Mundo ficciónIniciar sesiónA VIAGEM DE ELARA
Quando amanheceu, ele já estava de pé. O terno pendurado na cadeira, o olhar perdido, o corpo pesado de cansaço e de raiva. Desceu as escadas devagar. O som dos passos ecoou pelo mármore até o salão principal. Marie estava na sala de jantar, arrumando a mesa com o mesmo cuidado de sempre. O aroma de café fresco misturava-se ao perfume das flores. Marie estava na sala de jantar, arrumando a mesa com o mesmo cuidado de sempre. O aroma de café fresco misturava-se ao perfume das flores. — Bom dia, senhor. — cumprimentou ela, respeitosa. — Eu não sabia que o senhor havia retornado ontem à noite. Ele puxou a cadeira e sentou-se, a voz ainda rouca: — Onde está a Elara? Marie parou por um instante, com a mão sobre a jarra de café. — A senhora Elara viajou, senhor. — Viajou? — Ele franziu o cenho. — Para onde? — Não sei, senhor. — respondeu ela, com calma. — Ela saiu com as malas na mesma noite da formatura. Apenas se despediu e disse que não sabia quando voltaria. Adric a observou, incrédulo. — Disse quando retornaria? — Não, senhor. Apenas pediu que eu não entrasse em contato e que, se o senhor perguntasse, dissesse que ela havia deixado um aviso no quarto. O silêncio caiu sobre a mesa. Ele respirou fundo, apoiando os cotovelos sobre o tampo. — Merda... a formatura dela. — Eu esqueci. Marie baixou o olhar, sem comentar. Continuou a dispor as xícaras com seu costumeiro zelo, deixando-o com o peso do próprio esquecimento. — E como ela estava? — perguntou ele, num tom mais baixo. — Do mesmo jeito de sempre, senhor. — respondeu Marie. — Calma, educada... mas diferente. Havia algo no olhar dela. Ele desviou o olhar, inquieto. Tomou o café em silêncio, mas não sentiu o gosto. Dobrou o guardanapo, levantou-se e disse: — Marie, hoje eu não volto para casa. — Tudo bem, senhor. — respondeu ela, com suavidade. — Tenha um bom dia. Ele apenas acenou e saiu. Marie o observou pela janela enquanto o carro desaparecia portão afora, e murmurou baixinho: — Que os ventos guiem essa história para longe da dor, senhor. O relógio marcava oito da manhã quando Adric entrou no prédio da Valeforte Group. O terno impecável e o rosto tenso denunciavam a insônia da noite anterior. O som dos saltos ecoou pelo corredor de mármore antes que a porta se abrisse. Marla já estava lá, pontual como sempre, com uma pasta de couro nos braços e o perfume delicado invadindo o ambiente. — Bom dia, senhor Valeforte. — disse ela, entregando a agenda. — O senhor tem reunião com os investidores às dez, e o diretor de contratos já confirmou presença. Ele assentiu, pegando o papel sem olhar diretamente para ela. — Obrigado. Marla hesitou, observando o semblante abatido dele. — Descobriu onde a sua esposa está? Adric levantou o olhar, breve. — Ainda não. Marie disse que ela viajou no mesmo dia da formatura dela. — No mesmo dia? — Marla arqueou as sobrancelhas. — E o senhor não foi? — Não. — respondeu, seco. — Eu estava em Ibiza, resolvendo contratos. E, sinceramente, nem lembrei da formatura. Acredito que isso tenha deixado ela chateada. Marla apoiou a pasta na mesa e cruzou os braços. — E ela precisava levar todas as coisas dela? — Não sei. — murmurou ele. — Vou descobrir quando ela voltar. — E quando ela volta? — Também não sei. Marie disse que ela não avisou. Apenas saiu, com as malas, naquela noite. Marla franziu o cenho, fingindo preocupação. — Será que ela está planejando alguma coisa? Adric suspirou, cansado. — Não sei, mas vou ligar para a empresa dela. Talvez o primo dela saiba de algo. Pegou o celular, discou o número de Patrick Vasquez e esperou a chamada. O tom de voz do outro lado foi firme e cordial. — Patrick Vasquez falando. Bom dia. — Bom dia, Patrick, Aqui é Adric. — respondeu. — Você esteve na formatura da Elara? — Não. — respondeu o primo, surpreso. — Ela nem avisou. E, para ser sincero, eu não estava em Nova York. — Entendo. — disse Adric. — Eu também não. Estava na Europa, resolvendo contratos. Ela só deixou um bilhete para mim, dizendo que ia viajar. — Sim. — confirmou Patrick. — Ela me comunicou que pediria férias. Disse que eu continuaria como CEO das empresas até o retorno dela. Quando voltasse, apenas cumpriria o prazo do contrato que o Tixiu deixou no testamento. — Então ela não pretende reassumir? — perguntou Adric, surpreso. — Não. Ela foi bem clara, disse que não quer ser CEO. Que o desejo do pai era que eu mantivesse a gestão. Ela vai apenas participar das reuniões obrigatórias, mas quer distância de tudo. Adric passou a mão pelo rosto, tenso. — Então você também não sabe para onde ela foi? — Nem sabia que ela tinha viajado. — respondeu Patrick, sincero. — Só disse que precisava descansar. Que a faculdade foi exaustiva e que ainda não superou a morte do Tixiu. — Eu tentei ligar para ela. — comentou Adric. — O celular está desligado. — Sim, ela falou que ficaria off-line por tempo indeterminado. — confirmou Patrick. — Disse que precisava tirar férias de tudo e de todos. O silêncio pairou entre os dois por alguns segundos. — Certo, — disse Adric, por fim. — Se souber de algo, me avise. — Pode deixar. — respondeu Patrick. — E… cuide-se, Adric. — Você também. — encerrou a ligação. O telefone deslizou lentamente pela mesa. Marla o observava de canto de olho, tentando medir a reação dele, mas Adric não demonstrou nada. Apenas ficou ali, com o olhar distante, sentindo — talvez pela primeira vez — o vazio real que Elara havia deixado.






