Mesmo que minha loba fosse forte, a fraqueza causada pela perda de sangue tornava cada passo em direção à floresta dos javalis absurdamente difícil.
Meu filhote de lobo mancou atrás de mim. Era como se ele sentisse a minha fragilidade. Com aquele corpinho pequeno, roçava nos meus tornozelos, como se tentasse me passar um pouco de força.
Olhei para ele e murmurei com carinho:
— Mamãe está bem. Se a gente conseguir caçar um javali, o sangue dele também vai te ajudar a recuperar energia.
O filhote pareceu entender. Soltou um pequeno uivo obediente.
Mas, antes mesmo de nos aproximarmos, o bando de javalis já tinha sentido nosso cheiro.
Eles não fugiram nem se dispersaram. O rei javali, que liderava o grupo, pareceu perceber minha fraqueza e, sem me dar tempo de me transformar, partiu pra cima como um louco, com suas presas afiadas apontadas direto pra nós.
Reuni toda a força que ainda me restava e tentei me transformar. Mas as dores nos ossos e músculos gritavam: meu corpo fraco não aguentaria a metamorfose.
— Cuidado!
Ao ver o rei javali atacar, abracei meu filhote com força, tentando protegê-lo com o próprio corpo.
As presas atravessaram meu ombro. A dor foi dilacerante. Mesmo assim, resisti. Peguei o punhal escondido sob minha roupa e, com o que me restava de energia, o cravei com precisão no coração da fera.
O javali soltou um urro de dor, se debateu violentamente e me lançou longe com uma só sacudida. Depois, caiu com estrondo no chão.
Os outros javalis, apavorados, fugiram em desordem.
Caí no chão com dificuldade. O ferimento no ombro sangrava sem parar. E, sem forças, finalmente desabei.
Meu filhote, que tinha ficado protegido nos meus braços, soltou um gemido aflito e se arrastou pra fora do meu abraço.
Com a língua rosada, começou a lamber a terra do meu rosto, tentando me acordar. Vendo que eu não reagia, uivou alto para o céu, chorando.
Logo, passos ecoaram na floresta. O filhote farejou o ar, então se virou de repente e correu em direção às árvores.
— Alfa Mike!
Um lobo, ao ver o filhote mancando até ele, gritou para o grupo que vinha atrás:
— É o filhote perdido! Encontramos ele!
Mike olhou para a perna machucada do filhote e franziu levemente a testa:
— Ele está ferido. E alguém cuidou dele. Fizeram curativos.
O filhote soltou um uivo e mordeu a barra da roupa de Mike, puxando com insistência.
— Alfa Mike, ele parece querer que o senhor o siga...
— Vamos. — Ordenou Mike.
O filhote latiu uma vez e os guiou até onde eu estava.
Ao verem o corpo caído do rei javali ao meu lado, os lobos ficaram boquiabertos:
— Ela matou o rei javali sozinha?
— Ela tá ferida e desacordada. A respiração tá fraca. Precisamos levá-la pro acampamento agora.
Ao comando de Mike, os lobos se apressaram. Me pegaram nos braços, junto com o filhote, e desapareceram na escuridão da floresta.
Enquanto isso, Elizabeth andava de um lado para o outro no quarto de Molly, visivelmente irritada.
— Onde foi parar aquela preguiçosa da Zoey? Sabe muito bem que a Molly precisa comer, e ainda assim se arrasta até a noite sem voltar!
Molly passou a mão na barriga e olhou para Jacob, que permanecia em silêncio:
— Tudo bem, Jacob. Se for muito difícil caçar javali, eu posso comer um pouco de carne de cordeiro...
— De jeito nenhum! Você está grávida! Se quiser comer javali, é javali que ela tem que trazer!
Elizabeth gritou, exaltada:
— Ela já devia ter voltado faz horas! Com certeza fugiu pra algum canto, preguiçando, ou então resolveu encher a barriga junto com aquele filhote maldito antes de voltar!
Mas ninguém respondeu. Elizabeth acompanhou o olhar de Molly e também se virou para Jacob, que ainda não tinha dito uma palavra.
Ele encarava a floresta pela janela, as sobrancelhas apertadas, completamente imóvel.
— Jacob, não me diga que está preocupado com a Zoey? O que tem de bom naquela mulher amarga?
— Eu devia ter insistido pra ela descansar antes de ir... Ela estava fraca, e agora já anoiteceu...
Elizabeth soltou um riso debochado:
— E daí? Aquela inútil nem pode ter filhos! Se morrer, melhor ainda! Assim você e a Molly podem criar o bebê juntos!
— Mãe! — Jacob cortou, com a voz dura. — Já falei: goste você ou não, minha companheira é a Zoey! E o meu filho só vai ter ela como mãe!
O ambiente congelou.
Parecia que ninguém jamais tinha visto Jacob tão furioso. Elizabeth ficou em silêncio, sem ousar responder.
Molly apertou os dentes discretamente e lançou um olhar carente para Jacob:
— Jacob. Tô com um pouco de fome. Você pode me dar a sopa de cogumelos?
Jacob não respondeu. Apenas pegou a tigela em silêncio, com o rosto fechado.
O quarto estava mergulhado num silêncio mortal.
Até que um dos patrulheiros entrou cambaleando, ofegante.
— Alfa Jacob!
Ele gritou, visivelmente aflito:
— Encontramos invasores perto do território dos javalis!
— Eles não pareciam hostis... mas levaram uma loba com eles. Era a Zoey...
A mão de Jacob parou no ar. A tigela escorregou de seus dedos e caiu no chão, espalhando sopa de cogumelos por toda parte.
Ele rugiu:
— O que você disse?!
O patrulheiro não teve coragem de encarar o Alfa. Recuou um passo, encolhido, e murmurou, com mais uma notícia terrível:
— A Zoey... Ela parecia estar morta.