Nice ajustou os óculos sobre o nariz com um gesto automático enquanto os dedos percorriam o teclado do notebook com precisão cirúrgica. Sentada na sua mesa de sempre, perto da grande janela de vidro da confeitaria, ela parecia alheia ao movimento ao redor. As conversas, os risos, o cheiro de café e açúcar... nada daquilo existia para ela.
Na tela, mais uma revisão da tese de doutorado. Mais uma tentativa de lapidar a conclusão que insistia em parecer incompleta.
Ela deu um gole no cappuccino novo da casa — sabor chocolate com toque de avelã — e, no momento em que o líquido quente e cremoso envolveu sua boca, ela fechou os olhos e soltou um leve gemido de prazer, quase involuntário. Baixo, rápido... mas ainda assim, audível para quem estivesse atento.
— “Delicioso...” — murmurou, abrindo os olhos e olhando para a atendente com um sorriso genuíno.
Do outro lado do balcão, Sebastian Moreau parou de digitar no celular. Ele estava apenas de passagem. Nunca tinha pisado naquela confeitaria antes. Só entrou porque precisava de café, e porque seu humor naquela manhã estava mais ácido que de costume.
Mas foi impossível não perceber a mulher da mesa da janela.
Cabelos castanhos presos em um coque baixo e despretensioso, algumas mechas escapando e emoldurando o rosto de traços delicados. Os olhos castanhos escuros, escondidos atrás dos óculos de armação fina, varriam a tela do notebook com foco quase obsessivo.
Ela tinha uma beleza discreta, natural... Corpo esguio, com curvas sutis, mas bem definidas para alguém de estatura médica - cerca de 1,63m. Havia algo nela, algo que Sebastian não conseguia definir, mas que prendeu a atenção dele como poucas coisas faziam ultimamente.
Ela estava sozinha. Concentrada. Alheia ao mundo... E ao mesmo tempo, aquele som de prazer ao experimentar o café, Sebastian fechou os olhos por um segundo. A imagem dela se repetia como um eco e se esse som fosse devido a ele e não o café.
Ele não precisava de novas distrações. Estava ali por acaso. Mas... talvez... ela servisse a um propósito prático.
Pegou o café que o atendente estendeu, respirou fundo e, com passos calculados, caminhou até a mesa dela.
— “Com licença.”
Nice levantou os olhos devagar. O homem à sua frente era difícil de ignorar, o tom de voz era firme, grave, com um sotaque difícil de definir. Alto, facilmente com mais de 1,85m, ombros largos, postura impecável, cabelos escuros perfeitamente penteados, com um corte que deixava o rosto ainda mais anguloso. Os olhos de um castanho quase preto, intensos, observadores, como se pudessem dissecar cada camada de quem estivesse à frente.
O terno casual, a postura ereta... Ele exalava poder, presença.
Ela mediu o estranho de cima a baixo com um olhar rápido e educado, mas já preparada para recusar qualquer tentativa de conversa.
— “Pois não?” — ela resondeu, com edução, mas deixando claro que estava ocupada.
Sebastian sorriu de canto. Sabia reconhecer uma muralha emocional de longe. Ele mesmo era mestre em construí-las. Mas também sabia, como derrubá-las.
— “Perdoe a intromissão... Eu só... estava ali no balcão e vi sua expressão ao provar a sua bebida. Fiquei curioso. É realmente tão bom assim?”
Nice arqueou uma sobrancelha.
— “Recomendo. Se estiver precisando de um momento de prazer genuíno, claro.”
Foi uma resposta direta, quase cortante, mas com um toque de humor sutil. Sebastian inclinou a cabeça, como quem reconhece um adversário à altura.
— “Bom saber... Eu estava mesmo precisando de algo fora da rotina.”
Ela voltou os olhos para o notebook, encerrando o assunto com um silêncio educado. Mas Sebastian, não foi embora.
Ele permaneceu de pé ao lado da mesa por alguns segundos. Observou a forma como ela digitava. O foco. A energia que ela tentava esconder. E com um sorriso discreto nos lábios, completou:
— “Meu nome é Sebastian.”
Ela não levantou os olhos.
— “Nice.” — respondeu apenas, como quem dá o mínimo necessário para encerrar a interação.
Ele sorriu ainda mais. Tinha o nome dela agora. E mais importante, tinha um novo interesse.
E quando Sebastian Moreau se interessava, nada permanecia o mesmo por muito tempo.