Parte 7 - Querido tio

Respirei fundo antes de seguir Sebastian até o que eu pensei ser seu escritório. Era uma sala mais reservada, com alguns troféus e fotos de lutadores nas paredes, e o som abafado dos treinos mal chegava ali. Eu tinha vindo para conversar sobre os detalhes do treino de Dante, mas, ao cruzar a porta, a seriedade no olhar de Sebastian fez com que eu soubesse que o assunto iria além do boxe.

Ele fechou a porta e se virou para mim, os olhos azuis fixos nos meus. "Você e Dante estão bem?", ele perguntou, a voz grave, cheia de uma preocupação genuína.

Senti um nó na garganta, mas as palavras precisavam sair. "Seu irmão é a razão pela qual tive que voltar para cá, Sebastian. Depois da vergonha e humilhação que ele nos fez passar." Minha voz falhou um pouco. "Não foi fácil, Sebastian. Sempre fui a esposa troféu para ele, o que ele gostava de exibir para os amigos da faculdade e depois para os colegas de trabalho. Ele foi meu primeiro homem, minha vida era com ele. Mas ele preferiu trocar anos de um casamento que eu pensava ser feliz por Vivian."

Ele assentiu, os olhos escurecendo com a menção de Demétrio e Vivian. O contraste entre o Sebastian garoto que eu lembrava e o homem à minha frente era gritante. "Eu não sei o que dizer, Ella. Não quero que isso seja uma desculpa, mas ele foi... imaturo e egoísta. Eu nunca imaginei que meu irmão te machucaria tão cruelmente", ele falou.

A forma com a qual ele respondia, a maturidade em suas palavras, me passava a sensação de estar falando com um homem muito mais velho, e não um garoto de 19 anos de idade. Ele parecia ler meus pensamentos, pois seus lábios se curvaram em um leve sorriso. "Eu posso ter só 19 anos, mas nunca brincaria assim com os sentimentos de outra pessoa, ainda mais se fosse alguém como você, tão doce", ele falou, e suas bochechas ficaram levemente coradas.

Eu suspirei, tentando conter as emoções que ameaçavam vir à tona com a surpresa daquele elogio e da sua empatia. "A questão agora é seguir em frente, por Dante. Quero que ele se sinta bem aqui, que encontre um lugar onde ele se encaixe."

Sebastian se aproximou um pouco mais, as mãos nos bolsos, com o olhar sincero e intenso. "Por isso eu queria propor algo. Sei que Dante está tentando se adaptar e, se você achar que ajuda, eu gostaria de passar um tempo com ele. Treinar juntos, conversar... Se ele admira o esporte e, se puder ser um apoio para ele, para que se sinta em casa, ficaria feliz em ajudar", ele falou, a voz firme e decidida.

"Obrigada", eu disse, sentindo as lágrimas marejarem meus olhos novamente. "Você não sabe o quanto isso significa para mim. Acho que seria bom para o Dante ter alguém que ele confie por perto."

"Por ele e por você, Ella. Vocês não mereciam o que Demétrio fez com vocês. Eu sou tio de Dante, é meu dever ajudá-lo."

Eu percebi que ele estava sendo sincero, e, pela primeira vez em muito tempo, senti-me cuidada. A presença de Sebastian era uma espécie de ancoragem, algo que me trazia paz, e eu me permitia sorrir de verdade.

"Bom, tenho que voltar para Dante", eu falei, sentindo minhas bochechas esquentarem. "Te vejo amanhã no treino."

"Ok! Tchau", ele respondeu com um sorriso que iluminou seu rosto, e eu saí da sala com as bochechas ainda vermelhas. A conversa foi ótima, mas fiquei muito tempo sem ver ele, e agora o vejo totalmente crescido e muito bonito, por sinal.

Dirigi direto para casa, ansiosa para confortar meu filho e lhe dizer que seus treinos estavam garantidos. A promessa de Sebastian era um bálsamo para a alma ferida de Dante, e para a minha também.

Ao abrir a porta de casa, eu me senti imediatamente envolvida pelo som de risadas e vozes animadas. Franzi a testa, surpresa. Dante estava na sala, jogando videogame, e ao lado dele, eu reconheci uma figura familiar que não via há muito tempo: Jack. O primo de Dante.

Eu forcei um sorriso, tentando disfarçar o choque. Jack tinha se tornado um belo rapaz.

