Lara
Meu nome é Lara, e se tem uma coisa que aprendi nesta vida é que reclamar não muda nada. Enquanto alguns preferem chorar pelos cantos, eu prefiro dançar. Literalmente. Não sou dessas que perde tempo remoendo o que deu errado. O mundo já é pesado demais — se eu não fizer da minha vida uma festa, quem vai fazer? Entre um problema e outro, escolho o salto alto e a pista de dança. A verdade? A gente nunca sabe quando será o último gole, o último beijo, o último pôr do sol. Por isso, eu vivo. Sem medo, sem freios. Mas não se engane, nem tudo em mim é leveza. Se tem algo que me tira do sério é a minha família. Nunca me dão um minuto de paz. Sempre tem uma cobrança, uma crítica, um drama novo. E, sinceramente, é por isso que hoje vou me jogar sem culpa. Hoje à noite, eu e minha melhor amiga Hadiya vamos conhecer a nova boate da cidade. Prometo que vou dançar até esquecer o nome dos problemas. E quem sabe... dar uns beijos também. Afinal, paquerar faz bem para a pele. Hadiya é meu oposto. Uma alma romântica presa num corpo de guerreira. Ela já passou por tanta coisa que às vezes me pergunto como ainda consegue sorrir. Ela é daquelas que acredita em destino, alma gêmea, finais felizes. Eu? Acredito em química. Tesão. Toque. E por mais que nossas visões de mundo sejam diferentes, eu amo essa mulher como se fosse minha irmã de sangue. Tudo o que eu queria era vê-la realmente feliz — com alguém que a valorizasse, que a enxergasse do jeito que eu vejo: linda, forte, única. Lembro como se fosse ontem o dia em que dei a ideia mais maluca da minha vida. — Hadiya, você precisa perder logo a virgindade. Tá esperando o quê? O casamento? Ela me olhou com aqueles olhos grandes, pensativa. E no fim… me ouviu. Se arrependeu depois? Talvez. Mas fez. E até hoje eu fico me perguntando se não fui inconsequente. Vai ver ela só fez porque confiava em mim. Isso me assombra às vezes. Ela devia ter esperado pelo cara que ela ama desde a adolescência. Aquele amigo de infância que sumiu sem deixar rastros. Mas será justo ela congelar a vida por um fantasma do passado? Não. Ninguém merece viver em função de quem não está mais presente. Já eu, sou prática. Se o cara não presta, tchau. O problema é que nenhum presta! Tenho o dom de atrair embustes. Meus namoros duram três meses no máximo — o tempo de descobrir que o tal “príncipe” não vale nem a sola do meu salto. Mas sabe o que me mantém acreditando? A ideia de que, em algum canto do mundo, existe um homem que vai me fazer tremer inteira. Um cara que vai mexer não só com meu corpo, mas com a alma. Que vai fazer meu coração disparar, minhas pernas cederem, e minha pele pedir mais. Quero um homem que me faça perder o fôlego, que saiba me ler com os olhos e me tocar com a voz. Não precisa ser certinho, só precisa me desafiar — e me enlouquecer de prazer. Já até imagino a cena: eu, entregue, sem defesas, implorando por mais. Porque com esse cara, até minha sanidade vai perder a batalha. Mas enquanto ele não aparece, sigo colecionando erros. Beijo quem não devo, me envolvo com quem não presta e finjo que está tudo bem. No fundo, acho que faço isso de propósito. Me jogo nos errados porque ainda não sei o que é amar de verdade. Já gostei de alguns, sim. Mas amor? Amor de verdade? Nunca senti. E talvez esse seja meu maior medo: amar. Porque amar é ceder. É se expor. É perder o controle. E, sinceramente, eu sou péssima em perder o controle. Tenho opinião forte, língua afiada e zero paciência para joguinhos. Se algo me incomoda, eu falo. Na cara. Sem rodeios. Vai ver é por isso que os caras correm. Ou vai ver é porque ainda não encontrei aquele que vai ficar, mesmo depois de me ver no meu pior. E quando falo de encontrar alguém, não é sobre casamento imediato. Deus me livre! Casamento é coisa séria. Tem que vir com cumplicidade, respeito e muita paixão. Não quero ser mais uma das que casam por impulso e