Tentei ao máximo me concentrar no trabalho, mas minha mente insistia em reviver cada detalhe do nosso encontro. Eu odiava o efeito que ele ainda tinha sobre mim, e isso só me irritava mais.
Afundei na papelada sobre minha mesa, analisando contratos e revisando relatórios. Se existia algo que me fazia esquecer dos problemas, era me perder no trabalho. Mas, mesmo assim, a cada intervalo entre um documento e outro, minha mente vagava para os olhos de Enzo, para a forma como ele me olhou, como se ainda tivesse algum direito sobre mim.
— Está tudo bem? — A voz de Murilo me trouxe de volta à realidade. Ele estava encostado na porta da minha sala, segurando um copo de café e me observando com um olhar curioso.
— Sim. Só tentando manter minha sanidade. — Suspirei e estiquei os braços, sentindo a tensão acumulada nos ombros.
Ele entrou, puxando uma cadeira e se sentando de frente para mim.
— Isso tem nome e sobrenome, né? — Ele disse, arqueando uma sobrancelha.
— Não vamos falar sobre isso. — Cruzei os braços e encarei meu monitor, mas era impossível evitar o olhar inquisitivo de Murilo.
— Você sabe que vai ter que me contar o que aconteceu entre vocês em algum momento.
Bufei, impaciente.
— Por que não cuida da sua vida.
Ele revirou os olhos e tomou um gole do café.
— Você sempre fica evasiva quando tenta esconder algo. — revirei os olhos irritada e ele apenas sorriu. — Confessa que você e o CEO já tiveram um caso.
— Não tenho nada para confessar.
— Sua boca diz isso, mas seus olhos dizem outra coisa.
Antes que ele pudesse continuar com sua análise da minha vida emocional, meu telefone tocou. Atendi rapidamente, aproveitando a distração.
— Diretora, o CEO convocou uma reunião urgente para revisar a proposta de uma nova fusão. Ele quer todos na sala de conferências em quinze minutos. — A voz de Camile soou do outro lado da linha.
Engoli em seco.
— Certo. Estarei lá. Obrigada Camile.
— Não precisa agradecer chefinha! — Desliguei e olhei para Murilo. — E a tortura continua.
Ele apenas riu enquanto eu pegava meus papéis e me levantava. Respirei fundo antes de sair da sala.
A sala de conferências estava cheia quando cheguei. Os diretores já estavam sentados, murmurando entre si enquanto aguardavam o início da reunião. Enzo estava na cabeceira da mesa, folheando alguns papéis. Seus olhos encontraram os meus assim que entrei, e por um breve segundo, vi um lampejo de algo que não consegui identificar.
Me sentei ao lado de Murilo e foquei nos documentos à minha frente. A reunião começou, e Enzo passou a apresentar os detalhes da fusão com outra empresa do setor. Ele falava com segurança, do jeito que sempre fez. Era inegável que ele sabia comandar uma sala, que sua presença impunha respeito. E eu odiava admitir que essa confiança era uma das coisas que um dia me fizeram me apaixonar por ele.
— Ana Luiza, qual sua opinião sobre os termos da nova fusão? — A voz dele me trouxe de volta. Todos os olhos estavam em mim.
— Os números são bons, mas algumas cláusulas precisam de ajustes. — Mantive a voz firme. — Há riscos envolvidos se não revisarmos a participação acionária após a fusão.
Ele assentiu, satisfeito com minha resposta. Continuamos discutindo os detalhes, e por uma hora, conseguimos nos manter estritamente profissionais. No final da reunião, quando todos começaram a se levantar, Enzo se dirigiu a mim.
— Podemos conversar depois, AnaLu? — Ele perguntou, mantendo um tom neutro.
Murilo, que estava ao meu lado, lançou um olhar divertido antes de se afastar, deixando-me sozinha com Enzo.
— Se for sobre trabalho, pode falar agora. — Cruzei os braços.
— Não é só sobre trabalho. — Ele disse, abaixando a voz.
Eu ri, sem humor.
— Se não é sobre o trabalho, não temos nada para conversar.
— Você ficou realmente durona, mas uma pena que me odeia.
— O ódio exige energia demais, Enzo. Eu só segui em frente.
— Será? — Ele inclinou a cabeça, me observando de perto. — Porque parece que você ainda tem muito a dizer.
Respirei fundo, sentindo a raiva borbulhar.
— O que você quer de mim? — Minha voz saiu mais baixa, mais cansada do que eu pretendia.
— Não sei. — Ele admitiu, e pela primeira vez, vi uma hesitação em seu olhar. — Mas eu não esperava te encontrar aqui. E agora que te vi de novo… — Ele parou, como se estivesse escolhendo as palavras certas. — Eu só quero entender se ainda existe algo entre nós.
Fechei os olhos por um instante, sentindo a dor antiga ameaçar me engolir de novo.
— Eu não sou mais a mesma, Enzo. — Abri os olhos e o encarei.
Ele sorriu de leve, mas era um sorriso triste.
— Eu também não. — Ele respondeu.
— Então pronto! — Resolvi imediatamente.
—Talvez seja a hora de nos conhecermos de novo.
Meu coração bateu forte, mas eu não podia ceder. Não agora. Não tão fácil.— Boa sorte com isso. — Murmurei antes de me virar e sair da sala sem olhar para trás.