"Jack! Nossa, é bom te ver!", avancei para cumprimentá-lo. Eu me dei conta de que ele não era aquele bebê que engatinhava pela casa atrás de Dante; agora, ele era um adolescente, quase irreconhecível. Alto, magro, com o cabelo castanho-claro e os olhos curiosos da família do Demétrio, mas com uma doçura que me lembrou sua mãe.

Jack se levantou do sofá, cumprimentando-me com um sorriso educado. "Ei, tia Ella. Faz muito tempo, né? Bom ver você de novo."

"Sim, faz tempo", eu respondi, ainda um pouco atordoada. "Você cresceu muito."

Nós nos sentamos no sofá, e Dante voltou a atenção para o jogo, ainda sorrindo, enquanto Jack me observava com entusiasmo, como se estivesse feliz por nos ver. Eu os olhei de perto, sentindo-me grata pela amizade entre os dois primos. Era reconfortante ver Dante feliz e em boa companhia, especialmente agora, depois de tantas mudanças e dores.

"Vou pedir uma pizza e quero que Jack seja nosso convidado!", eu falei, minha voz um pouco mais leve do que antes.

Imediatamente, Dante deu um grito entusiasmado, sem tirar os olhos da tela. "Eu quero de quatro queijos!"

Dei uma risada fraca, sentindo um calor no peito. O som da voz de Dante, livre e animada, era uma melodia que eu não ouvia há dias. Caminhei até a cozinha, onde ficava o telefone para ligar para a pizzaria, deixando os meninos mergulhados em seu mundo de jogos e risadas.

Depois de um tempo, alguém bateu na porta. Era o entregador. Eu o paguei e levei a pizza para a cozinha, dividi ela em pedaços e trouxe um para cada um na sala enquanto Jack e Dante jogavam videogame no sofá. Achei que era hora de contar as boas notícias para meu filho.

"Dante, consegui conversar com o seu tio Sebastian. Está tudo certo para que você continue seus treinos com ele", eu falei, sentindo um alívio ao ver o sorriso se espalhar no rosto dele.

"Nossa, mãe, você é a melhor!", ele exclamou, e eu ri.

Então Jack nos interrompeu, os olhos brilhando. "E você vai estudar comigo, na minha classe! Posso te ajudar com a matéria se precisar", ele se ofereceu, sua sinceridade reconfortante.

"Obrigado por você ser tão gentil, Jack", eu disse, sentindo-me genuinamente grata por sua ajuda.

"Não estou fazendo nada que não seja meu dever como primo, tia. Dante vai se sair bem na nova escola", ele garantiu. "Eu também estou nas aulas de boxe com tio Sebastian, mas não luto, faço alguns alongamentos", ele completou, rindo.

Em seguida, Jack largou a pizza e fez um comentário engraçado sobre o professor de matemática, que parecia saído de um filme de terror, e eu ri, quase me engasgando com o meu pedaço. "Tô falando sério! Ele é assustador."

Mas, de repente, o toque do meu celular quebrou a tranquilidade. Eu olhei para o visor e vi o nome do Demétrio, meu ex-marido. Suspirando, eu atendi, já antecipando a razão da chamada. Dante ainda não estava querendo conversar com ele.

"Oi, Demétrio", eu falei primeiro.

"Ella, estou tentando falar com o Dante há horas. Ele não atende o celular. Eu disse que ligaria hoje para falar com ele, lembra?", ele disparou, irritado. Eu, na verdade, tinha me esquecido completamente. Resolvi dar uma desculpa para quebrar a tensão entre pai e filho.

"Ele estava com o celular no silencioso, Demétrio. Estamos aqui na sala, todos juntos, jogando videogame", eu disse, encostando-me no sofá e tentando manter a calma.

"Não importa. Ele deveria atender quando eu ligo. Agora com Vivian grávida, ela precisa mais de mim. Você sabe que estou tentando ser presente, mesmo à distância." A ironia de suas palavras me atingiu em cheio. Eu queria rir da cara dele; nem quando estávamos vivendo na mesma casa ele parecia se importar com o filho.

Respirei fundo, mantendo um tom calmo, mas firme. "Demétrio, ele está bem. Estamos aproveitando a noite, e ele pode te retornar assim que se cansar de jogar. Não há motivo para alarde." Eu estava perdendo a cabeça já. "É por isso que estou me mudando para o Arizona dentro de dois dias."

"Arizona?" Eu sussurrei.

