A rotina de encontros casuais, antes um refúgio seguro para Tobias, começava a pesar. Dois anos no jogo da aliança falsa haviam entorpecido parte da dor, mas também o haviam deixado com uma sensação persistente de vazio. Ele era procurado, sim, mas nunca realmente encontrado. Desejado, mas nunca verdadeiramente conhecido. A solidão, antes mantida à distância pela agitação das noites, parecia agora espreitar nas frestas. Nessa noite, ele decidiu variar. Em vez de ir sozinho para um dos seus bares habituais, combinou de sair com Niran, seu melhor amigo de longa data. Niran era um advogado com um senso de humor afiado e uma visão de mundo que, muitas vezes, servia como um contraponto necessário para o cinismo de Tobias. Ele sabia da história com Anny, embora Tobias não entrasse em detalhes, e Niran respeitava o espaço do amigo, oferecendo companhia e distração quando percebia que Tobias precisava. Eles escolheram um bar diferente naquela noite, um pouco mais animado, com uma band
A luz da manhã filtrava suavemente pelas cortinas entreabertas do quarto de Kael, pintando o ambiente com tons dourados e preguiçosos. Tobias acordou sentindo um calor agradável, o peso confortável do corpo de Kael ao seu lado, a respiração suave na nuca. Era uma sensação de paz e contentamento que ele não experimentava há muito, muito tempo. Contrastava bruscamente com as manhãs solitárias e apressadas que se seguiram aos seus encontros casuais. Com Kael, a noite anterior havia sido mais do que física; houve uma conexão, uma leveza e uma sinceridade que o tocaram profundamente. Ele se virou com cuidado para encarar Kael, que ainda dormia, o rosto relaxado e bonito. Um leve sorriso se formou nos lábios de Tobias. Talvez Niran estivesse certo. Talvez ele estivesse pronto para receber algo novamente. Kael despertou lentamente, seus olhos encontrando os de Tobias. Um sorriso genuíno e caloroso iluminou seu rosto. "Bom dia", ele sussurrou, a voz um pouco rouca pelo sono. "Bom dia
A manhã seguinte ao desastre com Kael foi, sem dúvida, uma das piores na vida de Tobias desde a traição de Anny. Ele chegou à clínica com a aparência quebrado, os olhos fundos pela noite mal dormida, as roupas um pouco amarrotadas pela pressa de se vestir e sair do apartamento de Kael. O brilho usual de sua persona pública estava apagado, substituído por uma aura de desespero e confusão. O consultório de Tobias, geralmente um santuário de ordem e perfeição asséptica, parecia alheio ao caos que fervilhava dentro dele. Zenon, seu assistente por cinco anos, estava na recepção, organizando a agenda do dia com sua eficiência habitual. Zenon era o oposto de Tobias em muitos aspectos: calmo, centrado, com uma força silenciosa que transparecia em sua postura ereta e olhar atento. Ele usava óculos que descansavam na ponta do nariz quando estava concentrado, e suas mãos fortes e ágeis se moviam com precisão. Zenon era mais do que um assistente; ele era o braço direito de Tobias, o c
O silêncio na sala de Tobias na clínica era denso, quebrado apenas pelo tique-taque de um relógio de parede e pela respiração pesada de Tobias. Ele ainda segurava o telefone, o olhar fixo em Zenon, que o encarava com uma expressão que misturava confusão, alerta e uma boa dose de ceticismo. A demanda de Kael ecoava na mente de Tobias: "me faça conhecer seu ex-parceiro". A impossibilidade da situação era gritante, mas a esperança de não perder Kael era ainda mais forte. "Zenon...", a voz de Tobias era um sussurro rouco. "Você... você ouviu?" Zenon assentiu lentamente, seus olhos por trás dos óculos não desviando do rosto pálido de Tobias. "Ouvi, Tobi. Ele quer conhecer seu 'ex-parceiro'. A pessoa com quem você 'fingiu' estar casado... usando a aliança." Zenon pausou, a compreensão total do absurdo atingindo-o. Seus olhos se arregalaram levemente. "Você não está pensando que...?" Tobias deu um passo à frente, estendendo as mãos em um gesto de súplica. "Você é a única pessoa que s
