Estava acontecendo. Não havia mais volta.
O motorista não disse uma única palavra durante o trajeto. O silêncio parecia parte do ritual. Cada minuto era uma contagem regressiva para um destino que eu ainda não compreendia por inteiro. Depois de longos vinte minutos, o carro freou suavemente. A porta abriu-se por fora, revelando a fachada iluminada de um hotel de luxo. Lustres de cristal cintilavam através das janelas altas, e homens de terno e mulheres de vestidos longos transitavam pela entrada principal, como se fosse apenas mais um evento elegante da alta sociedade. Mas eu sabia que, por trás das cortinas, escondia-se algo muito mais sombrio. — Por aqui. — A voz calma de um segurança me guiou por uma porta lateral, discreta, longe do brilho da entrada principal. Fui conduzida até uma ampla sala onde outras garotas já esperavam. Algumas estavam sentadas, ansiosas, outras em pé, tentando disfarçar o nervosismo com conversas superficiais. Havia quem fingisse indiferença, roendo unhas ou mexendo no celular, mas a tensão era palpável. Todas usavam variações do mesmo traje: sobretudos que cobriam as roupas íntimas minúsculas de renda translúcida, cores claras, como se fossem fantasmas preparados para desfilar diante de predadores. Me foi entregue uma lingerie, um tecido branco que mal cobria o corpo. Quando terminei de vestir me senti exposta, vulnerável. — Lembre-se, não fale sem ser questionada. — A coordenadora, uma mulher loira de olhar gelado, repetiu as regras. — Não olhe diretamente para os convidados, a não ser que queira chamar atenção. E, acima de tudo, lembre-se para o que vocês estão aqui. Eu respirei fundo, endireitei os ombros e fiquei em silêncio. Uma a uma, as garotas eram chamadas. Seus números eram anunciados pelo leiloeiro que falava com naturalidade perturbadora, como se vendesse obras de arte. A cada lance, números subiam rapidamente, valores que jamais sonhei ver na vida. Eu esperava, imóvel, até ouvir meu número. — Garota vinte e um. Senti o toque frio da seda contra a minha pele quente e bem cuidada, um arrepio que durou segundos, mas ficou marcado, como se tivesse se impregnado em mim. Antes que pudesse pensar, um toque firme nas costas me indicou para onde eu deveria ir, a passarela improvisada à minha frente. Eu não queria, mas precisava. Precisava de um jeito quase desesperado. Dei um passo à frente, deixando para trás aquele tecido fino, que agora se misturava a outras peças caídas no chão, deixados pelas meninas que tinham passado por ali antes de mim. Minha virgindade, hoje, estava sendo leiloada. Condição única: ninguém poderia saber. Ninguém poderia descobrir que esse lugar sequer existia. Não era difícil manter o segredo, o que me importava, na verdade, era receber minha parte, ainda hoje, assim que tudo acabasse. Assim que eu entregasse o que vieram comprar. Um arrepio percorreu meu corpo, mas não era pelos olhares cobiçosos. Eu nem olhava para eles. Meu olhar estava fixo no chão. O frio do salão era o que me fazia tremer. Eles estavam confortáveis, em ternos caros, com taças de champanhe, e nós, as meninas, estávamos praticamente nuas, expostas para que cada detalhe fosse analisado. Eu estava congelando. Talvez fosse impossível não notar minha pele coberta de arrepios. Não era medo, como podiam pensar, era frio. Na verdade, medo eu não tinha. Eu sabia onde tinha me metido e tinha me preparado. Antes de sair de casa, repeti para mim mesma um mantra simples: “Não é nada demais. Todo mundo faz isso”. Quase todo mundo, pensei em seguida. Quase todo mundo, mas nem todos por dinheiro. Uma das organizadoras me pediu algo. O quê? Ah, sim: para girar, mostrando minhas costas, minhas curvas. “As garotas tem que ser vistas de todos os ângulos”. Era a regra. Eu me virei, sentindo outro arrepio. “Que comece logo”, pensei. “Que acabem logo, de preferência”. A sala reservada para depois seria mais quente. Muito mais quente. Finalmente, a primeira oferta foi anunciada. Começou. As vozes surgiam de todos os cantos, elevando os lances cada vez mais. O valor crescia, mas não era suficiente. Com a comissão, ainda não chegava