Dante, que havia percebido o tom da conversa e a menção ao Arizona, olhou para mim com uma expressão de leve preocupação. Eu dei um sorriso tranquilizante para ele, enquanto Jack apenas observava, em silêncio, sentindo o clima pesado.

"Está tudo bem, mãe?", Dante perguntou, sussurrando.

Ao ver que o clima estava pesando, apertei levemente o ombro de Dante para sinalizar que tudo estava sob controle. Em seguida, voltei para o telefone.

Eu não queria perder a cabeça ali na frente dos meninos, então resolvi respirar fundo e falar, tentando manter a voz o mais calma possível. "Vou passar o telefone para ele, se é isso que quer para nos deixar em paz, mas falaremos sobre sua mudança para cá depois", eu disse, me referindo à sua abrupta menção de vir para o Arizona. Nem esperei sua resposta.

Estendi o celular para Dante, que hesitou por um segundo, olhando para o aparelho como se fosse uma cobra, mas pegou-o, parecendo frustrado.

"Oi, pai… Desculpa, eu não ouvi o celular", Dante começou, mantendo a voz baixa e respeitosa, mas com uma ponta de irritação disfarçada. "Eu… Estou com a mamãe e o Jack. Espera? Você... vai o quê?"

Pelo tom da conversa, percebi que Demétrio estava falando sobre sua mudança para o Arizona. Dante ouvia em silêncio por um momento, a expressão no rosto dele endurecendo.

"Não! Eu não quero que você e Vivian se mudem para cá. Foda-se! Eu não vou dar nenhuma chance para ela", Dante disparou de repente, a voz um pouco mais alta, a raiva finalmente escapando. Pela resposta, ficou claro que Demétrio havia, de fato, proposto a ideia de se mudar para o Arizona com Vivian.

Depois de um momento, ele deu uma resposta breve, e logo desligou, devolvendo o celular para mim com um suspiro pesado, o rosto tenso. A expressão dele era uma mistura de alívio e frustração. Eu queria saber o que ele estava sentindo, então, num tom leve, passando a mão pelos cabelos dele, tentei aliviar qualquer tensão.

"Está tudo bem, filho?", perguntei.

"Ele só quer saber se eu estou bem… Mas é meio irritante às vezes", ele respondeu, voltando seu olhar para a TV. "Ele não entende que não quero nada com tia Vivian."

Meu coração apertou. Era a ferida aberta do desprezo, da raiva. "Mesmo depois de tudo o que ele fez, você não vai poder ignorá-lo quando ele estiver por perto, porque Demétrio continua sendo seu pai", eu disse suavemente, a verdade amarga em minhas próprias palavras. Era uma realidade que ambos teríamos que enfrentar.

Dante assentiu, voltando a pegar uma fatia de pizza. Com o tempo, a atmosfera relaxada da sala voltou ao normal. Ele e Jack mergulharam novamente no jogo e nas brincadeiras. Eu aproveitei para conversar com Jack sobre como era a escola, sobre a mãe dele, sobre a vida no Arizona. Nos perdemos no momento, nas risadas dos meninos, nas histórias do novo lugar. Por alguns instantes, o peso da mudança e da traição pareceu diminuir, substituído pela promessa de um futuro em que Dante e eu, finalmente, estaríamos bem.

Depois da noite maravilhosa que tivemos com Jack, eu e Dante o levamos até a porta. Ele morava bem ao lado, e eu dei graças a Deus por ainda não ter visto Sônia, a mãe de Demétrio. Entramos em seguida, Dante me deu boa noite e subiu as escadas para o quarto dele, enquanto eu seguia para a cozinha para desligar a luz.

Meu celular tocou. Era uma mensagem de Sebastian. Era estranho; sempre tivemos o contato um do outro, mas era raro que conversássemos ao decorrer dos anos. Na mensagem, ele falava que o treino seria amanhã cedo na praia.

Eu me esforcei para não rir como uma boba adolescente. A imagem dele, forte e "gato", pairava na minha cabeça. Mas eu sabia que tinha que tirar isso da minha mente. Eu era muito mais velha que ele: eu tinha 32 anos e Sebastian apenas 19. Já tinha problemas demais com aquela família. Sentir atração pelo irmão mais novo do meu ex-marido não era bom. Na verdade, o que eu estava pensando quando ousei olhar para Sebastian com outros olhos? Deus!

Em seguida, subi as escadas, tentando tirar Sebastian da minha cabeça. Eu precisava de uma noite de sono.

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