A segunda-feira após a "proposta" de Tobias a Zenon amanheceu com uma mistura de ansiedade e determinação no ar. Tobias estava estranhamente eufórico, impulsionado pela pequena faísca de esperança reacendida com Kael e pela (relutante) aceitação de Zenon em participar da farsa. Zenon, por outro lado, parecia ter aceitado seu destino com uma resignação sombria, mas com a seriedade e o pragmatismo que o caracterizavam. Se ele tinha que fingir ser um ex-parceiro, ele faria direito. A primeira ordem do dia, segundo Tobias, era garantir que Zenon causasse a "melhor impressão" em Kael. "Você tem que parecer elegante, sofisticado, o tipo de cara que eu estaria 'deixando' para estar com ele", Tobias explicou no carro a caminho de um shopping de luxo. Zenon apenas revirou os olhos por trás dos óculos, mas não argumentou. Ele sabia que a credibilidade da mentira dependia de todos os detalhes. Eles passaram a manhã em lojas de grife. Tobias, com seu olho clínico (e seu cartão de crédito)
A manhã seguinte ao jantar desastroso (e revelador) com Kael encontrou Tobias em um estado de ansiedade febril. A ideia de ter "dois filhos" pairava sobre ele como uma nuvem carregada de chuva. A promessa impulsiva de Kael em querer conhecê-los significava que a farsa precisava de mais do que uma narrativa; precisava de rostos, vozes, a prova viva da mentira. A única solução, por mais absurda e arriscada que fosse, envolvia os sobrinhos de Zenon, Jade e Sud. Tobias ligou para Zenon assim que chegou à clínica, pulando qualquer formalidade. "Zenon, precisamos trazer os meninos. Hoje." Do outro lado da linha, Zenon suspirou. "Eu imaginei. Tobi, tem certeza disso? Envolver as crianças... é um passo a mais na loucura." "Não temos escolha!", Tobias respondeu, a voz tensa. "Kael quer conhecê-los. E rápido. É a única maneira de sustentar essa nova camada da mentira. Por favor, Zenon. É pela causa... pela causa do Kael. E agora pela causa de não sermos descobertos." Zenon hesitou
O caos pós-anúncio da "viagem em família" na loja de brinquedos atingiu um novo patamar. Sud, ainda eufórico com a promessa da praia, rapidamente esqueceu a viagem anteriormente cancelada e se concentrou no presente: um paraíso de brinquedos à sua disposição, com "Papai Tobias" pagando. Jade, sempre estratégica, aproveitou a oportunidade de ouro para garantir seus "pagamentos" adiantados, além das aulas de balé.Enquanto Tobias, Zenon e Kael caminhavam pelos corredores coloridos, Jade e Sud agiram com a precisão de pequenos predadores de shopping. Eles apontavam para brinquedos, corriam de um lado para o outro, faziam exigências com vozes agudas e inegavelmente fofas."Papai Tobi, olha esse robô gigante! Eu preciso dele pra minha coleção!", Sud exclamou, puxando a calça de Tobias."E eu, Papai Tobias, preciso daquela casa de bonecas nova. É pra 'desenvolver minha imaginação' para o balé, sabe?", Jade acrescentou, com um sorriso inocente que não enganou Zenon nem por um segundo.Tobias
O sábado amanheceu, trazendo consigo a inevitabilidade da "viagem em família" para a praia. O caos da loja de brinquedos e a promessa impulsiva de Tobias haviam se solidificado em passagens de carro, reserva de hotel e malas feitas às pressas. Zenon estava na entrada de seu prédio, cercado por bagagens que pareciam ter se multiplicado durante a noite, com Jade e Sud pulando de excitação ao seu redor. Zenon, apesar da maquiagem leve que usava para disfarçar as olheiras (cortesia do estresse de organizar uma viagem falsa de última hora), exibia sua eficiência habitual. Ele checava se todos os brinquedos recém-adquiridos estavam embalados de forma segura (e discreta), se as roupas de banho estavam na mala certa e se as crianças tinham seus lanches e travesseiros. A ideia de uma viagem com Tobias, os sobrinhos dele fingindo serem filhos deles, e Kael, o catalisador de toda essa loucura, era exaustiva só de pensar, mas Zenon se concentrava na tarefa logística à frente. Ele havia conco