na poltrona para observar. — Dê um pouco de refrigerante a ela.
Christofer tinha coca-cola na geladeira por sorte. Ele sabia que Luciana tinha um motivo para sempre ter uma garrafa guardada. Então colocou um pouco num copo e deu nos lábios dela com uma colher. Otávio achou bem engraçado o desespero de seu irmão, e não pode deixar de conspirar.
Luciana estava ainda numa penumbra de inconsciência, mas molhou os lábios no líquido escuro. Ela ia recobrar a consciência em breve.
— Ela vai melhorar. — Otávio murmurou, observando com bastante atenção as expressões e os gestos do irmão.
Christofer suspirou, olhou bem para o rosto inocente de Luciana, pensou no motivo que a fez desmaiar, e disse:
— Não é o que está pensando.
— E o que eu estou pensando? — Otávio levantou uma sobrancelha.
— Luciana e eu somos apenas amigos. — O mais novo admitiu. Otávio conhecia o irmão, e achou estranho ele falar aquilo. Na verdade, estava tudo muito estranho desde que chegou.
— E o que me importa? — O mais velho indagou. — Não me interessa onde meu irmãozinho deposita seu esperma.
Christofer ficou irritado com o jeito que o irmão falou. Primeiro por ter insinuado que o mais novo era assim tão fútil, e segundo por ter se referido a Luciana, uma pessoa apaixonada por Otávio, por aquele termo desrespeitoso.
Enquanto bufava, Christofer viu que Otávio foi até a geladeira dele para procurar alguma bebida.
— Você pode não se importar, mas… Para ela importa. — Christofer falou, nervoso.
Otávio analisou bastante a situação e as palavras do irmão, e entendeu um pouco do que estava acontecendo. Se Christofer fazia tanta questão de apontar o quanto não tinha a ver com aquela garota, era porque queria deixar o caminho limpo.
Não era do feitio de Christofer fazer esse tipo de coisa. Ele tinha intenção de virar algum tipo de cupido? Não ia acontecer.
— Essa garota não me interessa. — Otávio deu de ombros e pegou uma garrafa de água na geladeira. — E nunca vai interessar.
Mais uma vez, Christofer se irritou. Otávio tinha muito desprezo por Luciana e não fazia questão de esconder, e o mais novo temia que ela ouvisse aquelas palavras, não queria que ela se magoasse.
— Sai daqui, Otávio. — Christofer disse, inexpressivo. Foi um aviso.
— Vim pegar a chave reserva do seu carro. Você pediu para trocarmos tão rapidamente que…
— Eu mandei sair daqui! — Christofer elevou a voz. Por mais autocontrole que tivesse, com seu irmão ele facilmente perdia a paciência.
— Calma, maninho. — Otávio elevou as mãos em um gesto de rendição, e depois olhou por sobre o ombro de Christofer. Algo tinha acontecido no sofá: alguém estava ouvindo a conversa.
Acompanhando o olhar do irmão, Christofer viu que Luciana estava acordada. Ela estava sentada no sofá dele, bem consciente e seus olhos estavam arregalados.
Ela ouviu tudo?
A atitude seguinte poderia responder a essa pergunta. Luciana se levantou e saiu correndo como se o prédio estivesse em chamas.
— Você vai me pagar por isso. — Christofer ameaçou Otávio com o dedo em riste.
Otávio não podia dizer que não tinha entendido o que estava acontecendo ali, mas ele precisava de mais detalhes.
***
Luciana entrou no elevador e conseguiu fechá-lo antes que Christofer pudesse entrar. Então, ele acionou o botão e a porta se abriu novamente. Luciana tinha se esquecido deste recurso. O rapaz alto e loiro entrou no elevador com ela, num silêncio amargo.
Luciana olhava para ele, incrédula. Ela estava irritada por ter sido alcançada tão facilmente.
— Sai daqui, Chris. — Ela virou-se de costas para ele.
Christofer sabia que quando as pessoas não olhavam para ele, não viam sua beleza e ele perdia 80% do seu poder de convencimento. Ainda lhe restava sua voz poderosa e irresistível como recurso para convencê-la.
— Luciana, volte para lá. Você acabou de desmaiar, não pode correr e nem fugir desse jeito. Eu vou expulsar Otávio, fique comigo.
Ela ainda estava em choque, nem conseguia chorar. Só olhou para ele com dor e aceitação.
— Você sabia? — Ela indagou e liberou uma lágrima ao piscar. — Sabia que ele nunca ia se interessar por mim?
— Não… — A voz de Christofer foi bem baixa, mas a resposta foi rápida.
— Sabia, sim. Você me disse no primeiro dia o tipo de mulher que ele gostava e ainda alimentou minhas esperanças. Por que quis seguir em frente com isso?
— Luci, eu… — O loiro mordeu o lábio inferior. Nós tínhamos um plano. Temos um plano. Volte.
— Eu fui uma tonta, mesmo… — Os lábios dela se converteram num beicinho para segurar o choro e os olhos dela reluziram. Ele viu pelo espelho do elevador.
— Não. — Christofer a abraçou por trás, tentando fornecer o máximo de suporte emocional que conseguia com aquele mero toque. — Você lutou pelo que sente. Isso não é vergonha alguma.
— Sou uma piada. — Ela disse a si mesma, e ouviu a porta do elevador se abrindo. — Eu quero ficar sozinha.
— Não. — Ele segurou a mão dela, sem se importar que outras pessoas quisessem entrar no elevador. — Não quero te deixar sozinha.
— Mas, é o que eu quero. Precisa respeitar. — Luciana disse, evasiva e fugitiva, e Christofer sabia que ela estava sofrendo muito. Aquilo o deixou desnorteado.
Por mais que ele desejasse que Luciana conhecesse Otávio de verdade, era triste que seu irmão tivesse aquele impacto nela. E doeu mais do que Christofer esperava ver como Luciana ficou completamente destroçada. Ela estava chorando, e isso partia o coração dele.
Ele não queria que ela sofresse.
Ele queria que ela desistisse de Otávio, mas não queria que ela sofresse. Era confuso e antagônico e ele não sabia lidar.