se arrependem um ano depois. Se for pra dividir minha vida com alguém, que seja com quem eu queira envelhecer ao lado. Com quem eu me sinta em casa mesmo nos dias ruins. Não quero me casar por status. Quero me casar por amor. Por desejo. Por conexão. Mas, por hoje, deixo esses pensamentos de lado. A noite me chama. As luzes da cidade piscam como promessas. E eu? Estou pronta para viver mais uma história — mesmo que ela só dure até o amanhecer. Sem arrependimentos. Essa é minha filosofia. Viver na alegria, na tristeza, na saúde ou na doença... até que a morte nos separe da nossa própria liberdade. Amém! Meus pais estão casados há mais de trinta anos. Um milagre moderno. Meu pai, calado e paciente, aguentando minha mãe e suas eternas reclamações como um monge zen. Talvez isso seja amor. Ou teimosia. Eu só sei que, por mais que minha mãe me tire do sério, ela já foi diferente. Mais carinhosa, mais leve. Tudo começou a mudar quando decidi não seguir o roteiro que ela havia escrito para mim. Ela queria uma filha advogada, casada com um médico, com dois filhos e uma casa no condomínio dos sonhos. Eu queria ser feliz, trabalhar com o que amo e, quem sabe, me apaixonar sem calcular saldo bancário. Desde então, nossa relação virou uma batalha diária. — Lara, minha filha, você vai acabar sozinha! — ela repetia com a convicção de uma vidente. — Sua irmã está certa. Arrumou um bom partido, um homem que pode dar a ela um futuro. Futuro? Desde quando um homem é sinônimo de futuro? — Mãe, não quero viver a vida da Leila. Quero viver a minha. Se for pra casar, que seja por amor, não por conveniência. E se for pra ficar solteira curtindo a vida, que assim seja. Eu sou livre, entende isso? Mas ela não entendia. Ou fingia não entender. — Você vai passar da idade, minha filha... depois vai ser tarde demais. — Pra quê, mãe? Pra ser bancada por um homem que nem me faz rir? Eu quero alguém que me ame de verdade, que me faça arrepiar, gargalhar, perder o juízo... e não alguém só porque tem uma conta recheada! — Ai, Lara... você e essa sua cabeça... — E você e essa sua obsessão por dinheiro! Ela revirava os olhos, como se eu fosse a demente da família. — Estou indo trabalhar, e talvez nem volte hoje — avisei, pegando minha bolsa. — Vai dormir com aquele... como é mesmo o nome dele? — André — respondi seca. — E olha que esse já dura quase três meses. Um recorde, né? Mas a verdade? Eu já estava de saco cheio daquele relacionamento morno. André era o típico namorado "sofá e controle remoto". Não saía, não me surpreendia, não queria viver — só sobreviver. Eu gosto de intensidade, de movimento, de vida. E ele parecia uma pedra no meio do caminho. Durante o expediente no estágio, minha decisão estava tomada: André seria promovido a ex. Não havia paixão, nem planos, muito menos parceria. Eu estava mantendo aquele namoro por tédio, e isso é a pior forma de companhia. No fim da tarde, chamei ele para conversar. — Acho melhor a gente terminar — fui direta. Ele riu com arrogância. — Você quem tá perdendo. Tem mulher que se mata pra estar no seu lugar. Dei uma gargalhada tão alta que até o garçom parou de limpar a mesa. — Se elas existem, boa sorte pra elas — respondi, pegando minha bolsa. — Porque eu tô fora. Saí com a sensação de alívio no peito. Como se tivesse tirado um peso das costas. Era isso. Sem amarras. Sem homem morto-vivo no meu caminho. Hoje à noite, a boate vai ser meu palco. Eu quero dançar até esquecer que um dia aceitei menos do que mereço. Quero me sentir viva, desejada, livre. E que se exploda o que minha mãe pensa. Não sou como a Leila, e nunca serei. Não quero ser uma boneca na estante de um homem rico, nem fazer parte de um casamento vazio para agradar os outros. Quero tudo — o riso, o toque, o caos, o amor verdadeiro. E enquanto isso não chega, eu me divirto com o caminho. Hoje à noite é minha. E ninguém vai tirar isso de mim.