no que eu precisava. “Continuem”, pedi em silêncio. “Continuem aumentando”. Eu suportaria o frio até alcançarem o número certo. Percebi que, entre todas as vozes, uma sobressaía, um único comprador, insistente, aumentando os lances com pressa, como se tivesse pressa de vencer. Um admirador? Mesmo que fosse só por hoje? Quis erguer o olhar, mas não consegui. Minha cabeça parecia pesada, talvez pelo frio, talvez pela tensão. Mas não adiantaria: só veria uma máscara. Não teria como saber quem ele era, nem seu olhar, nem sua idade. Podia ser um executivo quarentão, um advogado de sucesso… ou um velho milionário. Riqueza não tem idade. O valor subia cada vez mais rápido. Duzentos mil… quinhentos mil… seiscentos. O coração disparava junto com as vozes. Eu fingia calma, mas minhas mãos tremiam discretamente ao lado do corpo. Por dentro, eu só pensava: chega logo no que eu preciso, por favor. E então, silêncio. O leiloeiro repetiu o último lance, a voz ecoando pelo salão: — Um milhão… Dou-lhe uma… dou-lhe duas… O martelo bateu. — Vendida! Meu coração disparou de novo, mas não de frio dessa vez. Um burburinho discreto se espalhou no setor indicado. O mestre de cerimônias, satisfeito, prosseguiu: — Muito bem. A moça será preparada. Seguimos com o próximo lote. Um segurança me tomou pelo braço com delicadeza e me guiou para fora do palco. Quase suspirei de alívio quando senti uma manta quente ser colocada sobre meus ombros. Não era o mesmo tecido ridículo que usaram antes; era macio, pesado, acolhedor. Pela primeira vez naquela noite, meu corpo parou de tremer. O quarto onde tudo aconteceria estava ali mesmo, entre aquelas paredes. Conveniente para eles. Cruel para mim. Perguntava a mim mesma: será que ele vai tirar a máscara? Ou vai permanecer escondido até o fim? Entramos em um cômodo iluminado de forma suave, quase intimista. Havia uma cama enorme, coberta por lençóis vermelhos como vinho. Não havia algemas, chicotes ou nada assustador, apenas o suficiente para criar o clima que eles julgavam adequado. A porta se fechou atrás de mim. O segurança foi embora. Eu fiquei só. Esperando. Ele estava em algum lugar do prédio, terminando o pagamento. Daqui a pouco entraria. E, por mais estranho que fosse, a expectativa queimava mais do que o medo. Dei por mim em pé no meio do quarto, imóvel, como uma estátua. Por que diabos eu ainda não tinha me sentado na cama? Respirei fundo e sentei. Os minutos pareceram horas. Até que a maçaneta girou. A porta abriu devagar. Eu virei o rosto e o vi. Era ele. A máscara ainda cobria parte do rosto, mas agora eu podia observá-lo melhor. O terno escuro realçava os ombros largos, a postura firme. Havia um toque de grisalho em seu cabelo, o que só o deixava mais imponente. Ele tinha a aparência de quem carrega poder, não apenas dinheiro, mas algo mais profundo, difícil de explicar. E então, os olhos. Azuis da cor do oceano. Quando se fixaram em mim, senti como se tivesse sido sugada para dentro de um abismo. Não consegui desviar. Ele também me estudava, com calma, como se me pesasse em cada detalhe. A cabeça inclinada de leve, um gesto que me deu vontade de sorrir à toa. Quase perdi o controle, quase deixei escapar uma risada nervosa. Mas me segurei. O silêncio entre nós parecia ter peso. — Levante-se — ele ordena. Faço exatamente como disse. De cabeça baixa, reparo no carpete sob meus pés. Pergunto-me há quanto tempo foi colocado. Parece velho, quase vintage. Talvez seja parte do charme do lugar. Lembra algo que eu veria em um filme antigo, onde a garota era colocada à venda. Ok, estou tentando fingir que minha fantasia não é tão fodida. Mas isso não é uma fantasia. Longe disso. — Tire a roupa. Eu nem sequer sei o nome dele. Não que importe. Não vou dizer o meu também. Dou-lhe as costas ao soltar o fecho do sutiã. A voz dele me paralisa: — Não. Quero ver. Vire-se. Mostre para mim. Meu rosto arde. Nunca ninguém falou comigo assim. Sem olhá-lo, tiro o sutiã devagar, sentindo meus seios saltarem livres. Quando chego à calcinha, hesito. — Tudo De repente, me senti mais firme, mais pronta para fazer o que precisava ser feito.